"No mercado, como na política, a versão tem mais força que o
fato". O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, respondia à pergunta de
quem tem razão sobre o tripé da economia, a presidente Dilma Rousseff, que o vê
mantido, ou o mercado, que o dá por acabado.
"Se, de fato, o tripé não foi alterado, a impressão é de que foi".
A distância entre fato e versão é ampliada por falta de "concerto",
como o governador chama a incapacidade de comprometer as partes interessadas
numa decisão negociada em benefício do país, ainda que, de imediato, possa
trazer perdas para os envolvidos.
Sem concerto ou compromisso, quem perde se torna porta-voz de versões que
corroem a credibilidade dos fatos. É disso que trata a política, tenham os
interlocutores mandato, dinheiro ou voto.
A política é uma só, tenha-se dinheiro, mandato ou voto
Foi assim, acessível a qualquer entendedor, que Eduardo se mostrou ante uma
plateia de 60 presidentes de empresas reunidos nesta semana em seminário do
Valor. Não precisou dizer se será ou não candidato. A resposta está na
distância entre fato e versão que o ano de 2013 vier a estabelecer.
O discurso é de aliado. Apoiará toda a agenda de regulação para destravar o
investimento na expectativa de que, até meados do próximo ano, o país decole.
Mas deixa em aberto o que acontecerá se fatos e versões continuarem a trombar.
Introduz, com sua versão da disputa presidencial de 2010, o fato que não pode
se repetir na próxima: a oportunidade perdida de se debater alternativas para a
retomada do investimento.
Segue o mantra do avanço pela busca do consenso sem temer o desgaste popular
que a seara da negociação política sofreu com a posse de Dilma.
A presidente escala as pesquisas de popularidade com a imagem de quem, a
negociar com parlamentares e empresários, prefere combater o malfeito e a
privatização do interesse público.
Ainda sem condições de disputar público, Eduardo cultiva bases políticas e
empresariais com o discurso do consenso. Assim como a redemocratização, a
estabilidade da moeda e a redistribuição de renda foram pactuadas, a retomada
do investimento também precisará sê-lo.
Junto à banda menos industrializada do país busca convergência na queixa de
que a retomada do investimento pela desoneração de IPI para setores específicos
se dá à custa da agricultura, da pequena empresa e do que ali, naquela plateia
de cosmopolitas, chama de "Brasil profundo", prefeituras e Estados
que veem reduzidos seus repasses federais. Quando se desonera e o país cresce,
ganham todos, mas quando se desonera e o crescimento não vem é a maioria que
perde. Chega a dizer que, a privilegiar setores específicos, seria preferível
uma redução geral de impostos.
Dois dias depois, em evento da CNI, Dilma seria taxativa sobre suas escolhas
e mostraria por que Eduardo aproxima-se dos fatos com sua versão sobre a
política de desenvolvimento do governo: "Cada governo tem seu desafio. O
meu é, necessariamente, buscar uma maior competitividade sistêmica e setorial
dos diferentes seguimentos da nossa economia, mas sem sombra de dúvidas, da
indústria".
A prefeitos e governadores que o têm procurado para discutir o imbróglio dos
royalties, Eduardo diz entender a preocupação da presidente em evitar que a
questão, judicializada, atrase os leilões do pré-sal. Mas não entende por que a
presidente não buscou os envolvidos para explicar a decisão. Esperou até a última
hora ser contactado pelo Planalto. Checou. O governador do Rio, Sérgio Cabral,
também não o havia sido. Dois dias antes dos vetos, decidiu mandar carta, não
porque alimentasse a esperança de revertê-los, mas para registrar posição.
A esse debate federativo, tenta atrair o empresariado com o argumento de que
no momento em que a cartilha do governo federal parece ter se esgotado, é
chegada a hora de Estados e municípios poderem lançar mão de instrumentos para
alavancar investimentos.
Corteja os empresários com o discurso de que práticas do setor privado como
remuneração variável já se tornam padrão de gestão pública.
Seus parceiros de seminário, todos com menos de 50 anos e iniciados na
política com a redemocratização, estavam lá para confirmar.
O prefeito do Rio, Eduardo Paes, que se definiu como gestor de lápis na
orelha e umbigo no balcão, contou que 80% dos servidores do Rio têm remuneração
estabelecida por metas de desempenho.
O prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, concordou com Eduardo no
diagnóstico de que o crescimento econômico pela distribuição de renda já se
aproxima do esgotamento. E que a gestão pública, para aumentar a capacidade de
investimento, tem que buscar inspiração no empresariado sobrevivente de crises
econômicas.
Lideranças emergentes num país em que a presidente da República não se cansa
de valorizar seus embates com o capital, os três fizeram questão de marcar a
diferença.
Reunidos, pareciam rimar com o enunciado de Eduardo de que tanto a
redemocratização quanto a estabilidade da moeda e a distribuição de renda
tinham vingado porque um conjunto de lideranças políticas havia convergido para
viabilizá-las.
Integrantes de partidos que compõem a base da presidente Dilma Rousseff, os
três estiveram em seu palanque em 2010, mas não necessariamente permanecerão em
2014.
No discurso de dois dias depois, a presidente Dilma Rousseff deu respostas a
várias das queixas ouvidas ali. Reconheceu que os prazos e a burocracia para a
aprovação de financiamentos ainda precisam ser agilizados. Explicou por que não
incorporou ciência e tecnologia na destinação dos recursos do pré-sal, como
demanda Eduardo. "Não tem tecnologia, não tem ciência e não tem inovação
sem educação de qualidade".
E, finalmente, disse que, por recentes, os efeitos da redução das taxas de
juro na ampliação do crédito ainda estão a caminho.
Que o país vive uma transição, todos parecem concordar. As diferenças
começam a partir da velocidade necessária às mudanças e das versões que delas
se darão a caminho de 2014.
Fonte: Valor Econômico
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