• R$ 12 bilhões de depósitos judiciais voltam a ser receita
- Valor Econômico
O Banco Central emitiu alguns sinais importantes nas últimas horas sobre os rumos da política monetária. A inflação atingiu o pico em 12 meses em janeiro, deve cair dois pontos percentuais no primeiro semestre, mas o cenário atual ainda não permite cogitar a redução da Selic. Se não cai, a taxa de juros também não vai subir.
Do lado da política fiscal, o governo anuncia hoje o contingenciamento do Orçamento que virá acompanhado de medidas singulares. Uma delas é a criação, por projeto de lei, de um fundo com cerca de R$ 12 bilhões em depósitos judiciais que estão na Caixa e no Banco do Brasil aguardando o saque pelo beneficiário final.
São recursos que estão parados há pelo menos cinco anos e que já foram contabilizados como gasto. Indo para esse fundo, transformam-se novamente em receita primária da União até que o beneficiário vá ao banco e retire o dinheiro. Aí ele volta a ser despesa.
Deverá, também, apartar receitas incertas como a da CPMF que, se não se realizarem, abatem da meta fiscal. Com isso, foi possível atenuar um pouco o contingenciamento de um Orçamento que, alega-se no governo, está no osso. "Não há mais gordura para uma lipoaspiração. Agora é amputação mesmo!", comentou uma fonte oficial.
Embora o Banco Central considere nas suas projeções a meta oficial de superávit primário para este ano, a política fiscal não produzirá o saldo de 0,5% do PIB. Com muito esforço o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, acha que poderá chegar a dezembro com receitas e despesas empatadas. Mas isso só viria a ocorrer se a economia parar de cair e começar a crescer no segundo semestre.
O pacote de medidas que a Fazenda está concluindo vai instituir a banda de flutuação da meta de resultado primário - de um déficit de 1% do PIB a um superávit de 0,5% do PIB; criar um limite para o crescimento do gasto público em valores nominais; e definir os gatilhos para conter despesas, quando o resultado da política fiscal se desviar da banda de flutuação pretendida.
Serão estabelecidas etapas de reação em caso de frustração de receitas, começando com a suspensão de reajustes de salários do setor público, suspensão de reajustes de programas sociais até o "sequestro" parcial de receitas destinadas à gastos previstos em lei ou na Constituição, como as despesas com saúde e educação. Isso será definido em uma emenda constitucional.
Há, ainda, a renegociação da dívida dos Estados e municípios com a União, cujo prazo será alongado por mais uns 20 anos. Essa é uma medida que muda a Lei de Responsabilidade Fiscal na parte em que proíbe o refinanciamento dessa dívida. Novos prazos e condições serão estabelecidos e os Estados poderão aderir ou não aos novos contratos.
O governo não vai esperar um consenso sobre a reforma da previdência para apresenta-la ao Congresso, informou uma fonte oficial.
A reação das centrais sindicais contra a reforma não surpreendeu. O Fórum da Previdência iria se reunir no Ministério do Trabalho, mas a presidente Dilma Rousseff, ciente das divergências dentro do próprio governo, transferiu o encontro para o Palácio do Planalto para lhe dar peso maior.
O secretário especial da Previdência, Carlos Gabas, até recentemente avesso à reforma, expôs as linhas da proposta de Barbosa e argumentou que o país ainda tem tempo para implementar as mudanças na Previdência sem atingir direitos adquiridos. Lembrou que Itália e Grécia tiveram que cortar em cerca de 40% benefícios já concedidos. O ministro Miguel Rossetto está do lado das centrais.
A reunião de Barbosa com a bancada do PT na noite de terça feira, das 20h às 23h, foi, segundo fontes que estavam presentes, melhor do que as indicações vindas do PT, que quer marcar posição de distanciamento do governo. Tratou-se ali basicamente da reforma da Previdência. Houve um embate político. "Vamos deixar essa reforma para os tucanos fazerem", disse um senador. " Estamos em busca da popularidade zero?", indagou um outro, alegando que estava ali para uma agenda do crescimento e da geração de emprego.
O ministro explicou que a questão mais importante do país hoje, que corrói as expectativas e mina a confiança, é a fiscal e que a reforma da Previdência está no centro da equação das contas públicas. Crescimento e emprego, portanto, estão umbilicalmente atrelados à disposição do governo em mexer na Previdência, a maior despesa do setor público depois dos juros da dívida, que no ano passado representou 8,46% do PIB (gasto por competência).
A taxa de juros, por seu lado, deve ficar estacionada em 14,25% ao ano até que as expectativas do mercado para a inflação comecem a convergir para uma inflação no teto da meta de 6,5% este ano e para a meta de 4,5% em 2017, como indicou o diretor do BC, Aldo Mendes, ontem, em evento do banco Goldman Sachs. O texto do pronunciamento de Mendes foi avalizado pelo presidente Alexandre Tombini.
Não está mencionado no discurso do diretor, mas o Copom conta, também, com uma taxa de câmbio razoavelmente comportada (em um intervalo, por exemplo, de R$ 3,90 e R$ 4,10) para poder começar a pensar na possibilidade de reduzir os juros. A direção do BC, porém, não quer falar nesse momento sobre um eventual afrouxamento monetário.
Nos últimos dias foram vários os contatos da autoridade monetária com analistas e economistas do mercado financeiro, que procuram enxergar nos mínimos sinais a estratégia do Comitê de Política Monetária (Copom) para as próximas reuniões. Dessas conversas ficou a impressão de que os juros básicos podem permanecer no atual patamar por um tempo não muito logo. O viés e o desejo do Copom são de baixa, até porque a economia afunda. Os preços dos alimentos, que vinham pressionando a inflação, já começaram a cair no atacado e essa queda está chegando nas coletas de preços do IPCA deste mês.
A política fiscal, crucial para o Copom poder mirar uma queda dos juros no horizonte, está indefinida. Todos os passos traçados dependem do Congresso. E lá as forças do governo são limitadas.
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