sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Os campeões de audiência - Maria Cristina Fernandes

As sessões do Supremo têm terminado um pouco antes de se iniciar a propaganda eleitoral. Os minutos que separam aquele cenário bege de togas pretas das megaproduções em película e efeitos especiais quebram o parágrafo no meio de uma oração com sujeito, verbo e predicado.

Lida sem pausa a oração fica assim: o peso da propaganda eleitoral para o sucesso das campanhas subordinou o negócio da política à busca por coligações eleitorais que aumentam os minutos de TV.

Muito ainda vai correr sobre publicitários, lideranças partidárias e homens de governo que a puseram em marcha mas o desvio de dinheiro público como motor dessa engrenagem já tem dois votos no plenário da Corte.

Julgamento e horário eleitoral são dois tempos de um jogo

A propaganda eleitoral, assim como a corrupção, não são uma invenção nacional. E em todo lugar convive-se com as mazelas que o sistema de propaganda eleitoral cria.

Jabuticaba é fazer um julgamento causado, em grande parte, pelas mazelas dessa propaganda eleitoral e dar início a uma nova rodada desses reclames nos mesmos moldes e regras como se uma coisa nada tivesse a ver com a outra.

No Brasil, o tamanho das coligações determina a duração do horário eleitoral e a quantidade de comerciais a serem exibidos. A grita de que sejam pagos com renúncia fiscal das emissoras só não é maior porque a referência que se está sempre a macaquear, os Estados Unidos, têm um sistema radicalmente privatista cujos danos são denunciados pelo próprio presidente da República.

Lá só há comerciais, a grande maioria pagos por lobbies privados e muitos dos quais de agressividade ímpar contra candidatos que se indisponham contra seus interesses. Dois anos atrás a Suprema Corte derrubou os últimos limites que havia ao gasto privado.

O Brasil leva ao limite a lógica da proporcionalidade que se retroalimenta. Ganha mais tempo de televisão quem tem o poder de formar maiores coligações. Vence as eleições quem tem um dos três maiores tempos de televisão. E, de posse do governo, o partido vitorioso tem os meios de formar as alianças que dão acesso à telinha.

A indústria da propaganda eleitoral mescla-se com a da comunicação de governo. Misturam-se clientes, verbas e descaminha-se o interesse público.

Produzem-se no Brasil, como se viu ontem, algumas das campanhas mais bem elaboradas do planeta.

São eficazes não exatamente para convencer o eleitor. Este confia mais na opinião da família e dos amigos. O que a propaganda faz é dar argumentos para o terço do eleitorado que costuma assistir. É este eleitor que alimenta a conversa na fila de ônibus, na repartição e nos bares.

A questão é saber se à sofisticação da promessa corresponde a eficácia da cobrança. Apenas um dos candidatos em tela passará pelo detector de mentiras que é a administração pública.

Em São Paulo, os candidatos chegaram à campanha com recursos desiguais dizendo mais ou menos aquilo que já se ouvia deles nas ruas.

O candidato do PRB apresenta as credenciais da defesa do consumidor. Num país em que ficou mais fácil fazer um enxoval de bebê do que marcar uma consulta com um pediatra, é um apelo que pega. Não formula uma proposta de governo com começo, meio e fim, mas tem um bom número: "Celso é 10".

No horário de estreia, seu vice, dirigente da OAB e líder do "Cansei" conta a história de um menino que tinha um passarinho na mão. Perguntou ao sábio se estava vivo ou morto. Apertaria o passarinho se a resposta fosse "vivo" e venceria a peleja. O sábio respondeu: "Pode estar vivo ou morto. Está em suas mãos". Pela parábola, vê-se que busca crédulos. Nesta altura da campanha, é natural que esteja bombando.

O último Datafolha mostrou que Russomano cresceu em toda a cidade mas, nos núcleos mais marcadamente petistas, a periferia extrema, cresceu junto com Fernando Haddad.

Já no entorno do centro expandido da capital, terreno mais consolidado do PSDB, o crescimento de Russomano se deu às custas de José Serra.

O candidato do PSDB estreou a campanha na TV em busca de uma vacina contra a rejeição crescente. Elenca todos os cargos que já ocupou na vida. Dá a entender que São Paulo deveria se orgulhar de ter sido administrada por ele durante um ano e quatro meses.

Passeia de bicicleta e empina pipa para fazer frente aos adversários mais jovens e se diz no "auge da experiência" - "O importante não é ser novo, mas ter ideias novas".

Ressuscita o mote de condutor da locomotiva paulista sem deixar claro por que isso faria diferença para o jovem com segundo grau e renda até cinco salários mínimos que capitaneia sua rejeição.

Fernando Haddad, menos conhecido até que Eymael, evitou cair na armadilha de se apresentar de cara ao leitor com as fotos de sua infância e adolescência.

Vacinou-se contra a ideia de que é marionete de Lula aparecendo sozinho na primeira metade do programa, andando com passo determinado pelos pontos mais conhecidos da cidade.

Até quando Lula aparece, num bate-papo com ele, não é do ex-presidente a última palavra, mas do candidato.

Lula tem o mais forte dos três apelos abrigados pelo programa.

O primeiro é o da pedagogia do voto. Lula aproveita-se da popularidade de Dilma na cidade para dizer que, assim como não se enganou ao escolhê-la, não tem dúvidas em pedir voto para Haddad.

A segunda é a história de que Lula e Dilma melhoraram a vida do paulistano dentro de casa e ele vai fazê-lo da porta para fora.

O terceiro apelo do candidato está na cena em que está ao lado da mulher e dos dois filhos enquanto discursa em convenção petista, nos moldes dos candidatos americanos. Só ficou faltando Stick, o labrador da família.

Começou batendo contra os "prefeitos de meio mandato e meio expediente". O troco já está a caminho, com a exploração, pelo PSDB, do mensalão.

Quem não parece não vir nunca é um candidato que encurte o caminho entre o julgamento e a campanha e mostre que estão em curso dois tempos de um mesmo jogo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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