quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Aperfeiçoamentos na PEC do teto do gasto - Ribamar Oliveira

• Judiciário poderá estourar o teto já no primeiro ano

- Valor Econômico

Há uma intensa negociação no Congresso Nacional em torno da proposta de emenda constitucional (PEC) 241, que institui um teto para o gasto da União. O próprio governo já está convencido de que é preciso fazer "alguns aperfeiçoamentos" no texto para torná-lo exequível. O primeiro problema que surgiu está relacionado ao Judiciário, que teria que entrar em um processo de ajuste rigoroso para não estourar o seu limite, já no primeiro ano de vigência do novo regime fiscal.

A PEC prevê a fixação, para cada exercício, de um limite individual da despesa por Poder e para os órgãos autônomos. A despesa de cada um em 2017 será a mesma verificada neste ano, corrigida pelo IPCA de 2016. Um gasto que vai aumentar muito no próximo ano é com pessoal, pois a maior parte dos servidores recebeu reajuste salarial.


No caso do Judiciário, o percentual do reajuste chegou a 41,47%, que será dado de forma escalonada, em oito parcelas, de junho deste ano até julho de 2019. No cálculo está computado o aumento da gratificação judiciária, hoje correspondente a 90% do vencimento básico, que chegará gradualmente a 140%, em janeiro de 2019.

Um projeto de lei, já aprovado pela Câmara, eleva também o valor do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que é o teto salarial do serviço público. O projeto está sendo analisado pelo Senado, mas é provável que seja aprovado depois da decisão sobre o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. O reajuste do teto aumenta os salários de toda a magistratura, de imediato.

Em recente audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o ministro interino do Planejamento, Dyogo de Oliveira, estimou que o impacto dos reajustes do Judiciário será de R$ 1,5 bilhão em 2016 e de R$ 4,1 bilhões em 2017. A despesa com pessoal do Judiciário aumentará no próximo ano, portanto, muito acima da inflação de 2016, que está sendo estimada em 7,3% pelo mercado, de acordo com o boletim Focus, do BC.

Com um aumento muito forte da despesa de pessoal, o Judiciário seria obrigado a conter outros gastos para se manter no limite estabelecido pelo novo regime fiscal. O problema é que o investimento daquele Poder, que sempre é a variável de ajuste fiscal, é muito pequeno. O grosso da despesa é com pessoal. O Judiciário teria, portanto, pouca margem para cortar outros gastos e se manter dentro do limite estabelecido.

Uma das alternativas que está sendo discutida na Comissão Especial que analisa a PEC do teto do gasto é permitir, em um primeiro momento, que uma parte do limite do Executivo seja usada para acomodar o aumento da despesa com pessoal do Judiciário, de maneira que o teto da despesa total seja mantido.

Outra ideia é abrir a possibilidade de compensação entre os diversos órgãos do mesmo Poder. Um exemplo citado é o caso do Tribunal de Contas da União (TCU), cujos servidores receberam um reajuste salarial superior aos dos servidores da Câmara dos Deputados e do Senado. O aumento da despesa com pessoal do tribunal seria absorvido pelo Legislativo. Outra proposta prevê que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ano especifique regras para esse tipo de compensação de despesa, de tal forma que o teto definido para cada Poder seja preservado.

Outra mudança em discussão está relacionada com os recursos para a saúde. O entendimento que predomina no Congresso é que o texto da PEC apresentado pelo governo elegeu "o mínimo do mínimo" para a fixação do teto das despesas nesta área. Até 2015, as dotações para a saúde eram equivalentes ao valor empenhado no ano anterior, corrigido pela variação do Produto Interno Bruto (PIB). Essa regra foi alterada pela emenda constitucional 86 e o mínimo passou a corresponder a um percentual da receita corrente líquida (RCL) da União.

Pela emenda, as dotações para a área neste ano deverão ser equivalentes a 13,2% da RCL. O problema é que, por causa da recessão, a receita líquida da União caiu muito e os 13,2% correspondem a cerca de R$ 84,5 bilhões, de acordo com estimativa da Consultoria de Orçamento da Câmara. Esse valor é menor do que o aplicado em 2015, que foi de R$ 100,1 bilhões, e inferior também aos R$ 108,6 bilhões autorizados para empenho neste ano.

A PEC do gasto prevê que o valor de R$ 84,5 bilhões, que é o mínimo a ser aplicado em 2016 pela emenda constitucional 86, será corrigido pela inflação e, assim, se transforme no mínimo a ser aplicado em 2017. Isto significa que as dotações para a saúde no próximo ano serão menores do que em 2015.

O governo tem afirmado e reafirmado que aplicará mais do que o mínimo definido pela PEC do teto e que não haverá redução de recursos para a saúde no próximo ano e nem nos anos seguintes. Mas as garantias dadas não comoveram os parlamentares da chamada bancada da saúde. Há uma articulação sendo feita para que o ponto de partida para a definição do mínimo para a área seja o valor aplicado em 2015, que seria corrigido pela inflação daquele ano e de 2016. O valor obtido seria o mínimo para 2017.

Outro ponto em discussão é o critério de despesa paga adotado pela PEC para a definição do limite. Uma corrente dentro do Congresso questiona o uso desse critério, com o argumento de que, para cumprir o teto, um determinado Poder ou órgão autônomo poderá simplesmente postergar o pagamento da despesa, ou seja, "pedalar o pagamento", prática que ficou famosa durante o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. Por isso mesmo, vários parlamentares estão defendendo o uso do critério de despesa empenhada para o cálculo do limite. A tese é abraçada também pela bancada da saúde, que entende que muitas despesas da área, embora empenhadas, não chegam a ser pagas no exercício.

Outra questão está sendo objeto de intenso debate. As emendas individuais que os parlamentares fazem ao Orçamento, todo o ano, ficaram fora do teto do gasto. Com o chamado "orçamento impositivo", os parlamentares reservaram 1,2% da receita líquida da União para suas emendas, que têm execução obrigatória. O que se discute, no momento, é acabar com essa vinculação à receita e estabelecer que o montante destinado às emendas seja corrigido também pela inflação.

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