Nota
técnica produzida na Advocacia Geral da União seis dias após a operação da PF
contesta manifestações de Luís Adams, chefe da AGU, e de seu antecessor Dias
Toffoli, sobre a Ilha das Cabras.
Nota
técnica da AGU contesta pareceres de Adams e Toffoli
Advogados sugerem que seja reavaliada posição
da União em processo que interessa a ex-senador
Vinicius Sassine
CERCO À CORRUPÇÃO
BRASÍLIA Uma nota técnica produzida na
Advocacia Geral da União (AGU) na última quinta-feira, após a deflagração da
Operação Porto Seguro, da Polícia Federal, põe em xeque as manifestações de
José Antônio Dias Toffoli, Evandro Gama e Luís Inácio Adams - todos na condição
de advogados-gerais da União - em processo sobre a Ilha das Cabras, em Ilhabela
(SP), de interesse do ex-senador Gilberto Miranda (PMDB-AM).
Após ser derrotado na Justiça de São Paulo,
Gilberto Miranda (PMDB-AM) acionou o Supremo Tribunal Federal para garantir a
permanência na ilha e a anulação de multa aplicada por danos ambientais. O
ex-parlamentar, indiciado pela PF, usou como estratégia provocar a União para
integrar os autos.
Toffoli, hoje ministro do STF, e Gama,
procurador da Fazenda Nacional, pediram em junho e outubro de 2009,
respectivamente, para a União ingressar no processo, o que beneficia Miranda.
Gama chegou à AGU por indicação de Toffoli e exerceu a função de advogado-geral
da União substituto com a saída do chefe para o cargo de ministro do Supremo.
Em agosto de 2011, o atual advogado-geral, Adams, reiterou o pedido de a União
entrar no processo sobre a ilha no litoral paulista.
Agora, com a revelação de um esquema de venda
de pareceres jurídicos, os advogados da AGU decidiram apresentar manifestações
oficiais de discordância. "São descabidas as argumentações iniciais do
senhor Miranda", afirma o coordenador-geral de Patrimônio e Meio Ambiente
da AGU, Dennys Hossne, em nota técnica assinada na última quinta-feira, dia 29.
O documento foi assinado também pelo diretor do Departamento de Patrimônio e
Probidade, Renato Dantas. Eles discordaram da existência de interesse da União
no processo em função da discussão sobre o domínio da ilha, tese sustentada
pelo ex-senador. "Sugiro que seja reavaliada a posição da União",
conclui a nota.
Quando os advogados de Gilberto Miranda se
manifestaram no processo em curso no STF sobre os pedidos da AGU, não colocaram
qualquer objeção à entrada da União nos autos.
A Justiça de São Paulo multou o
ex-parlamentar por danos ambientais - já que ele construiu ilegalmente um
heliponto, uma praia artificial e um deque na ilha - e estabeleceu na sentença
que o terreno pertence ao Parque Estadual de Ilhabela. O imóvel pertence à
União, conforme registro da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) em São
Paulo, vinculada ao Ministério do Planejamento.
Diante das suspeitas de corrupção na
concessão da ilha ao ex-senador, o ministério determinou a suspensão do ato que
permitiu a Miranda explorar o local, o chamado aforamento. A nota técnica da
AGU, elaborada após a operação da PF, diz que "nada impediria" a
inclusão da União em novo processo, e não necessariamente no processo em curso
no STF.
A situação da Ilha das Cabras está no centro
das investigações da Operação Porto Seguro. Para ver atendidos seus interesses
e obter pareceres favoráveis, conforme a investigação da PF, o ex-senador recorreu
a três servidores: Paulo Rodrigues Vieira, ex-diretor da Agência Nacional de
Águas (ANA), apontado como chefe da quadrilha; José Weber Holanda Alves,
ex-advogado-geral adjunto da União e ex-braço-direito de Adams; e Evangelina
Pinho, ex-superintendente da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) em São
Paulo. Os três foram indiciados pela PF por suposta participação no esquema.
Até agora, a AGU não tornou público o teor da
maioria dos pareceres jurídicos assinados por Weber. Segundo o próprio órgão, o
ex-advogado adjunto assinou 942 atos desde a nomeação para o gabinete da AGU,
em julho de 2009, dos quais 40 documentos "têm alguma ligação com
manifestações jurídicas".
Sete se referem à Ilha dos Bagres, outra ilha
ocupada por Miranda, em Santos (SP). "Os outros 33 atos não compõem o
escopo da Operação Porto Seguro e ainda estão na AGU em fase de localização dos
processos físicos", sustenta o órgão, por meio da assessoria de imprensa.
A nota técnica produzida no último dia 29 foi
motivada pelo extravio de um ofício encaminhado por Evangelina Pinho, da SPU,
para a sede da AGU, em Brasília. No documento, ela reforça o interesse no
ingresso da União no processo em curso no STF. O autor da nota técnica
discorre, então, sobre posicionamentos anteriores da Coordenadoria de
Patrimônio e Meio Ambiente em relação à Ilha das Cabras: "O dano ambiental
já foi reconhecido em sentença do TJ-SP e, portanto, é de interesse da União
que seja reparado com a maior brevidade possível, o que não ocorrerá se forem
invalidadas decisões proferidas num processo que se iniciou em 1991."
A análise dos pareceres da SPU, como o
documento extraviado e depois recuperado, cabe à Secretaria Geral de
Contencioso da AGU. A unidade deu um prazo de cinco dias úteis para que a SPU
se manifeste sobre o interesse de continuar como parte no processo que discute
a ocupação da Ilha das Cabras.
No STF, o ministro Joaquim Barbosa deixou a
relatoria do agravo de instrumento por ter assumido a presidência do tribunal.
O novo relator será o substituto do ministro Ayres Britto, que se aposentou no
fim de novembro. Ainda não houve qualquer manifestação ou decisão nos autos.
Sobre a nota técnica discordante da posição
adotada até agora sobre a Ilha das Cabras, a AGU sustenta que "a
manifestação jurídica embasou o envio de ofício a cinco órgãos da administração
federal para que se posicionem sobre o interesse de manter o pedido de ingresso
da União". "Foi por acionamento da SPU em SP que a AGU pediu ingresso
como assistente no agravo de instrumento." Toffoli sustenta que atuou no
caso, em 2009, por orientação da Secretaria Geral de Contencioso da AGU. Gama
diz ter assinado a pedido da SPU.
Fonte: O Globo
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