A propalada disposição da presidente Dilma Rousseff de fazer uma reforma ministerial não apenas para trocar meia dúzia de ministros - mais que isso ela já teve que fazer por circunstâncias alheias à sua vontade -, mas para dar uma enxugada na estrutura de seu primeiro escalão, é um alento, embora seja difícil imaginar que ela consiga cortar pela metade essa miríade de postos de primeiro escalão sem criar problemas com sua base partidária, a maior e mais heterogênea já montada na História recente do país.
São 24 ministérios, mais nove secretarias ligadas à Presidência e seis órgãos com status de ministério.
O caso do (ainda) ministro do Trabalho, Carlos Lupi, é emblemático: desmoralizado depois de bravatas públicas e mentiras patéticas, continua no cargo por receio da presidente de que seu partido, o PDT, que comanda o Trabalho desde o governo Lula, possa votar contra a aprovação da DRU, fundamental para dar flexibilidade à execução orçamentária do governo.
O fato é que 39 ministérios é um recorde na História do país, além de ser uma dimensão que está dentro do que se conhece como "coeficiente de ineficiência", aplicável a qualquer grupo de decisão.
Segundo a teoria do historiador britânico Northcote Parkinson, um grupo perde o controle político quando ultrapassa um tamanho ideal, que fica entre 19 e 22 membros.
Napoleão era mais drástico e dizia que nos altos níveis não se comanda com eficiência mais de sete subordinados.
Uma lenda britânica atribui o fato de que nenhum governo tem um gabinete formado por oito ministros ao que aconteceu com o rei Carlos I, da Inglaterra, o único governo de oito membros de sua História. Foi decapitado depois de, com base no direito divino dos reis, cobrar impostos sem o consentimento do Parlamento, o que gerou a primeira guerra civil inglesa.
Um estudo, já relatado aqui na coluna, de três físicos da Universidade Cornell, Peter Klimek, Rudolf Hanel e Stefan Thurner, depois de analisar a composição ministerial de 197 países, chegou à conclusão de que os governos mais eficientes têm entre 19 e 22 membros.
O Brasil estaria no mesmo nível de ineficiência ministerial do Congo (40); do Paquistão (38); de Camarões, Gabão, Índia e Senegal (36); de Myanmar, Costa do Marfim e Indonésia (35); da Coreia do Norte; da Nigéria, de Omã e Iêmen (34); e do Irã e do Sudão (33).
A maioria dos países desenvolvidos, à época do estudo, tinha entre 13 e 20 ministros. O cientista político Octavio Amorim Neto, da Fundação Getulio Vargas do Rio, que estuda a formação de gabinetes ministeriais no Brasil, atribui a questões específicas de nossa redemocratização as razões pelas quais o número de ministérios no Brasil tem aumentado, a partir da eleição de Tancredo Neves, em 1985.
Antes de Tancredo, o governo Figueiredo tinha 16 membros, sem contar os ministérios militares, que eram cinco: Marinha, Exército e Aeronáutica, SNI e Emfa.
Quando Tancredo Neves foi eleito, uma das primeiras coisas que fez foi aumentar o número de ministérios, para acomodar na sua coalizão uma série de facções do PMDB e do antigo PDS, transformado em Frente Liberal.
Além de questões políticas mineiras, que justificaram a criação do Ministério da Cultura, onde ele colocou seu inimigo cordial José Aparecido de Oliveira.
O primeiro Ministério, que o vice José Sarney aceitou ao assumir devido à doença de Tancredo, tinha 21 ministros, com três ministérios novos: além do da Cultura, o da Reforma e Desenvolvimento Agrário, e o de Ciência e Tecnologia.
O governo de Fernando Collor reduziu radicalmente o Ministério para 10, chegando a 12 no final, antes do impeachment.
Quando Itamar Franco assumiu, na crise da deposição de Collor, uma das primeiras coisas que fez foi ampliar o número de ministérios para 22, tendo sido criado o Ministério do Meio Ambiente.
O tamanho dos ministérios ficou em torno desse número no governo Fernando Henrique Cardoso, embora também ele tenha criado mais três ministérios: o do Planejamento, o da Defesa e o do Esporte, e uma série de secretarias para acomodar facções políticas.
As recorrentes crises políticas que temos vivido, especialmente agudas no governo Dilma Rousseff, a ponto de fazê-la perder nada menos que sete ministros (podendo chegar a oito) antes do primeiro ano de governo, sendo que nada menos que seis (a caminho do sétimo) por corrupção, são decorrência da distorção do conceito de governo de coalizão que adotamos desde a implantação da Nova República.
Os partidos políticos não passam de aglomerados de facções políticas que têm que ser atendidas, superdimensionando o problema da fragmentação partidária, que já é grande - temos 38 partidos políticos em atividade no país, sendo que 23 com representação no Congresso.
O processo de formação da coalizão tem sido desviado de seu leito natural nos últimos anos, e tem valido tudo, desde a falta de compromisso com programas partidários até a adesão a posteriori de partidos que estiveram na oposição na eleição anterior.
E esses partidos aderem aos governos não em troca de compromissos programáticos, mas de cargos e prestígio político.
É o que estamos vendo agora na adesão ao governo do novo PSD, que foi bem-sucedido na manobra de assumir o lugar do DEM no nicho eleitoral da centro-direita, formando a terceira bancada do Congresso sem um programa que una as diversas lideranças políticas que o formam.
Com a nova adesão a ser formalizada na reforma ministerial e a natural reação dos que já estão dentro da coalizão governamental, vai ser uma tarefa praticamente impossível reduzir o número de ministérios.
FONTE: O GLOBO
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