- Folha de S. Paulo
A traição é o motor da dinâmica interpessoal da política desde que descemos das árvores, e vem sendo exercida com galhardia pelos corredores brasilienses nesta semana que antecede a eleição ao comando da Câmara.
É ela que garante alguma imprevisibilidade na disputa de lado a lado. Ao final deste domingo saberemos se Eduardo Cunha manteve seu favoritismo, que já foi bem mais franco.
Se vencer, a real derrotada será Dilma Rousseff, que liberou os ministros para fazerem o diabo contra Cunha e então terá de lidar com o seu malvado favorito.
Há muita mística em torno do deputado fluminense. De "gênio do mal" a apenas "gênio", suas alcunhas decorrem de um intelecto privilegiado a serviço de interesses bem focados. Você pode gostar ou não dele, mas sua capacidade tática é inegável --méritos estratégicos precisam de mais tempo para avaliação.
Isso não o torna imbatível, como já foi demonstrado, mas é garantia de que ele sempre terá elevado o preço da conta final, vendendo dificuldades para auferir facilidades.
Hoje é mais fácil imaginar um presidente Cunha deixando a porta da ameaça de um processo de impeachment aberta, para ficar no extremo, do que realmente levar algo a cabo.
Isso, claro, numa conjuntura de governabilidade estável. O terrível para o Planalto é que o país está no meio de um redemoinho: a debacle da Petrobras, as denúncias da Lava Jato, um sem-fim de indicadores econômicos ruins, dúvidas sobre o ajuste, uma crise hídrica e energética cujos contornos dramáticos não pouparão nenhum governo.
Sendo ou não exagero conjecturar sobre isso, a situação deixa o Planalto ressabiado --daí o esforço pró-Chinaglia, que pode mostrar-se um erro. Há uns meses, Dilma fez uma careta ao ser questionada sobre a relação com Cunha. Resignou-se: "Nós estamos convivendo há muito tempo com ele". Hoje ela soa profética.
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