A crise internacional não terá solução rápida. Nenhum dos caminhos para o fim da crise, que o mercado comemora de vez em quando, é de execução simples ou de curto prazo. Os Estados Unidos têm mostrado menos dinamismo do que era de se esperar de sua economia nestes cinco anos em que tenta superar a crise. A China tem dado sinais de desaceleração. É com esse pano de fundo que tem que se pensar a estratégia para o Brasil.
A Europa vai demorar alguns anos para sair dessa crise. A alta das bolsas depois da última reunião foi provocada pela decisão de trabalhar pela união bancária e permitir o resgate dos bancos sem passar por endividamento dos Estados nacionais. A primeira decisão levará anos para ser concretizada. A segunda é um escapismo.
Que chance existe de que os bancos espanhóis sejam resgatados com dinheiro coletivo - na maior parte alemão - dos fundos de estabilização, sem que isso aumente a dívida do Estado espanhol? Acreditar nisso é apostar em cirurgia sem anestesia e sem dor. Ou em Papai Noel.
A maioria dos bancos espanhóis precisa ser capitalizada e isso vai significar aumento da dívida e aprofundamento dos seus compromissos fiscais. A economia espanhola não cresce, os ativos das famílias perdem valor com a queda do preço dos imóveis, e o mercado de trabalho não cria empregos, principalmente para os jovens. Na Itália, o problema bancário é menor, o desemprego é mais baixo, mas a dívida federal é muito maior como proporção do PIB.
A chanceler Angela Merkel tem sido contestada em sua própria coalizão. Como todos viram, recentemente, o governador da Bavária, Horst Seehofer, líder do CSU (Partido Social Cristão) fez fortes e públicas críticas a ela. E com o argumento oposto ao usado contra ela nos outros países da Zona do Euro. O governador considera que ela é condescendente demais. "Que sentido faz o parlamento alemão ficar discutindo como aplicar o pacto fiscal europeu, se no mesmo dia Merkel está concordando em flexibilizar esse pacto fiscal para outros países?". O CSU é aliado do CDU (Partido Democrata Cristão), de Merkel. A crítica exibiu a rachadura na coalizão que governa a Alemanha.
A união bancária significa a construção de um edifício regulatório complexo que exigirá tempo, negociação, aprovação nos parlamentos, criação de seguro de depósitos conjuntos. Nenhuma etapa é simples.
No entanto, as bolsas subiram no mundo inteiro após a última reunião de cúpula da Zona do Euro, quando os líderes anunciaram um acordo no sentido de haver mais integração da Europa, tendo como primeiro passo a união bancária.
Foi, de fato, um alívio, já que a alternativa de menos Europa tem desdobramentos imprevisíveis, mas não existe qualquer solução de curto prazo para a Zona do Euro.
A China tem crescido a taxas altas há décadas. O único ano em que não cresceu foi em 1989 e, em consequência, enfrentou uma explosão de insatisfação social que foi calada pela força dos tanques sobre estudantes na Praça da Paz Celestial. Seu regime totalitário é incompatível com os projetos de potência. Mas ficando no curto prazo, a China tem dado sinais sucessivos de que está tendo dificuldades de manter seu ritmo de crescimento. A queda da inflação anunciada ontem, para inesperados 2,2%, abre espaço para estímulo monetário, mas anuncia também que o país está desacelerando.
O Brasil tem na China seu principal mercado. Foi o boom chinês que sustentou parte do crescimento brasileiro dos últimos anos, produziu o salto dos preços das commodities, elevou a Vale ao grupo das maiores empresas brasileiras em valor de mercado. No ambiente de crise que se espalhou no mundo, é até melhor depender da China do que dos outros centros mundiais. Mas bom mesmo é ter uma estrutura de comércio diversificada e não depender apenas de matérias-primas. O Brasil não sabe vender; ele é comprado. Tem uma atitude pouco agressiva no comércio internacional, depende de que o cliente procure seus produtos.
Essa é uma das mudanças a serem feitas. A outra é olhar o mercado interno com mais sabedoria e senso de construção de mudanças estruturais. Dezoito anos depois do Plano Real, o Brasil ainda não tem o projeto para o salto seguinte. Parece, inclusive, em pleno retrocesso. Discutir o fim do fator previdenciário sem ter uma reforma da previdência é uma insensatez. É preciso lidar com o fato incontornável de que a população está ficando mais velha e a previdência já tem um enorme déficit.
Maior investimento em educação é também inevitável. Não basta elevar o percentual do PIB de gastos dirigidos, é preciso saber o que se quer fazer com o dinheiro a mais dedicado à educação. É preciso ter um plano de melhoria da qualidade. Os exemplos dados aqui neste jornal, de sucesso de escolas públicas em áreas de baixa renda, mostram que em todas elas houve, na prática, um aumento da carga horária.
A lista das reformas não acaba aqui. Há muito o que fazer. E é completamente insano achar que para sustentar o crescimento basta empurrar as famílias para mais endividamento.
FONTE: O GLOBO
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