Desafio da presidente será desmontar esquema criado ao longo do segundo mandato do antecessor
Denise Chrispim Marin
WASHINGTON - O maior desafio político da presidente Dilma Rousseff será desmontar o sistema de corrupção e de fisiologismo criado ao longo do segundo mandato do ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva. A tarefa será essencial para garantir a governabilidade e preservar a democracia brasileira de danos maiores, advertiu o tucano Fernando Henrique Cardoso, presidente do Brasil entre 1995 e 2002. A grande interrogação, afirmou Fernando Henrique, está na real capacidade de Dilma Rousseff executar esse desmonte.
"Espero que a presidente Dilma consiga avançar mais. Mas, para isso, ela terá de alterar as bases de sustentação do governo", afirmou FHC ao Estado ontem em Washington, onde participou da conferência Acabando com a Guerra Mundial contra as Drogas, organizado pelo Cato Institute. "Se ela pode? Esse é o grande ponto de interrogação."
Conforme explicou o ex-presidente, esse desmonte passa pelo fim da "obsessão" gerada no segundo mandato de Lula de ampliar a base aliada do governo no Congresso Nacional, a partir de concessões de "certos pedaços do Estado" ou do "acesso a recursos" públicos por diferentes setores partidários. Fernando Henrique disse não entender a razão dessa necessidade tão premente no governo de Lula e lembrou ter o seu governo conseguido aprovar reformas constitucionais no Congresso sem valer-se de tal artifício.
FHC tentou poupar a presidente ao falar com o Estado. Em especial, de um naco de responsabilidade pela montagem desse sistema de corrupção e clientelismo no segundo mandato de Lula, que hoje mina o seu próprio governo. Para ele, Dilma Rousseff herdou esse modelo, tem sido "sensível" às manifestações da opinião pública sobre os seguidos escândalos nos ministérios e enfrenta a incerteza sobre como e em quanto tempo se dará a recuperação do ex-presidente Lula.
Denúncias. Desde a posse da presidente Dilma, em 1.º de janeiro, denúncias de corrupção provocaram a queda de cinco de seus ministros. Três foram herdados de Lula, e um deles foi indicado pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB). Envolvido em denúncias capazes de lhe custar o cargo, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT), também fez parte do governo de Lula. PMDB e PDT são dois fortes pilares de apoio à administração de Dilma.
"Eu precisava de dois terços dos votos e fazia reformas na Constituição. Agora, o governo não precisa ter 400 deputados e 60 senadores o apoiando", constatou o ex-presidente tucano. "Está faltando mais visão do que o governo pode. Se a presidente Dilma entender que ela pode mais, que ela não precisa de tanto (apoio no Congresso), quem sabe seja possível (desmontar esse sistema)."
O presidente argumentou não ser possível aceitar a corrupção e o clientelismo como males que "sempre existiram" na política do País. Dado o sistema de fisiologismo montado nos últimos anos, a governabilidade está posta em risco e a própria democracia brasileira pode ser prejudicada. A mudança dessa situação, para ele, não depende apenas do governo, mas também da oposição. Porém, FHC não explicou como o PSDB e seus aliados poderiam contribuir.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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