quinta-feira, 26 de março de 2015

Novo partido agrava crise entre PMDB e Dilma

PMDB acusa Dilma de manobra

• Partido considera que governo atuou com Kassab para tentar viabilizar PL e promete retaliação

Simone Iglesias, Júnia Gama, André de Souza e Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - O aparentemente inesgotável contencioso entre a presidente Dilma Rousseff e o PMDB ganhou novo capítulo ontem com a interpretação do partido de que o governo tentou uma manobra, em parceria com o ministro Gilberto Kassab (Cidades), para enfraquecê-lo. Segundo peemedebistas, antes de sancionar com vetos a lei que dificulta fusões e a criação de novos partidos, o Palácio do Planalto incentivou Kassab a protocolar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o pedido de fundação do PL, para que não fosse afetado pelas novas regras, mais rígidas, o que foi feito na noite de segunda-feira. A cúpula do PMDB tratou do episódio como "golpe" e "molecagem" do governo e já fala em retaliação. Eduardo Cunha anunciou que seu partido entrará na briga judicial para implodir a criação do PL, e que o Congresso "trabalhará com toda a força" para derrubar o veto da presidente.

Ao perceber a suposta manobra, o vice-presidente Michel Temer ficou furioso e telefonou para o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), na noite de terça-feira.

- Esse tipo de coisa só atrapalha. O ambiente ficou muito ruim no partido - disse Temer a Mercadante, segundo relato de peemedebistas que acompanharam a conversa.

Mercadante afirmou ao vice que não tinha nada a ver com o assunto e responsabilizou Kassab. Logo depois, Kassab telefonou para três senadores do PMDB dizendo que agiu a pedido do Planalto.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também demonstrou irritação com o que considerou uma manobra do Planalto para enfraquecer o maior partido da base aliada e disse que isso piora ainda mais a relação com a presidente:

- Houve uma estrutura de governo que deixou para o último dia para sancionar (lei aprovada no Congresso sobre criação e fusão de partidos), e o Kassab se aproveitou e protocolou (o PL) na véspera. Isso mostra, mais uma vez, que o governo estava empenhado na criação desse partido.

O clima piorou na manhã de ontem, quando Dilma sancionou a lei, mas com um veto à janela de 30 dias que permitia aos parlamentares migrarem para partidos resultantes de fusão sem perder o mandato. O veto, segundo peemedebistas, prejudica projetos de fusão que estão em discussão, envolvendo DEM, PTB e o próprio PMDB.

- Isso é um projeto de enfraquecimento do PMDB e já foi fartamente denunciado. Então, temos que combater esse processo e vamos combater de todas as formas. Na Justiça, na política, derrubando o veto, de todas as maneiras - afirmou Cunha.

Na prática, a lei foi aprovada no Congresso com dois objetivos: o primeiro, impedir que o PL fosse criado e imediatamente se fundisse ao PSD, de Kassab, formando uma nova legenda forte a ponto de permitir ao governo isolar o PMDB. O segundo, para favorecer partidos antigos, como DEM, PTB e o próprio PMDB, a negociarem fusões e ganharem a janela que permite o troca-troca. A primeira parte da lei, que proíbe fusões de partidos com menos de cinco anos de fundação, foi mantida por Dilma. No entanto, ela vetou a janela para os antigos.

Como a lei foi aprovada no Congresso contra a vontade do governo, e a presidente tem prazo legal de 15 dias para a sanção, ela deixou para assiná-la depois de o PL pedir o protocolo no TSE. Com isso, o novo partido tentará reger sua criação pela lei anterior, que permite a fusão. Um ministro do TSE ouvido pelo GLOBO afirmou que a tentativa não deve dar certo, porque o PL não apresentou todos os requisitos necessários para sua criação, como 485 mil assinaturas de apoio. No entanto, disse que foi criada uma situação jurídica que terá que ser analisada futuramente.

Nada feito "às escondidas"
Ontem, Kassab disse que o partido está sendo formado por "companheiros que queriam entrar no PSD" e que nada é feito "às escondidas". Ele não descartou uma fusão no futuro entre o PSD e o PL, afirmando que são partidos "muito próximos".

- Nós não temos nenhuma participação direta ou indireta. São companheiros, na sua grande maioria, que queriam entrar no PSD e não entraram, e estão formando um outro partido. É público que são pessoas próximas do PSD - disse o ministro, que alegou ter ficado sabendo pela imprensa do registro do PL no TSE.

O PMDB se reuniu ontem para tratar do tema. Na reunião da bancada na Câmara, alguns deputados reclamaram de Dilma Rousseff ter esperado até o último dia do prazo para sancionar o projeto.
- A leitura é que ela empurrou com a barriga para dar esse golpe. O PMDB ficou muito irritado com isso, com a demora em sancionar o projeto e permitir criar um impasse jurídico. Ela tinha 30 dias e deixa para o último dia, para dar tempo do Kassab registrar o PL? Até isso ela não sabia? Cria um mal-estar - criticou o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) acrescentou:

- Vamos brigar contra essa esperteza.

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