- O Globo
Quando o ex-ministro Joaquim Levy assumiu a Fazenda, ele não podia mostrar o estado em que encontrou as contas públicas porque estava em um governo que sucedia a si mesmo. Agora, a nova equipe econômica tem a vantagem de poder dizer claramente o tamanho do desafio. Todos eles têm um histórico de posicionamento forte diante dos problemas fiscais brasileiros.
Em entrevista que me concedeu em janeiro deste ano, na GloboNews, o economista Ilan Goldfajn disse que o país estava preso em um nó, diante do tamanho do ajuste que precisava ser feito nas contas públicas em contexto de recessão e crise política. O que ele afirmou no início do ano continua atual.
— Primeiro temos que ter o diagnóstico. O núcleo do problema é fiscal, em um ambiente político difícil de aprovar qualquer medida. Então estamos em um nó. O crescimento só volta com confiança, e a confiança só volta quando a gente perceber que a dinâmica da dívida vai estabilizar e o fiscal está resolvido. Ninguém investe sem saber quem vai pagar a conta — disse.
Daqui a alguns meses, os problemas econômicos passarão a ser debitados no governo Temer. É por isso que agora é uma espécie de hora da verdade fiscal, e a equipe econômica corre para aprovar uma meta que seja realista, prevendo um rombo que pode passar de R$ 160 bilhões, segundo o presidente do Senado, Renan Calheiros. Na série estatística do déficit primário dos últimos anos, há várias falsificações. Alguns números do passado terão que ser revistos e toda a estatística fiscal do governo Dilma precisa de uma auditoria.
Um economista que fiscalizou isso com minúcias foi Mansueto Almeida. Em agosto em 2013 ele escreveu em seu blog sobre “os truques com o custo fiscal do PSI”, por causa de uma portaria assinada pelo então secretário da Fazenda Nelson Barbosa. “Um dos truques que me assusta é a postergação dos pagamentos de subsídios no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento do BNDES. Vou agora explicar essa maluquice e a tentativa de esconder o custo do programa. Resolvi fazer isso porque acho que a própria equipe econômica não sabe muito o que fez”, disse Mansueto, para em seguida mostrar em gráficos, equações e trechos de lei como o governo “pedalou” por dois anos esses pagamentos e ignorou a bola de neve de gastos que estava sendo contratada para o futuro.
Há os passivos contingentes, dívidas ou déficits não reconhecidos, sobre os quais é preciso “jogar luz”, como diz um integrante da equipe. Há bombas armadas prestes a explodir, atrasos com organismos internacionais e embaixadas. O novo ministro das Relações Exteriores, José Serra, pediu R$ 800 milhões para o pagamento de débitos, como informou a “Folha de S. Paulo”. Com a vantagem de não ter compromisso com o que era decidido antes, a nova equipe pode — e deve — falar claramente sobre o estado das contas públicas.
E isso no sentido amplo. A Caixa é definida pelo economista Alexandre Schwartsman como “caixa preta econômica federal”. Ninguém sabe qual é a situação de balanço do banco. Pôr tudo às claras é o caminho para fortalecer as instituições e informar o país do erro que é usar politicamente um banco público. A situação dos fundos de pensão das estatais é outra frente de desequilíbrios. A Fapes, do BNDES, teve déficit de R$ 2,5 bilhões em 2015 e em 2012 era superavitário em R$ 800 milhões. Há casos de polícia, como o que aconteceu com o fundo de pensão dos Correios, o Postalis, mas em todos das estatais há desequilíbrios atuariais.
A situação das estatais de energia não é inteiramente conhecida, e o caso da Eletrobras, que foi tirada da Bolsa de Nova York por não ter balanço auditado, pode ser a ponta do iceberg. A companhia garantiu que não haverá antecipação de dívidas, mas no setor dizem que será inevitável vender ativos para fazer caixa.
O orçamento deste ano tem receitas superestimadas com a repatriação de capitais e a recriação da CPMF, e a estratégia de elevar impostos terá vários efeitos indesejados. Um deles, pressionar a inflação e dificultar a queda dos juros. A projeção do economista Eduardo Velho, da INVX Partners, para o IPCA-15 de maio é de 0,77%, puxado pelo IPI dos cigarros. Com isso, o acumulado em 12 meses pode voltar a subir. Uma possível elevação da Cide teria efeito sobre os combustíveis.
A nomeação da nova equipe econômica é só um pequeno passo diante do enorme desafio que o país terá que enfrentar.
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