quinta-feira, 11 de junho de 2015

José Roberto de Toledo - O poço e a escada

- O Estado de S. Paulo

O forte aumento dos preços ao consumidor captado pelo IPCA em maio surpreendeu os economistas, mas não a população. Mais da metade dos brasileiros – 56%, segundo pesquisa inédita do Ibope Inteligência – aponta a inflação como principal sintoma da crise econômica no Brasil. Sim, crise. Essa é a palavra usada por 87% dos entrevistados para definir a situação econômica no País.

Em todos os segmentos sociais, sem exceção, a crise na economia é constatada por mais de 80% das pessoas. A taxa supera 90% entre os mais ricos, escolarizados e moradores das metrópoles. De tão universalizada, parece óbvia. Não é – ao menos para os 10% que não enxergam crise. Eles não estão todos em Brasília, mas faz pouco tempo que o discurso oficial deixou de tratar a crise como mero reflexo de um problema provocado alhures.

A crise brasileira entrou sem relativismo no discurso de Dilma Rousseff só depois do panelaço que acompanhou o último pronunciamento presidencial na TV, por ocasião do Dia da Mulher, em 8 de março. Até então, praticamente todas as raras menções à palavra “crise” vinham acompanhadas do adjetivo “internacional”. Na noite das panelas, a presidente ainda dizia: “Nem de longe (o Brasil) está vivendo uma crise nas dimensões que dizem alguns”.

É um tom distinto do que Dilma usou na terça-feira passada, quando – ao anunciar seu plano de investimentos em infraestrutura – procurou justificar os cortes de despesas e os aumentos de impostos propostos no ajuste fiscal como armas “de superação da crise econômica que atravessamos”. Nada de culpar a crise internacional. A crise agora é “das finanças públicas”.

Demorou, mas o diagnóstico do governo deixou de ignorar o da opinião pública. É um degrau a menos – insuficiente, mas necessário – que Dilma precisa escalar para sair do poço de impopularidade que ajudou a cavar. É uma longa escada, porém.

Depois da inflação, um dos sinais que mais caracteriza a crise econômica é o aumento dos juros, destacado por 28% da população. Nesta quarta-feira, soube-se que a taxa cobrada de quem usa cartão de crédito é a maior desde 1999: 304% ao ano. Também subiram os juros do cheque especial, de financiamento ao consumidor e de empréstimos para pessoas físicas e empresas.

A percepção popular de que o Brasil vive uma crise econômica também se baseia na experiência laboral de 1 em cada 4 brasileiros: 19% disseram ao Ibope conhecer alguém que perdeu o emprego, e 8% afirmam ser eles próprios vítima do desemprego.

Ao aumento do risco de ficar desempregado combinam-se a inflação em alta, dificuldades crescentes de financiar novas compras e aumento do custo para pagar as dívidas já contraídas. O resultado, como não poderia deixar de ser, é um pessimismo crescente dos brasileiros em relação à sua situação financeira. E isso é fatal para a popularidade de qualquer presidente.

Segundo estudo do Ibope, para cada ponto porcentual que cresce a percepção do brasileiro de que sua renda vai diminuir, a desaprovação do governo federal aumenta 2,61 pontos. A recíproca é verdadeira: para cada ponto a mais de otimismo em relação ao dinheiro no seu bolso, a aprovação do presidente pelo eleitor tende a crescer 2,9 pontos. Mas otimistas estão em falta.

Embora não seja a única causa, o que mais bem explica a perda de popularidade de Dilma é a expectativa negativa do brasileiro sobre o mercado de trabalho. Quanto mais ele teme por seu emprego, maior a relação com a desaprovação do governo. A taxa de desemprego, já em alta, pode crescer devido ao ajuste fiscal.

A escalada de Dilma nos próximos meses será cheia de degraus escorregadios: crise econômica sem adjetivos, vagas de trabalho fechando e juros subindo. Para levar consigo a opinião pública, precisará convencê-la de que a escada leva à boca do poço – e não ao fundo. E isso, só apontando a lanterna para frente.

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