Vera Rosa e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo
• Partido abre congresso em Salvador com desagravo, ao mesmo tempo em que discute reconstrução da imagem da legenda sem listar erros em escândalos nem as críticas ao ajuste fiscal; em crise com a sigla, Dilma antecipa volta e confirma presença
SALVADOR - Sem fazer um inventário dos erros cometidos desde o escândalo do mensalão, o PT abrirá nesta quinta-feira, 11, seu 5.º Congresso, em Salvador, com manifestações de apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que agora viu o instituto com seu nome aparecer nas investigações da Operação Lava Jato. Além de Lula, a abertura do encontro contará com a presença da presidente Dilma Rousseff que, cobrada pelo partido, decidiu adiantar a volta de uma viagem à Bélgica para participar do ato.
O desagravo a Lula será feito em discursos de dirigentes do PT, que tentam associar a denúncia a uma “criminalização” das doações recebidas pelo partido. “Defendo que tenha (desagravo). É algo que deve acontecer de forma espontânea”, disse Francisco Rocha, o Rochinha, coordenador da corrente majoritária Construindo um Novo Brasil (CNB), da qual Lula faz parte. “Atos de solidariedade são naturais, ainda mais nesse momento”, afirmou o presidente do PT paulista, Emídio de Souza.
Embora não seja formalmente investigado, o ex-presidente entrou na berlinda após as revelações de que se reuniu com o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa pouco antes da compra da refinaria de Pasadena (EUA) e de que a Camargo Corrêa, investigada na Lava Jato, doou R$ 3 milhões ao Instituto Lula. A organização diz que as contribuições foram regulares. Além disso, a empreiteira pagou R$ 1,5 milhão à LILS, pertencente ao ex-presidente, por palestras feitas entre 2011 e 2013.
Alvo. Parlamentares de oposição que integram a CPI da Petrobrás protocolaram nesta quarta requerimentos pedindo a convocação do presidente do instituto, Paulo Okamotto, para explicar as doações. Além disso, ameaçam pedir na sessão desta quinta a quebra dos sigilos fiscal e bancário da organização, além da convocação do próprio Lula.
Para dirigentes petistas, passado o momento mais agudo da ameaça de impeachment contra Dilma, a oposição agora concentra forças contra Lula. Um dos objetivos do Congresso de Salvador é preparar o PT, que atravessa a maior crise em 35 anos de existência, para um processo de recuperação da imagem, que possibilite a volta de Lula ao cenário eleitoral em 2018.
As perspectivas, porém, são pessimistas. Apontado até o início do ano como favorito contra qualquer adversário, Lula está enfraquecido. Pesquisa Vox Populi encomendada pelo PT e apresentada à cúpula do partido na segunda-feira mostra o ex-presidente em empate numérico com o senador Aécio Neves (PSDB-MG), derrotado por Dilma no ano passado.
A corrente de Lula defende uma guinada à esquerda e a formação de uma frente progressista nos moldes da que governa o Uruguai desde 2005, a fim de recuperar parte do eleitorado perdido após os escândalos de corrupção e o ajuste fiscal promovido por Dilma. A “Carta de Salvador” redigida pela CNB, porém, não faz autocrítica sobre os problemas éticos nem contesta a política econômica.
Por isso, o texto proposto pelo grupo de Lula é considerado insuficiente pelas correntes mais à esquerda. “No capítulo do partido, a Carta de Salvador é uma alienação conservadora”, disse Joaquim Soriano, diretor da Fundação Perseu Abramo e líder da Democracia Socialista (DS). “É uma transformação tão lenta, tão segura, tão gradual, que parece acreditar ser possível mudar sem mudança”, completou Valter Pomar, da Articulação de Esquerda.
Dilma e o PT nunca estiveram tão distantes. Nos bastidores, os petistas reclamam da falta de diálogo, de seu estilo avesso a negociações políticas e de que o PT só fica com o ônus da crise. A ordem para amenizar as críticas ao ajuste deve ser aprovada na resolução final do congresso petista, mas rachou o partido. A gritaria contra a ortodoxia econômica é geral.
Lula também se queixa da afilhada, mas tenta manter as aparências. Uma ala do PT queria lançar Lula candidato à Presidência, em 2018, mas foi desaconselhada a tomar a iniciativa. Para completar, o partido se prepara para protestos na frente do hotel do evento, promovido por grupos anti-PT e anti-Dilma.
Colaboraram Ana Fernandes, Daiene Cardoso e Andrei Netto
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