• Duráveis puxam retração de 0,8%, mas redução no poder de compra das famílias leva setor alimentício à terceira queda trimestral seguida
Aline Salgado – Brasil Econômico
A deterioração da renda real dos trabalhadores, pressionada pela escalada da inflação e o aumento do desemprego, já chegou à mesa das famílias brasileiras, gerando retração nas vendas do setor alimentício pelo terceiro trimestre consecutivo. Segundo a Pesquisa Mensal do Comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PMC/IBGE), a atividade de hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo teve queda de 1,3%nas vendas no acumulado de janeiro a março. O recuo no desempenho do 1º trimestre do ano foi antecedido pelas retrações de 0,2% no 4º trimestre e de 1,2% no 3º trimestre de 2014. Em termos gerais, as vendas do comércio registraram no período de janeiro a março queda de 0,8% — o pior 1º trimestre desde 2003, quando o desempenho havia sido de -6,1%.
Já no varejo ampliado, que engloba também a comercialização de veículos e motos, partes e peças e materiais de construção, as vendas caíram 5,3%, o pior desempenho de toda a série histórica do IBGE, iniciada em 2004. Economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Fabio Bentes ressalta que o primeiro trimestre do ano apontou para uma das inflações mais altas no setor de hiper e supermercados. O deflator da PMC registrou aumento de 8,2% no período, enquanto que no primeiro trimestre do ano passado era de 5,9%. "As famílias precisam se alimentar, mas quando há dificuldades de a renda acompanhar o ritmo da inflação, a saída é cortar até no consumo de alimentos", diz Bentes, lembrando que, no 1º trimestre do ano passado, o setor alimentício atingiu crescimento de 2,6% nas vendas. O corte nas despesas nos supermercados acontece, especialmente, via troca de marcas.
Presidente do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar), Claudio Felisoni de Angelo, afirma que, em momento de orçamento apertado, o primeiro movimento dos consumidores nos mercados é manter a marca e diminuir a quantidade. Mas, com a escalada da inflação, a estratégia passa a ser a troca da marca e, por fim, a suspensão da compra de determinados produtos. "Cereais matutinos e até itens de higiene pessoal, como o fio dental, são os primeiros a serem cortados da lista de compras", afirma Felisoni. "A retração das vendas nos supermercados mostra um aprofundamento do processo recessivo da economia", acrescenta o executivo. No Rio de Janeiro, os donos de supermercados já identificaram um aumento na troca de marcas por parte dos consumidores das classes de renda mais baixa —C, D e E. É o que conta o presidente da Associação de Supermercados do Estado do Rio (Asserj), Aylton Fornari.
"As famílias não estão deixando de se alimentar, mas têm gastado menos, com a substituição de marcas", observa. Do lado dos bens duráveis, a combinação de crédito restrito, juros altos e queda na confiança das famílias continua abalando fortemente as vendas. Segundo o IBGE, a comercialização de veículos e motos, partes e peças caiu 14,8%no trimestre. Logo atrás está o setor de móveis, com retração de 10,3%. Já os eletrodomésticos tiveram queda de 5%. A retração acontece apesar de a inflação desses itens estar em níveis inferiores aos do ano passado. Em julho de 2014, a inflação dos bens comercializáveis (semiduráveis, duráveis e alimentos industrializados) atingira pico de 7,1%, segundo dados do Banco Central (BC). Em abril deste ano, a inflação desses bens cedeu, ficando em 5,64%. "Os números do BC mostram que o varejo perdeu poder de repasse de preços. Se os comerciantes repassassem as pressões com a alta do dólar, da energia e da água, o que está ruim para o setor poderia ficar pior", avalia Fabio Bentes, que projeta retração de 0,4% no varejo restrito este ano.
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