Não é confortável a situação da presidente Dilma Rousseff: ou demite o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e segue a regra aplicada a outros partidos de sua base aliada que também tiveram ministros envolvidos em denúncias em série, ou deixa tudo como está e empresta fundamento às bravatas de Lupi quanto a ser, diferentemente dos colegas, "imexível".
Assim como o vampiro corre da luz e o diabo foge da cruz, o Palácio do Planalto tenta evitar o registro da contabilidade de seis ministros derrubados por suspeita de corrupção, fraudes e gestão indevida, para não dizer temerária.
Mas, ao resistir a fazer o que deve ser feito (a julgar pelo critério adotado pela presidente até agora) apenas para não dar o braço a torcer às pressões das denúncias que não cessam, o governo adere exatamente à lógica da qual busca fugir. Dança, ao inverso, conforme a música e não de acordo com seu critério do que seja ou não aceitável no comportamento de um ministro do Estado.
No último fim de semana acrescentaram-se novas denúncias às já existentes: a carona do ministro em jatinho na companhia de dono de ONG acusada de desviar dinheiro de convênios; a mentira ao Congresso sobre o assunto; atuação livre de lobistas dentro da pasta para acelerar processos de interesse de sindicatos; loteamento de superintendências regionais entre correligionários; privilégio na assinatura de convênios a Secretarias Municipais do Trabalho cujos titulares são filiados ao PDT.
Isso sem contar a impertinência verbal de Carlos Lupi.
Por menos caiu Nelson Jobim da pasta da Defesa, com palavras bem mais leves sobre "idiotas" imodestos, que a dúvida pública de Lupi sobre a autoridade de Dilma para demiti-lo.
Por denúncia semelhante à carona em avião contratado por empresário com negócios junto ao ministério, caiu Wagner Rossi da Agricultura.
Por convênios fraudulentos e favorecimento ao partido (PC do B), caiu Orlando Silva.
E por que Lupi não cai? Consta que no caso do PDT o buraco é mais embaixo.
Formalmente licenciado da presidência por conflito de interesses apontado pela Comissão de Ética Pública, Carlos Lupi é ministro do Trabalho e ao mesmo tempo presidente de fato do partido.
Domina a máquina de cima a baixo e isso dificultaria seu afastamento, porque deixaria o Palácio do Planalto sem interlocutor na legenda para negociar a troca de seis por meia dúzia, como foi feito nos casos anteriores.
Do ponto de vista estritamente argumentativo, a premissa seria verdadeira. Mas, no cotejo com a realidade exposta publicamente por alas dissidentes do PDT, revela-se um conveniente sofisma.
Há pelo menos dois grupos que contestam os métodos de Lupi de se fortalecer a estrutura partidária a partir do uso da máquina pública.
Um deles, aquele com representação no Parlamento, é integrado no Senado por Cristovam Buarque e Pedro Taques e, na Câmara, por Miro Teixeira e José Antônio Reguffe.
O outro se identifica com os fundadores e a liderança de Leonel Brizola. Acusa Lupi de desorganizar propositadamente o PDT para transformá-lo numa sinecura de uso pessoal.
Ambos os grupos já deixaram claro que apoiam investigações e querem ver Carlos Lupi longe do ministério e do partido.
São minoritários? São, mas mostram - como nenhum dos partidos até agora mostrou - que o PDT não é uma rocha em torno de Lupi e que, bem trabalhado, pode vir a ser uma peneira.
Ademais, mesmo junto aos que lhe são fiéis certamente pesa mais o poderio de uma presidente cuja avaliação positiva ultrapassa os 70% e ainda com três anos de mandato pela frente.
Algo se move. Origem não assegura condutas, mas não resta dúvida de que é bom sinal o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, ter ido buscar novos nomes para compor sua equipe no Banco Mundial, na Marinha e no Itamaraty.
Não deixa de ser um passo na direção do rompimento com a sistemática de nomeações exclusivamente partidárias, habitualmente sob o critério da concessão de abrigo a correligionários derrotados em eleições.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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