Obama pressiona por sanções contra a Rússia, mas dependência de gás faz europeus hesitarem
BRUXELAS - A já explosiva tensão entre Rússia e Ucrânia aumentou perigosamente nesta segunda-feira quando Kiev acusou Moscou de dar um prazo para que todas as forças de segurança ucranianas na Crimeia, cercadas há dois dias, se rendessem. O ultimato acabou desmentido pelo Kremlin horas depois, mas a boataria só fez expor ainda mais os esforços — inúteis até agora — dos EUA e da União Europeia (UE) para conter o presidente Vladimir Putin, que parece ignorar os alertas do Ocidente e continua consolidando o controle russo da península. Apesar da forte retórica de condenação, nem americanos nem europeus dão sinais de saber como frear a ofensiva russa. E, para piorar, Washington e Bruxelas acabaram em descompasso. O presidente Barack Obama ameaçou recorrer a sanções, correndo o risco de isolar-se dos parceiros europeus, hesitantes.
Para muitos analistas, a incapacidade de dar uma resposta uníssona se justifica: como a Rússia é o maior fornecedor de gás natural da Europa, transportado por dezenas de gasodutos que cortam a Ucrânia, sanções ao governo russo significariam, indiretamente, um golpe contra o próprio Velho Continente. Dados da UE mostram que 30% do gás natural usado nos países do bloco são originários da Rússia. Foi essa dependência energética que pôs França, Alemanha e Reino Unido na linha de frente dos europeus contrários à aplicação de sanções econômicas contra Moscou. Numa reunião de emergência ontem, os 28 ministros do Exterior da UE limitaram-se a condenar a violação da soberania ucraniana e a uma vaga ameaça de punição caso Moscou não recue. E anunciaram uma reunião dos chefes de governo no bloco depois de amanhã.
“Na falta de uma desescalada da Rússia, a UE pode decidir por consequências nas relações bilaterais com a Rússia, como a suspensão de conversas bilaterais, questões de visto (...) e poderá considerar outras medidas específicas”, diz o comunidade emitido pelo bloco.
— Há sérias preocupações sobre sobrevoos, relatos de soldados e blindados em movimento. Queremos que a situação se acalme e as tropas recuem para onde estavam antes disso começar — afirmou a chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton.
O discurso ponderado encontrou respaldo nos ministros do Exterior de Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, e França, Laurent Fabius.
— Há a condenação da intervenção russa e a necessidade de mediação e diálogo — disse Fabius.
Já o alemão sugeriu levar a mediação à Organização para a Segurança e Cooperação da Europa (OSCE), mas sem descartar medidas econômicas caso Moscou não coopere.
Novos distúrbios no Leste da Ucrânia
A abordagem europeia se chocou com a de Washington. Obama disse nesta segunda-feira que a ocupação da Crimeia viola a lei internacional e “deixa a Rússia do lado errado da História”.
— Há dois caminhos que a Rússia pode adotar neste ponto. As ações na Crimeia são profundamente preocupantes, mas também é verdade que, com o tempo, haverá um custo para a Rússia — voltou a ameaçar Obama.
E o custo seriam sanções. No domingo, o secretário de Estado John Kerry disse que poderia haver congelamento de ativos russos, suspensão de vistos e “interrupções na rotina de comércio”. Ontem, a porta-voz do Departamento de Estado, Jen Psaki, confirmou que os EUA estudam formas de punir a Rússia e que sanções “são prováveis”.
— Este é um passo para o qual estamos muito preparados — reforçou.
No Conselho de Segurança da ONU, os representantes de Washington e Moscou se enfrentaram, cada qual defendendo sua versão da situação. O embaixador russo, Vitaly Churkin, apresentou uma carta do presidente ucraniano deposto, Viktor Yanukovich, pedindo apoio russo para salvar um país “à beira da guerra civil”. A embaixadora americana, Samantha Power, tachou de “inverdades” as afirmações russas.
— A ação militar russa não é uma missão de proteção dos direitos humanos — acusou.
Enquanto a crise parece tragar as potências mundiais a uma versão pós-moderna da Guerra Fria, na Crimeia, relatos confirmavam que a península ucraniana estava tomada por forças russas. E em várias cidades do Leste da Ucrânia, onde predomina a população etnicamente russa, houve novos distúrbios. Manifestantes pró-Rússia invadiram o Parlamento regional em Donetsk e sedes do governo em Lugansk e Odessa. Enquanto isso, Putin inspecionava exercícios militares perto da Ucrânia.
Fonte: O Globo
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