- O Estado de S. Paulo
• Deixadas às próprias forças, as amarras que travam economia demorarão mais a se desfazer
Praticamente terminada a batalha da PEC do Teto dos Gastos, começa a guerra da reforma da Previdência. Apoiado numa campanha publicitária em que o mote é “Reformar hoje para garantir o amanhã”, o governo entrega ao Congresso Nacional um projeto de restrições à concessão de benefícios previdenciários, em relação aos critérios em vigor, com o objetivo de adequar benefícios e contribuições.
Com repercussões contracionistas menos difusas do que as presentes na PEC do Teto dos Gastos, a reforma da Previdência, presumivelmente, reunirá resistências mais intensas do que as observadas na longa tramitação da PEC. Essa perspectiva será tanto mais verdadeira quanto mais se prolongar a frustração com o desempenho da economia no curto prazo.
Ainda que possa produzir impactos positivos nas expectativas de recuperação da economia, quem sabe revertendo a retração dos índices de confiança ocorrida com o aprofundamento da recessão no terceiro trimestre do ano, a aprovação da PEC, em mais alguns dias, e a apresentação da reforma da Previdência não interferirão em nada nas condições econômicas objetivas, que continuam adversas. Essas condições assim permanecerão por longo período, se o desmanche das amarras que hoje travam as decisões de investir e consumir for deixado às suas próprias forças.
Se são necessárias para o reequilíbrio estrutural da economia, nem a PEC, nem a reforma da Previdência desempenhariam função efetiva na retomada mais imediata do crescimento. Com a PEC avançando no Congresso e o anúncio do início da reforma da Previdência na plataforma de lançamento, as projeções para a evolução do PIB, em 2017, têm recuado com alta velocidade. Se estavam em 1,36% de alta, em outubro, no Boletim Focus de ontem já recuavam para 0,8%, num movimento para baixo que parece ainda não ter se esgotado.
A perspectiva de mais um ano de estagnação deixou claro, nos últimos dias, que evitar o longo curto prazo de retração econômica delineado pelos indicadores econômicos passou a desempenhar papel crucial no ambiente político. A impaciência com a aparente paralisia do governo Temer ante as questões que mantêm a economia travada saiu da sombra dos bastidores e chegou à luz do dia. A senha, não importa se voluntária ou involuntária, foi dada por uma entrevista do ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, candidato tucano permanente ao Ministério da Fazenda, à colega Claudia Safatle, doValor. Para Arminio, além do esforço com as reformas fiscais, o governo também poderia estar trabalhando em “uma agenda de reformas microeconômicas”.
Sem decidir se cede às manobras noturnas de sua base no Congresso para aprovar as reformas ou sinaliza com mais clareza não compactuar com tais manobras sob o risco de não reunir quórum para fazer avançar o ajuste, Temer se equilibra numa linha tênue. A fragilidade política de seu governo, com ministros e líderes ameaçados pela Lava Jato, e a falta de ação na direção de destravar a economia, deu passagem a pressões explícitas sobre o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Ele é acusado de ter descuidado na busca de saídas mais imediatas para os canais entupidos da economia.
Embora possa haver exagero na acusação, não deixa de ser verdade que Meirelles parece ter dormido nos louros da crença nos supostos poderes restauradores dos índices de confiança, depois de revigorados por indicações de firmeza na obtenção futura do ajuste fiscal. O ciclo virtuoso confiança-investimento-emprego-crescimento, defendido por Meirelles e sua equipe, tem origem numa controversa formulação teórica pós-crise global de 2008, resumida na hipótese da “contração expansionista”, segundo a qual a austeridade fiscal pode resultar em expansão econômica. Mas o fato é que a teoria nunca se realizou completamente nas economias maduras que abraçaram o experimento e também não está respondendo no Brasil.
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