- Folha de S. Paulo
São muitas as ironias da crise brasileira. A presidente Dilma Rousseff costuma apregoar que impeachment é golpe, embora tenha sido reeleita pelo maior estelionato eleitoral da política brasileira, ao mentir que o país, já falido, andava bem.
Lula, que pediu o impeachment do presidente Collor, deveria também ser chamado de golpista por Dilma, pois, ao defender o impedimento em 1992, entendeu ser esse instituto plenamente democrático.
É de se lembrar que, afastado pelo Congresso Nacional, Collor foi, posteriormente, absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Meu amigo e bom jurista José Eduardo Cardozo afirma não vislumbrar qualquer crime da presidente a embasar o impeachment.
Neste ponto, equivoca-se. Sobram crimes de improbidade administrativa, intensificados ainda por brutal omissão, ao permitir que um mar de lama se instalasse em sua administração.
Inúmeros de seus ministros e pessoas no exercício de elevadas funções em estatais permitiram assalto de bilhões de reais nos cofres públicos, destinando recursos a deputados, senadores, servidores, marqueteiros de sua campanha e tesoureiros de seu partido. Alguns já se encontram presos, denunciados ou indiciados como suspeitos.
Esse comportamento omissivo, que levou à destruição da Petrobras, está previsto na lei nº 8.429/92, considerada constitucional pelo STF, como ato de improbidade administrativa. Por outro lado, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que culpa grave (omissão) configura ato contra a probidade da administração.
Se não foi fantasticamente omissa, ao permitir tais rombos nas contas públicas, a presidente Dilma foi conivente, hipótese ainda pior, de resto admitida nas delações premiadas de empresários e políticos de sua confiança.
Há a acrescentar que a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe que um governo tome empréstimos de bancos públicos (ato de improbidade). Em 2014 e 2015, no que ficou conhecido como "pedalada fiscal", o governo deixou de repassar bilhões a eles referentes a programas federais, fazendo com que pagassem com dinheiro próprio.
O crime de obstrução de Justiça, ao tentar proteger seu mentor, nomeando-o ministro -nomeação felizmente suspensa pelo STF-, é outro ato delituoso que fere princípios fundamentais da administração pública.
São eles: moralidade (nomear para proteger amigo), impessoalidade (nomeação no interesse pessoal, e não no interesse público), legalidade (desvio de finalidade) e eficiência (nomeação exclusivamente para blindá-lo, não em virtude dos atributos para o exercício do cargo).
O julgamento no Congresso precisa de embasamento jurídico, mas será político, levando-se em consideração, principalmente, a governabilidade do país.
E a presidente Dilma tornou o país ingovernável, sem condições de reverter a recessão, o desemprego, o crescimento da inflação para dois dígitos, os juros altos e a pestilência da corrupção que inundou a sua administração.
O impeachment será, pois, julgado politicamente neste domingo (17), à luz do imperativo da governabilidade do país e dos elementos jurídicos que o embasam.
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