- Folha de S. Paulo
A banalização do termo "histórico" para descrever eventos da vida nacional é vício do jornalismo contemporâneo. Mas a decisão do Supremo Tribunal Federal acerca do momento da execução de uma pena é exceção para o seu uso.
Ao definir que uma confirmação em segunda instância de condenação é suficiente para iniciar a punição, o STF não apenas reviu algo decidido no recente 2009 como absorveu o "Zeitgeist" vigente do país destroçado em que vivemos.
A virtude da decisão salta aos olhos: a impunidade decorrente dos recursos infinitos tende a ser coibida. Apesar do choro das guildas preocupadas com a minoria de culpados endinheirados afetada pela medida (e sem "plutofobia"!), parece bem razoável termos dois graus de jurisdição, até porque ainda caberão recursos. Nos EUA, o uniforme colorido e as correntes vêm com o primeiro bater do martelo em casos graves.
Um outro lado da moeda brilha igualmente: a legião de PPPs (presos, pobres e pretos) encarcerados por motivos fúteis ou menores pode aumentar. Além disso, a medida ignora o maior problema prisional brasileiro: cerca de um terço dos detentos não foi sequer julgado, e não estamos a falar de estrelas de Curitiba.
Nessa inflexão da tradição romana vigente para um aspecto anglo-saxão do direito, muita tensão terá de ser administrada. Pecam os estridentes: é óbvio que há erros e excessos por parte do aparato jurídico-policial que subsiste como bastião na dissolução brasileira, assim como o legalismo muitas vezes se confunde com leniência ou coisa pior.
Emerge, assim, a figura do juiz-símbolo da Lava Jato, Sergio Moro, que encarna o espírito deste tempo, substituindo o muito mais questionável Joaquim Barbosa. Se não assistirmos a uma "morolização", no sentido personalista que sempre ameaça acompanhar movimentos análogos no Brasil, o país terá a ganhar com a moralização ao fim do processo.
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