As avaliações sobre quem venceu as eleições podem ser discutidas a partir de
vários critérios, há, entretanto, dificuldades para um juízo objetivo
As eleições municipais foram um prato cheio para análises, avaliações,
distorções e apostas. Os resultados eleitorais foram muito dispersos. Dão
margem para tudo: ganhou o PT, pois levou São Paulo; perderam Lula e o PT,
pois, no Norte e no Nordeste, o PSDB e o DEM ganharam várias capitais e cidades
importantes. Ou ainda: o PSDB foi "dizimado" no Sudeste. Ao que
replicam os oposicionistas: quem perdeu foi Lula, derrotado em Salvador, Campinas,
Manaus, Fortaleza etc. Se o PSDB era um partido "do Sudeste",
expandiu-se no Norte e no Nordeste. O próprio DEM, candidato à extinção,
segundo muitos, derrotou o lulo-petismo em Salvador, Aracaju e Mossoró. Juntos,
PSDB e DEM levaram sete das 15 maiores cidades da região: no bunker petista das
eleições presidenciais a oposição encontra agora fortes bases de apoio. O mesmo
se diga sobre o Norte.
As avaliações sobre quem venceu podem ser discutidas a partir de vários
critérios: número de prefeituras (o PMDB manteve a dianteira com cerca de mil,
o PSDB tem 698, e o PT, 636), número de votos obtidos etc. Há, entretanto,
dificuldades para uma avaliação objetiva. Por exemplo: em Belo Horizonte,
ganhou o PSB aliado ao PSDB, mas os votos são dos socialistas ou do PSDB de
Aécio? O mesmo se diga de Campinas. Bastaria mudar o cômputo dessas duas
cidades para alterar a posição relativa dos partidos no rol dos vencedores. O
PT se pode gabar de haver ganhado São Paulo. Mas deve reconhecer que seu avanço
no país foi tímido para quem queria obter mil prefeituras e detém as rédeas do
poder federal e as chaves do cofre. Manteve 16 prefeituras nas cidades com mais
de 200 mil habitantes, contra 15 do PSDB (que antes tinha apenas dez). O PMDB,
sem vitórias expressivas fora do Rio de Janeiro, guardou, contudo, uma rede
importante de prefeituras: nas cidades com mais de cem mil habitantes, ganhou
em 45, ficando o PSDB com 48, e o PT com 54. São esses os três partidos com
maior capilaridade no eleitorado brasileiro. O PSDB manteve a posição sendo
oposicionista e, portanto, com maior dificuldade para obter recursos
financeiros e políticos.
O PSB teve dois êxitos significativos: derrotou o lulo-petismo em Recife e
em Fortaleza. Isso abre margens à especulação sobre suas possibilidades para as
eleições presidenciais, com uma cisão no bloco que até agora apoia o governo
Dilma. A divisão entre os eleitores continua sendo entre governistas e
oposicionistas. Daí a peculiaridade da situação do PSB, que, governista,
derrotou o partido hegemônico no governo, o PT. Prosseguirá nesse rumo? Difícil
responder. Para ocupar posições polares num sistema organizado entre governo e
oposição, é preciso dispor de base social e rumo político. Se o PSB vier a
disputar com chances de êxito as presidenciais, terá que ser identificado pelo
eleitorado como diferente do lulo-petismo, ainda que não oposto a ele, e terá
de obter apoio em amplos setores sociais em função dessas diferenças. Uma coisa
é ganhar votos nas eleições municipais, outra, nas federais.
A consideração vale para o PSDB. Apesar das críticas de que o partido não
faz oposição vigorosa, conseguiu manter-se como seu carro-chefe. Em São Paulo,
ganhou 176 prefeituras, contra 67 do PT, e, mesmo na capital, arrastando o
desgaste da administração local, obteve 40% dos votos. Elegeu candidatos de
nova geração, como os prefeitos de Botucatu, João Cury, de Americana, Diego
Natal, e de Votuporanga, Junior Marão, com votações muito expressivas. Em
Maceió, Rui Palmeira venceu no primeiro turno. Em Blumenau, Napoleão Bernardes
ganhou no segundo, assim como, em Pelotas, Eduardo Leite. Mariana Carvalho, em
Porto Velho, sem se eleger, teve boa votação. O PSDB renovou os quadros, mas
não fez o erro de dispensar os mais experientes: Arthur Virgílio, Firmino Filho
ou, para mencionar um entre os veteranos paulistas, o prefeito de Sorocaba,
Antonio Pannunzio, são exemplos disso.
Ser jovem não assegura ser portador de mensagem renovadora, e tê-la é a
questão estratégica central. Carlos Melo em artigo publicado em "O Estado
de S. Paulo" afirmou que o PSDB era originariamente "liberal na
economia, social-democrata nas políticas públicas e progressista nos
costumes". Essa poderia continuar a ser a mensagem do partido, desde que
se acrescente ao liberalismo econômico o contrapeso de um Estado atuante nas
agências reguladoras e capaz de preservar instituições-chave para o
desenvolvimento, como Petrobras e os bancos públicos, sem chafurdar no
clientelismo e na confusão entre público e privado. O progressismo nos costumes
implica na defesa da igualdade de gênero, no apoio às medidas racionais de
compensação social e racial, bem como em políticas modernas de controle da
violência e das drogas que não joguem as populações pobres contra os governos.
Sem esquecer que o crescimento do PIB só é satisfatório quando respeita o meio
ambiente e beneficia a maioria da população.
Renovar implica se comunicar melhor, usando linguagem contemporânea nas
mídias televisivas e eletrônicas. Mas não basta a pregação durante o período
eleitoral. É preciso a reiteração cotidiana das crenças e dos valores
partidários, para reagir à tentativa dos adversários de estigmatizar o PSDB
como o partido "dos ricos", privatista a qualquer custo e arrogante.
Perguntem aos pobres de Maceió, Teresina, Belém ou Manaus em que partido
votaram e verão que a identificação com os partidos se dá mais pela mensagem e
pelas características de quem as proclama e a quem se dirige do que por
classificações abstratas de segmentos sociais. Sem deixar de ser um partido
modernizador, o PSDB, como escrevi tantas vezes, deve se dirigir aos mais
pobres, mas também às classes médias, tanto às antigas como às camadas que
aumentaram a renda, mas ainda não têm identificação social própria. É esse o
caminho para êxitos futuros.
Fonte: O Globo, O Estado de S. Paulo e Zero Hora (RS)
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