Ninguém se iluda com a ampla maioria de deputados a favor da proposta de emenda à Constituição que cria um teto para os gastos federais. Ainda é precária, no setor público como um todo, a consciência acerca das limitações orçamentárias e da premência de melhorar o padrão de despesas do Estado.
Em poucos segmentos a desconexão com a realidade é mais patente do que nas altas esferas do Judiciário. Basta ver a manifestação do ministro Ricardo Lewandowski na abertura do 6º Encontro Nacional de Juízes Estaduais, na quinta (3).
Conhecido por suas posições corporativistas, o integrante do Supremo Tribunal Federal declarou que os magistrados não podem ter vergonha de pedir aumentos. "São trabalhadores como outros quaisquer e têm seus vencimentos corroídos pela inflação", disse.
A bem da verdade, os juízes não são exatamente trabalhadores como outros quaisquer. Gozam de estabilidade de emprego e aposentadorias especiais, além de inúmeras outras regalias inacessíveis à imensa maioria de brasileiros.
A inflação de fato corrói seus vencimentos. O problema maior, porém, são aqueles que nem salário têm —os 12 milhões de desempregados— por causa do colapso das finanças do Estado e da recessão.
O ministro disse ainda que juízes merecem remuneração condizente com o serviço prestado. Ora, nesse quesito a sociedade não lhes deve nada. O salário médio de um magistrado brasileiro é similar ao pago a seus pares em nações ricas.
Postos na balança, esses valores explicitam o desequilíbrio. Enquanto nossos juízes em fim de carreira percebem o equivalente a cerca de 16 vezes a renda média nacional, em outros países a proporção raramente chega a seis vezes.
O custo do Judiciário brasileiro, ademais, já é alto: 1,8% do PIB, somados Ministério Público e Defensorias. Na Europa, nenhum país investe mais de 1% do PIB.
Lewandowski, por fim, reforçou o apoio à PEC 63/2013, que não só prevê a criação de um adicional por tempo de serviço a juízes e membros do Ministério Público mas também pretende contar o exercício em outras carreiras jurídicas, retroativamente. Um escárnio.
O mau exemplo é seguido por outros Poderes, em todos os níveis de governo. A Câmara Municipal de São Paulo, por exemplo, cogita aumentar em 26,4% os salários de prefeito e vereadores.
Além de inconvenientes no momento de crise, esses reajustes desencadeiam um efeito cascata, já que muitas carreiras acompanham os vencimentos mais altos.
Não haverá solução para a penúria orçamentária, nem será possível ao Estado atuar com maior equidade, enquanto determinados grupos mantiverem acesso privilegiado a recursos públicos.
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