Por Raphael Di Cunto e Fabio Murakawa – Valor Econômico
BRASÍLIA - A mudança no clima político enterrou a possibilidade de aprovar emenda mais explícita para anistiar o caixa dois eleitoral e crimes conexos, como lavagem de dinheiro, peculato e corrupção, avaliam parlamentares, mas não encerrou as articulações para inocentar os acusados de receber doações não contabilizadas, o que ameaça mais de uma centena de políticos com a delação da Odebrecht. As tratativas se darão agora no Judiciário.
A Câmara tentará votar o projeto das "10 Medidas de Combate à Corrupção", que prevê a tipificação do caixa dois eleitoral como crime. Com o argumento de que o próprio Ministério Público Federal (MPF) "reconheceria" que receber doações eleitorais "por fora" não é crime, por isso a iniciativa de defender a criminalização no Congresso, políticos pretendem argumentar no Judiciário que não podem ser acusados de um crime que não existia na época.
A articulação no Legislativo, capitaneada, por quase todos os partidos políticos visava ainda mais: impedir a condenação penal, cível ou eleitoral de todos que receberam doações, contabilizadas ou não, dentro ou fora do período de campanha. Seriam anistiados também de lavagem de dinheiro e corrupção, acusações com as quais a força-tarefa da operação Lava-Jato tem qualificado as doações suspeitas de empresas para campanhas.
"Todos estamos sujeitos a acusações. Se eu for acusado vou me defender. Cada um que responda pelos seus atos. Não temos que dar essa carta de alforria", disse o líder do PPS, Rubens Bueno (PR), um dos que esteve a frente do movimento para tornar a votação da emenda nominal, evitando que os deputados aprovassem o texto sem o desgaste de registrarem seus votos.
A negativa de parte do PT em assinar a emenda da anistia junto com os demais partidos, o que afastou PSDB e DEM, o adiamento da votação em uma semana, o que aumentou a pressão popular sobre o Congresso, a demissão do ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, responsável pela articulação política, a decisão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de fazer votação nominal e a declaração do presidente Michel Temer no domingo, dizendo que vetará anistia, atuaram para demover o Legislativo.
Integrantes do Ministério Público e o relator do projeto, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), descartam a possibilidade de anistia pela criminalização do caixa dois. Dizem que essa prática já é crime, enquadrado no Código Eleitoral como falsidade ideológica (prestar informações falsas), mas com pena mais branda - até cinco anos de prisão- e que levou à punição de apenas um político em 50 anos.
Deputados e senadores, contudo, avaliam que esse assunto - e mesmo a emenda mais ostensiva pela anistia - acabariam decididos pelo Judiciário. A expectativa dos ameaçados pela delação é que isso demore e ocorra em uma conjuntura diferente, com menos pressão popular.
O projeto, porém, não terá tramitação tranquila sem essa polêmica. Líderes querem alterar o projeto aprovado na comissão e já tem até um texto substitutivo, com um prazo máximo de um ano para os inquéritos de políticos, a possibilidade de processar juízes e promotores por crime de responsabilidade e a exclusão de medidas como o informante que receberia parte do dinheiro recuperado ao denunciar corrupção.
Para o deputado Vicente Cândido (PT-SP), o texto dos líderes está mais próximo do consenso, mas a pressão pode inviabilizar a votação esta semana "Na semana passada tinha clima mais favorável e não andou. Agora a situação está mais confusa, não sei se a base do governo terá tranquilidade para discutir ponto a ponto o projeto."
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