• Crise obriga a tomada de decisões inevitáveis e começa a nivelar o mundo protegido do funcionalismo com o Brasil real do salário sem reajuste e do desemprego
Não se pode dizer que o governo do Rio de Janeiro tenha sido imprevidente, mas, como reconheceu o próprio governador Luiz Fernando Pezão, de volta ao Palácio Guanabara depois de licença médica, ele não queria tomar as medidas de forte ajuste anunciadas ontem. Compreensível, porém há algum tempo elas haviam se tornado inevitáveis.
O impacto do ajuste fluminense sobre funcionários públicos, aposentados, pensionistas etc. deriva da crise fiscal deflagrada na União pelo lulopetismo, e cujas ondas do forte efeito foram se espalhando pela Federação desde 2013 e 2014 — mascarada por maquiagens naquele ano eleitoral —, abrangendo, como não poderia deixar de ser, estados e municípios.
No caso do Rio de Janeiro, a crise está sendo amplificada por características do estado, muito dependente de royalties do petróleo e da própria presença da Petrobras. Os royalties desabaram junto com os preços internacionais do hidrocarbureto, e deixaram o estado pressionado por gastos fixos que contratou com base em receitas que caíram. Como salários de servidores estáveis são blindados por lei, o governo entrou numa sinuca. Nisso, o Palácio Guanabara foi imprevidente, porque até mesmo a Arábia Saudita já tenta há algum tempo reduzir a dependência do petróleo.
A crise na Petrobras, por sua vez, derrubou ainda mais a economia fluminense, levando junto a arrecadação. O PIB do estado cai à razão de 7% ao ano desde 2014, revelou Pezão. Como a coleta de impostos, de R$ 46,6 bilhões em 2014, deverá ser de R$ 43,3 bilhões este ano, sem considerar os royalties minguantes, chegou-se à situação de uma empresa em “recuperação judicial" ou mesmo “falência”, palavras do próprio vice-governador, Francisco Dornelles.
Em um aspecto, a crise fiscal fluminense repete a da União: gastos previdenciários estão no centro do problema. Daí a proposta, a ser avaliada pelos deputados, de elevação da alíquota de contribuição do funcionalismo de 11% para 14% e a do governo, de 22% para 28%. Pelo ineditismo, tem-se ideia da gravidade da situação. É o mesmo sentido da criação de uma alíquota adicional, durante 16 meses, que eleva a contribuição final para 30%, destinada a servidores ativos, inativos e pensionistas ajudarem a reequilibrar a previdência.
A crise também desvenda privilégios de corporações, pois é parte do pacote que todos os poderes e órgãos autônomos — Alerj, TCE, Ministério e Defensoria públicos — arquem com a contribuição previdenciária de respectivos servidores. Até hoje, isso cabe ao Tesouro fluminense, um despropósito. Esses poderes e órgãos também se responsabilizarão pelos seus déficits previdenciários a partir de 2018. O esforço fiscal fica mais bem distribuído dentro do Estado.
Além da inexorável redução de secretarias — de 20 para 12 —e o fechamento de sete autarquias e fundações, o que precisa de fato resultar em cortes de gastos de custeio, há o adiamento por três anos de reajustes salariais já negociados. Somem-se ainda cortes em subsídios e programas sociais, e o aumento de impostos — o que prejudica ainda mais a economia do estado, um mau passo.
A reação de sindicatos é grande. Mas é melhor que tudo se estabilize a partir do pacote, para o governo não ser obrigado a demitir estáveis, com base na Lei de Responsabilidade e na própria Constituição. A crise começa a nivelar o mundo protegido do funcionalismo público com o Brasil real dos salários sem reajustes e do desemprego.
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