domingo, 7 de outubro de 2012

Um dia a casa cai - Dora Kramer


Incorreu em grave equívoco quem considerou para­­ efeito de ceticismo supostamente engajado que o processo do mensalão acabaria "dando em nada". As condenações em massa que no Supremo Tribunal Federal (STF) alcançam os generais da banda do núcleo político fecham um ciclo. Se, quando e como outro vai se abrir, veremos. Mas a descrença e a apatia até aqui sofreram um duro revés.

Já no recebimento da denúncia, há cinco anos, havia ficado patente que o STF não estava disposto a contemporizar. Note-se que a composição não era a mesma de hoje. Ainda assim, lá os juízes de maneira quase sempre unânime deram o aviso geral aos navegantes que agora se confirma: chega. Ou os políticos entendem que precisam andar nos trilhos como qualquer cidadão ou terão de arcar com as consequências legais.

Não vai nisso o peso da responsabilidade exclusiva do PT. O partido não inventou a delinquência governamental nem a venalidade legislativa – para usar palavras do ministro Celso de Mello –, não obstante tenha se valido delas à exorbitância.

Agravou um quadro grave quando emprestou à ilicitude sua marca construída na defesa da ética.

Conferiu indulgência social à cultura de transgressão, além de associar sua ideologia aos piores instrumentos, e de se aliar aos mais nefastos operadores para pôr o aparelho de Estado a serviço de um projeto partidário tão longevo quanto hegemônico.

Quando decidiu abrir o processo, o STF também surpreendeu. Pela veemência dos termos usados pelos ministros e pela implacável objetividade do retrato traçado na denúncia do então procurador-geral Antônio Fernando de Souza sobre o esquema montado pelo PT para dar suporte financeiro ao seu projeto.

Na ocasião, o uso de métodos espúrios para o exercício do que se chama de política, mas não passa de pura bandidagem, já tinha chegado ao limite do insuportável. No entanto, mandantes e executores acharam por bem prosseguir.

E pelo visto agora com as apreensões de dinheiro para abastecer campanhas do PT no Amazonas e no Pará, insistem. Quando se vê um assessor do partido em Manaus ser flagrado com notas na cueca anos depois de vexame semelhante, é de se perguntar o que ainda mais será preciso além de punição pesada para que o recado seja devidamente compreendido.

Não são suficientemente duras as lições de um julgamento em que gente acostumada ao tratamento de "excelência" é chamada de "quadrilha" e referida pela autoria de tramas sórdidas reveladas para todo o país no relato dos autos?

Seja qual for o rumo dos acontecimentos logo após o desfecho desse caso, algo de útil já ficou patente: não dá para fazer tudo do jeito mais errado e esperar que dê certo no final.

Por lamentável que seja o cenário, por mais lentas que sejam as mudanças, nada disso terá sido em vão. E o PT, se tiver cabeça, ainda poderá se redimir e algum dia dizer que deu – por vias transversas e adversas – uma grande contribuição ao Brasil.

Gato por lebre. A presença do vereador e suplente de Marta Suplicy no Senado, Antonio Carlos Rodrigues (PR-SP), na campanha do tucano José Serra, traduz a grave distorção que o atual modelo de suplência provoca na vontade do eleitor. A pessoa vota em Marta, do PT, mas acaba representada por um político que milita no campo adversário, do PSDB. E isso sem ter dado um único voto ao substituto, incluído na chapa por obra dos acertos entre partidos.

Banca do distinto. É o tal negócio: quanto mais alto o coqueiro maior é o tombo. Vai ficando claro que o foro especial para autoridades nem sempre é um privilégio. Depende muito da disposição da Corte de não deixar que a justiça tarde e muito menos falhe.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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