- O Estado de S. Paulo
Mesmo com todos os truques e pedaladas fiscais, o resultado das contas do setor público em 2014 é um desastre.
O que era para ser um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), cuja meta começou 2014 em 2,1% do PIB e foi diminuindo sucessivamente até se reduzir a uma vaga promessa de R$ 10 bilhões, acabou no rombo de R$ 32,5 bilhões. Foi o primeiro déficit primário do setor público desde 2001.
Se a esse número forem acrescentadas as despesas com os juros da dívida, o rombo (déficit nominal) sobe para R$ 343,9 bilhões. Ainda assim, despesas que eram para ser feitas em anos anteriores ficaram para 2015. Na quinta, o secretário do Tesouro, Marcelo Saintive, mencionou R$ 226 bilhões em restos a pagar que farão parte da programação financeira deste ano.
Descalabro é a expressão adequada para qualificar a política fiscal do governo Dilma, tocada pelo ex-ministro Guido Mantega e pelo ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. Foi o resultado dos programas eleitorais de 2014. Alegar que outros países estão em situação pior é como o canceroso dizer que outros também tem câncer. Diante desses números, não há opção senão a volta à austeridade. Não foi uma decisão tomada livre e alegremente pela presidente. Foi falta de outra saída. Se vai ser suficiente ou não, depende do que se pretende.
A decisão foi entregar em 2015 um superávit primário de 1,2% do PIB, algo próximo dos R$ 66 bilhões. Pode não ser suficiente para o objetivo imediato mais importante, que é o de evitar o rebaixamento da qualidade dos títulos públicos do Brasil ao grau de especulação. Muita gente acha isso bobagem, objetivo que faz o jogo dos banqueiros. O problema é que, se esse rebaixamento acontecer, as despesas com os juros da dívida aumentarão, não só para o Tesouro, mas também para as empresas. Seria novo desastre.
As primeiras reações ao abandono da política econômica experimentalista anterior e à volta ao receituário clássico são positivas. Há notório aumento do nível de confiança, aqui e no exterior.
Mas as encrencas a enfrentar em 2015 são ainda maiores do que as de 2014. Primeiramente, há o saneamento já iniciado, cujo resultado não está claro, porque, aparentemente, há mais esqueletos fiscais a descobrir. Esse saneamento terá de acontecer num ambiente de baixíssimo crescimento econômico e, portanto, de arrecadação acanhada, mesmo com os aumentos de impostos. De todo modo, apesar dos percalços, os analistas apostam em que será cumprido.
Em segundo lugar, há a incerteza que cerca o suprimento de energia elétrica e de água potável, fatores que derrubam o investimento e espalham o desalento.
Em terceiro lugar, sabe-se lá como vão evoluir a crise da Petrobrás e os desdobramentos da Operação Lava Jato. A presidente vem afirmando que as empresas não podem ser abatidas a tiros de Judiciário. Mas como evitar? É a lei que barra o acesso das empreiteiras corruptas às licitações de serviços públicos.
Mas a incerteza maior está na área política. E cerca não só os políticos já indiciados e os que ainda serão acusados de corrupção, mas a sustentação das próprias bases do governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário