Com a saída de Joaquim Levy do Ministério da Fazenda, a presidente Dilma Rousseff vira uma página do seu atribulado segundo mandato. O Planalto continua totalmente empenhado na luta para evitar o impeachment e, embora esse não seja o motivo para se desvencilhar de Levy, a ascensão de Nelson Barbosa é uma garantia de que não haverá obstáculos para a execução de medidas econômicas que eventualmente sejam necessárias para atingir este objetivo e, se possível, reduzir a grande impopularidade da presidente.
A escolha de Barbosa, uma solução caseira, permite que a presidente Dilma possa por em prática sua política para tentar debelar a profunda e longa recessão causada pelos desacertos cometidos no primeiro mandato, no qual o novo ministro da Fazenda foi um protagonista. A biografia de Barbosa deixa suspeitas de que possa haver a recauchutagem da fracassada "nova matriz econômica" ou de que a política fiscal será bem mais tolerante do que a pretendida Joaquim Levy em seus constantes embates dentro do governo.
No mesmo dia em que foi anunciada a troca de ministros, Jaques Wagner, da Casa Civil, deixou claro que o verdadeiro titular do cargo era a presidente e insinuou que ela pretende "modular" a política econômica, o que diz muito sobre seus propósitos. Lula, em reunião com Dilma, pressionou para que o governo petista parasse de falar em ajuste e desse crédito e alento para a economia. Os sinais, portanto, são de um afrouxamento na política fiscal que Levy, por seu lado, não conseguiu levar até o fim, pela resistência encontrada de Dilma e de seu então ministro do Planejamento.
Apesar de Barbosa ter repisado que o equilíbrio fiscal é importante para combater a inflação e trazer de volta o crescimento, e que a "direção da política econômica é a mesma", ele não chega ao cargo para prosseguir a política do liberal Levy. Nas desavenças sobre a política fiscal entre Barbosa e Levy, o novo ministro defendeu que em agosto se enviasse um Orçamento com déficit para o Congresso, um dos motivos para que a Standard & Poor's retirasse do Brasil o grau de investimento. No último episódio, ao lado de Dilma, o governo decidiu apresentar proposta de superávit primário zero para 2016, com permissão de abatimentos que o isentassem da meta de 0,5%, contra a opinião de Levy.
Acuado e sem perspectivas, o governo até agora deu a impressão de que não tem uma política para enfrentar a crise diferente daquela que praticou nos últimos anos e que provocou enorme recessão: gastos e subsídios do governo para empresas e programas sociais, boa oferta de crédito oficial, juros baixos. Barbosa terá de criar uma política anticíclica diferente, ou gerir a economia com baixa ambição de mudanças, ou então alinhar-se com ideias de expansionismo fiscal que nunca deixaram de habitar o Planalto e das quais comungou.
A opção por Barbosa vem acompanhada de mais uma mudança no tempestuoso horizonte político. As decisões do STF sobre o rito do impeachment foram objetivamente favoráveis ao governo e tornaram o impedimento de Dilma quase impossível. Mas a Lava-Jato continua produzindo surpresas e a última delas atingiu duas alas do PMDB, a aliada de Renan Calheiros, presidente do Senado, e a oficial de Michel Temer. Eduardo Cunha foi brindado com um pedido de afastamento e Polícia Federal colheu material investigativo de outro aliado do vice-presidente Michel Temer, o ministro Henrique Alves. Renan teve o sigilo quebrado e mais denúncias contra ele.
Em situação mais favorável ao governo, com alguma queda na impopularidade da presidente, não o retira da encruzilhada. PT e movimentos sociais pressionam por uma guinada à esquerda, para romper o círculo vicioso de recessão e crise política. Mas o Planalto trocou sua dependência de Cunha pela de Renan, algo incompatível com uma virada esquerdista. O preço a pagar por alianças é alto e o Planalto já assiste a mais uma investida, agora da ala Renan, pela substituição do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com o objetivo de domar a Lava-Jato.
A reação do mercado, por dois dias, mostra ampla desconfiança nos desígnios do governo Dilma e na gestão de Barbosa à frente da economia. Até agora os investidores olharam o passado do ministro. Barbosa e eles estão de acordo em um ponto - "credibilidade é função de resultado", como disse o ministro ao Valor. Para dissipar dúvidas, Barbosa precisa agir logo para mostrar que caminha na direção correta.
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