Talita Moreira, Fábio Pupo, André Guilherme Vieira e Raphael DiCunto – Valor Econômico
Além do grande volume de doações para campanhas eleitorais declarado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), grandes doadores, como empreiteiras e grupos de telecomunicação, entre outros segmentos, transferiram recursos para candidatos por meio de parceiros comerciais com o objetivo de ocultar parte das contribuições, relatou ao Valor um executivo próximo a um grande grupo.
Essa prática, confirmada por três parlamentares, é adotada quando empresas já atingiram o limite legal de doações, de 2% sobre o faturamento, ou, por alguma razão, não querem ser relacionadas à campanha de algum candidato. Em troca, o "laranja" (que aparece como doador) é remunerado pelo favor por meio de descontos ou pagamentos "extras" em contratos de negócio.
Dessa forma, as companhias lançam mão de mecanismos legais para fazer doações, mas sem recorrer a operações típicas de caixa dois. Há indícios de uso desse procedimento nas eleições de 2014, segundo apurou o Valor.
Sob a condição de se manter no anonimato, dois parlamentares disseram que o esquema existe, mas que não deram detalhes de como funciona. O terceiro afirmou que a prática é adotada por grupos empresariais de diversos setores.
A Operação Lava-Jato da Polícia Federal revelou a existência de um "clube" de empreiteiras para prestar serviços à Petrobras e o pagamento de propinas em contratos com a estatal. Parte do dinheiro teria sido repassada a partidos políticos por intermédio do doleiro Alberto Youssef. Os relatos, porém, sugerem a existência de outros canais usados por empreiteiras - tradicionalmente grandes doadoras de campanha - para abastecer o caixa das legendas.
O próprio doleiro, que aderiu à delação premiada, afirmou em seu depoimento que algumas doações a partidos feitas formalmente por empresas têm dinheiro oriundo do esquema de corrupção na Petrobras. Por conta disso, a Polícia Federal já investiga indícios de manobras envolvendo as contribuições legais de campanha, no âmbito da investigação geral referente à refinaria Abreu e Lima, de Pernambuco. A suspeita é que doações registradas tenham sido usadas como uma forma de lavagem de dinheiro.
Evidências de participação no esquema de notas frias do doleiro levaram a Justiça a decretar, em novembro, a prisão preventiva ou temporária de executivos das empresas Camargo Corrêa, OAS, Mendes Junior, Engevix, Galvão Engenharia, UTC, Queiroz Galvão e Iesa. Andrade Gutierrez e Odebrecht também são citadas nas investigações, mas não foram encontradas provas da ligação entre elas e o Youssef.
O desafio para os investigadores é que as doações feitas por meio de "laranjas" aparecem na contabilidade legal dos partidos. Oficialmente, quem faz a contribuição é uma determinada empresa. Porém, quem recebe o dinheiro é avisado de que os recursos partiram, na verdade, da cota de outra companhia.
O doador oficial pode ser um prestador de serviços da empresa em questão. Outra possibilidade são trocas de doações entre duas companhias. A empresa "A" dá uma contribuição a um candidato regional, mas prefere não torná-la pública. A companhia "B" faz a contribuição em seu nome e, em outra região, a empresa "A" devolve o favor.
Nesse processo, a doação é formalmente registrada, mas a origem do dinheiro fica camuflada. Com isso, fica mais difícil comprovar se aquele dinheiro esconde alguma irregularidade - como o pagamento de propinas, por exemplo.
Cumprir o limite legal é o principal atrativo da prática de contribuições feitas por meio de terceiros, disse um parlamentar a par do assunto. Segundo ele, disfarçar a ligação entre o doador e o beneficiário não é um motivo tão relevante, já que algumas empresas costumam financiar mais de uma centena de candidatos em todo o país. É comum um mesmo grupo doa para grupos políticos opostos.
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