Atestado de propina eleitoral
• Moro liga doações a propinas; Procuradoria Geral Eleitoral apoia uso dos dados em ação contra Dilma
Carolina Brígido, Jailton carvalho de Renato Onofre - O Globo
- BRASÍLIA E SÃO PAULO- Os dados da Operação Lava- Jato que o juiz Sérgio Moro entregou em outubro do ano passado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), comprovando que doações eleitorais foram feitas com dinheiro desviado da Petrobras, receberam parecer favorável da Procuradoria Geral Eleitoral para que sejam incluídos em um dos processos que pedem a cassação da presidente Dilma Rousseff e do vice Michel Temer.
Os documentos foram anexados na ação que pede a cassação da presidente e do vice por crime eleitoral, proposta pela coligação do senador Aécio Neves (PSDB), derrotado na eleição de 2014. Moro se comprometeu ainda a entregar ao TSE qualquer nova informação que venha a provar que o dinheiro de corrupção abasteceu campanhas eleitorais.
O processo já está em fase adiantada de investigação, e a expectativa no tribunal é que o caso seja julgado em plenário até setembro, definindo o destino da presidente. O processo foi abastecido com material enviado por Moro, que conduz a Lava- Jato na primeira instância.
Logo que recebeu o material do juiz, a relatora do processo, ministra Maria Thereza de Assis Moura, que também é a corregedora do tribunal, concedeu três dias de prazo para que o PT e o PSDB, as partes envolvidas, se manifestassem sobre os documentos. Os advogados de Dilma pediram ao TSE para não considerar os documentos de Moro na investigação eleitoral, sob a alegação de impropriedade na transferência de provas de um processo para outro. Os tucanos defenderam a legitimidade do uso das provas.
Delatores serão ouvidos no TSE
Em seguida, no dia 10 de dezembro, a ministra enviou o processo para a Procuradoria Geral Eleitoral e pediu um parecer. Embora já esteja concluída, a manifestação do procurador ainda não chegou ao gabinete da relatora. No parecer, com data do último dia 5, o vice- procurador-geral eleitoral, Eugênio Aragão, se declarou favorável à inclusão dos documentos da Lava- Jato enviados por Moro no processo que tramita no TSE. A decisão do procurador representa uma derrota para a presidente.
“No que concerne à possibilidade de juntada aos autos dos documentos enviados pelo Juízo da 13 ª Vara Federal de Curitiba/ PR, não vislumbra o Procurador- Geral Eleitoral qualquer irregularidade”, afirmou Aragão. Nos documentos enviados ao tribunal, Moro informa que delatores da Lava- Jato apontaram pagamentos de propina registrados como doações eleitorais. Para Aragão, não há qualquer problema na inclusão destes documentos no processo sobre a campanha da presidente.
“O argumento de que essa documentação não pode ser admitida como prova emprestada não se aplica a hipótese, tendo em vista que as denúncias e sentenças encaminhadas não constituem, em si, prova de qualquer dos fatos nela referidos”, diz o procurador. “Tais documentos apenas retratam o entendimento dos membros do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário oficiantes naqueles feitos”, alegou.
Aragão também endossou pedido para que investigados da Lava- Jato sejam ouvidos como testemunhas das acusações. Entre as testemunhas estão delatores mencionados por Moro nos documentos encaminhados ao TSE. Assim que receber o processo de volta, a relatora pretende determinar diligências, depoimentos e outros procedimentos complementares para instruir o caso.
Corregedor eleitoral pediu informações
Não há prazo previsto para essa etapa ser concluída, mas a expectativa é de que o caso seja julgado em setembro. Se essa previsão for confirmada, Maria Thereza já não estará mais no tribunal. Isso porque o mandato dela termina no dia 1 º de setembro. Ou seja, embora tenha conduzido toda a investigação, ela provavelmente não será a relatora do processo na data do julgamento. Maria Thereza será substituída na corregedoria do TSE pelo ministro Herman Benjamin. Outra mudança significativa ocorrerá em breve no tribunal. O presidente, ministro Dias Toffoli, deixará o cargo em maio. Será substituído pelo atual vice- presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, que não poupa críticas ao governo Dilma.
A constatação de Moro foi encaminhada ao TSE em outubro do ano passado, após pedido de informação do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro João Otávio de Noronha. Moro recomendou ainda que o tribunal ouvisse delatores da Lava- Jato que “declararam que parte dos recursos acertados no esquema criminoso da Petrobras era destinada a doações eleitorais registradas e não- registradas”.
Os envolvidos na Lava- Jato que trataram de propina através de doação de campanha, segundo Moro, foram o doleiro Alberto Youssef, o ex- diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, apontado como o coordenador do cartel das empreiteiras da estatal, o empresário Augusto Mendonça Neto, o lobista Milton Pascowitch e o ex- gerente de Serviço da estatal Pedro Barusco.
Ontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal ( STF) Gilmar Mendes alertou para o uso de dinheiro desviado da Petrobras nas campanhas municipais deste ano. Para o ministro, “certamente haverá tentativas de burlar a legislação” no próximo pleito.
— Pode ser que esses recursos venham para as eleições em forma de caixa dois ou até na forma disfarçada de caixa 1, porque nós vamos ter doação de pessoas físicas. Pode ser que recursos sejam dados a essas pessoas para que elas façam a doação aos partidos políticos ou aos candidatos. Então, tudo isso precisa ser olhado com muita cautela — disse Mendes durante evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Na Lava- Jato, o ex- tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi o primeiro político condenado por receber propinas por meio de doações oficiais. Em setembro do ano passado, foi condenado a 15 anos e 4 meses de prisão em regime fechado. A Justiça constatou que o petista operou o recebimento de R$ 4,26 milhões de dinheiro desviado da Petrobras através de contribuições ao PT.
Os pagamentos foram feitos em formas de doação aos diretórios do partido por empresas ligadas ao delator Augusto Mendonça, entre outubro de 2008 e março de 2012. Na sentença que condenou Vaccari, o juiz condenou a prática: “Produto do crime é sempre produto do crime. Mesmo quando submetido a condutas de ocultação e dissimulação. A realização de doações eleitorais registradas não é, por si só, ilícita. Mas se doações eleitorais registradas são realizadas como forma de pagamento de propina trata se de crime de corrupção”, afirmou o magistrado.
Doações visavam objetivos empresariais
Ricardo Pessoa já havia sido convocado em setembro de 2015 para prestar depoimento no TSE, mas se calou. Na época, o presidente da UTC afirmou que a delação ainda estava em segredo de Justiça. A delação premiada do empreiteiro veio a público no final do ano passado.
Aos investigadores, Pessoa disse que as doações oficiais proporcionavam “maior acesso aos tomadores de decisões, facilitando acesso mais rápido aos seus objetivos e interesses de uma maneira mais eficaz e célere”, e admitiu atrasar o pagamento de propinas perto do período eleitoral:
— Costumava atrasar os pagamentos de propina porque sabia que, na época das eleições, iria ser demandado novamente a fazer novos pagamentos — afirmou o empresário aos investigadores.
Em sua delação, Pessoa afirmou ainda que, em 2014, foi persuadido pelo atual ministro Edinho Silva (Comunicação), então tesoureiro da campanha à reeleição de Dilma, a aumentar as doações. O ministro nega a acusação.
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