“Complicador de natureza imediatamente política foi o modo pelo qual as autoridades federais reagiram. Um movimento que era "local" - mexendo mais com os prefeitos e governadores -tornou-se nacional a partir do momento em que a Presidenta chamou a si a questão e qualificou-a primordialmente, no dizer de Joaquim Barbosa, como uma questão de falta de legitimidade. A tal ponto que o Planalto pensou em convocar uma Constituinte, e agora, diante da impossibilidade constitucional disto, pensa resolver o impasse por meio de plebiscito. Impasse, portanto, que não veio das ruas.
A partir daí o enredo virou outro: o da relação entre Congresso, Executivo e Judiciário e a disputa para ver quem encaminha a solução do impasse institucional, ou seja, quem e como se faz uma "reforma eleitoral e partidária". Assunto importante e complexo, que se apenas desviasse a atenção das ruas para os palácios do Planalto Central e não desnudasse a fragilidade destes, talvez fosse bom golpe de marketing. Mas não. Os titubeios do Executivo e as manobras no Congresso não resolvem a carestia, a baixa qualidade dos empregos criados, o encolhimento das indústrias, os gargalos na infraestrutura, as barbeiragens na Energia e assim por diante. O foco nos aspectos políticos da crise, sem que se negue a importância deles, antes agrava do que soluciona o "mal-estar", criados pelos "malfeitos" na política econômica e na gestão do governo. O afunilamento de tudo em uma crise institucional (que embora em germe não amadurecera na consciência das pessoas) pode aumentar a crise, em lugar de superá-la.”
Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente da República, in “Tempos difíceis”, O Globo, 7/7/2013
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