A recuperação do G7 ocorreu ou não? Sim, mas está seguindo um roteiro diferente do previsto
No encontro de hoje, volto minha atenção para o cenário econômico internacional, deixando de lado as mazelas da economia brasileira neste início de outono.
O ambiente internacional continua dominado pela insegurança dos investidores em relação ao futuro e --reflexo disso-- pela ocorrência de flutuações violentas de preços em mercados importantes.
Dou alguns exemplos recentes: entre janeiro e abril deste ano, o preço do ouro caiu mais de 17%, o índice Nikkei, da Bolsa de Valores de Tóquio, valorizou-se em quase 13% e a moeda japonesa perdeu mais de 15% de seu valor.
Como reflexo desses movimentos, tivemos uma nova corrida aos títulos de juros de qualidade nas economias mais importantes do mundo. Um exemplo dessa busca por maior segurança ocorreu nos Estados Unidos, com os juros dos títulos de dez anos do governo recuando de 2,20% ao ano para 1,70%.
Na Europa, mesmo os países que se encontram no olho do furacão da crise do euro têm colocado junto a investidores seus títulos de dívida a taxas cadentes e muito abaixo das que prevaleceram ao longo do ano passado.
Compondo esse quadro de aversão ao risco, as Bolsas de Valores do mundo emergente têm amargado um período de queda das cotações e fuga de investidores. O índice Bovespa já caiu mais de 12% nestes primeiros quatro meses do ano.
A pergunta que se coloca nesta altura é a seguinte: e a recuperação tão falada --inclusive por mim neste espaço da Folha-- das economias do chamado G7, com a redução dos riscos sistêmicos dos mercados, ocorreu ou não? Minha resposta é um sonoro SIM, mas com uma qualificação: ela está ocorrendo embora seguindo um roteiro diferente do inicialmente previsto.
Nos EUA, a recuperação se consolida, mas a uma velocidade bem mais baixa do que a estimada anteriormente, em razão da redução do deficit fiscal aprovada pelo Congresso no ano passado. Chamado de sequestro de receitas fiscais, ele está obrigando o governo Obama a diminuir compulsoriamente suas despesas e, com isso, reduzir o deficit fiscal em cerca de 2% do PIB neste ano.
Com isso, os EUA estão fortalecendo sua situação econômica futura, à custa de uma redução pequena do crescimento econômico atual. Uma combinação virtuosa e de difícil implantação em uma democracia de massas nos dias de hoje.
Essa combinação de crescimento menor com ajuste fiscal de longo prazo está permitindo que o Fed --o banco central americano-- mantenha por mais tempo sua política de expansão monetária, financiando de certa forma o ajuste fiscal de longo prazo que está ocorrendo.
Como essa compreensão do complexo cenário americano é de difícil entendimento, nos mercados prevalece a impressão de que a recuperação da maior economia do mundo é frágil, abrindo espaço para as especulações com a incerteza do futuro.
O outro polo importante da recuperação da economia global --a China-- também tem sofrido com as análises superficiais dos mercados financeiros. O novo gigante da economia asiática vem passando também por um ajuste estrutural de longo prazo ao transformar o crescimento do consumo interno na grande força --junto com o investimento na infraestrutura econômica do país-- de seu crescimento econômico. A meta dos novos governantes é dobrar, até 2020, a renda média per capita da população e, com isso, alavancar o consumo.
Se isso acontecer, a China exportadora de produtos industriais baratos vai definitivamente deixar de existir, como ocorreu com outros países asiáticos no passado, e em seu lugar vamos ter o maior mercado consumidor do globo.
Mas nos últimos meses essa transição de modelo tem sido responsável por dados econômicos mais fracos e usada como argumento para questionar a recuperação econômica no país de Mao.
Finalmente, na Europa a recuperação econômica ainda não apareceu no horizonte, fazendo do Velho Continente o elemento mais importante na saída da crise econômica iniciada em 2008.
O modelo de um ajuste fiscal violento, sem a ajuda de uma expansão monetária agressiva como a perseguida pelo Fed nos Estados Unidos, está por trás do atraso europeu.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 70, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
Fonte: Folha de S. Paulo
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