Não é insuperável a crise do bloco, embora gravíssima e seus ajustes possam incluir a saída de países do euro
As notícias sobre a crise na Europa têm suscitado prognósticos alarmantes, às vezes catastróficos sobre o futuro da Europa.
Retrocesso, desintegração, implosão, retorno mesmo aos antigos tempos de seguidos conflitos. Revistas prestigiosas falam, solenemente, do "declínio e queda" da Europa. Não há dúvida de que a situação é séria.
Com efeito, o crescimento da eurozona em 2012, até há pouco previsto para 1,8%, foi reduzido a um terço disso: parco 0,5%. A França passa de 2% a 0,6%. A Itália cai em total estagnação, com 0,1%! A própria Alemanha cai de 1,9% a 0,8%.
De agravar-se o quadro, pode a crise atingir a Espanha e mesmo a França, que corre o risco de perder sua sagrada avaliação de risco "AAA".
Persistem incertezas sobre até onde será possível obter recursos para preencher o fundo de estabilização de € 1 trilhão para socorrer os países em dificuldades.
Não é à toa que agora faz discreta visita a Pequim a diretora-geral do FMI, Christine Lagarde. Com o objetivo de pedir contribuições para o fundo de estabilização, ou pelo menos para o Fundo.
A teimosia da Alemanha em insistir em duros planos de austeridade corre o risco de agravar a situação, na medida em que inviabiliza alternativas capazes de propiciar desafogo e crescimento aos países em difícil situação.
Essa atitude impede o Banco Central Europeu de atuar como emprestador de última instância. Com isso, poderia o banco emitir moeda para dar algum oxigênio a esforços de recuperação do crescimento, ainda que com algum risco de um pouco mais de inflação aqui e ali.
Mas é preciso colocar o assunto em perspectiva mais ampla. O projeto de integração profunda ultrapassou há muito o âmbito estritamente comercial e econômico.
A introdução da moeda comum no fim dos anos 1990 constituiu o ápice de um esforço marcadamente político. Foi um passo expressivo em direção à supranacionalidade.
Constatação de extrema importância: iniciada como meio de livrar de vez por todas o continente de séculos de guerras, a UE tem hoje como motivação maior a adaptação ao novo mundo da globalização.
Em outras palavras, foi ultrapassado o período em que a integração tinha por fundamento questões de guerra e paz. Hoje, tem por desiderato permitir ao velho continente unir forças para melhor competir no mundo da globalização e crescente difusão de poder, com o surgimento de grandes potências.
É de crer que, apesar de tudo, a UE sairá dessa crise com nova configuração, que lhe permitirá avançar em direção a maior coesão fiscal, assim eliminando (ou pelo menos reduzindo fortemente) a deficiência constituída pelo descompasso entre a política monetária comum e a desordem da atomização na área fiscal.
Disso já se fala.
Haverá ajustes dolorosos a fazer, com a possível saída de um ou outro país do euro e com a formação de um núcleo duro de países dispostos a nova cessão de soberania em prol de uma estrutura mais forte.
É prematuro supor que o maior empreendimento político-econômico da história moderna venha simplesmente a desaparecer. A crise atual é gravíssima. Mas nem por isso deixa de ser superável.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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