• Desembarcar em Brasília para aproveitar as turbulências na área de segurança, a fim de tentar a liberação de verbas, é agir de forma oportunista
Acena do governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria, afirmando, terça-feira, em Brasília, que a situação estava sob controle na penitenciária de Alcaçuz, em seu estado, enquanto a GloboNews mostrava presos amotinados sobre telhados do presídio, pode ser explicada pela compreensível preocupação das autoridades em acalmar a população.
Em Alcaçuz, de segunda a terça, haviam sido chacinados mais de duas dezenas de presos, em mais uma batalha do choque entre grupos, na guerra movida pelo PCC, paulista, e o fluminense Comando Vermelho, em luta pelo controle do tráfico de drogas, com explosões de barbárie nas cadeias.
É uma grave crise de segurança, com 130 mortes até ontem, em cadeias de vários estados (Amazonas, Rondônia, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Rio Grande do Sul), apenas a ponta de um robusto iceberg.
Autoridades podem tentar minimizar o problema em pronunciamentos e entrevistas, mas é inaceitável que ajam como se de fato não tivessem consciência da gravidade do momento.
A turbulência na área de segurança pública coincide com a mais grave crise fiscal de que se tem notícia no país, e não se desconhece que atrasos no pagamento de soldos e salários de policiais e agentes penitenciários podem ampliar a gravidade do problema.
Mas nada justifica que governadores e secretários de Segurança viajem a Brasília, chamados para discutir o Plano Nacional de Segurança com o ministro da Justiça, Alexandre de Moares, e o presidente Michel Temer, e aproveitem para dar prioridade a questões financeiras em torno da execução do programa.
Alguns chegam até a recolocar sobre a mesa a velha proposta da vinculação de verbas orçamentárias para o setor. Ora, a reivindicação é inoportuna, porque, do ponto de vista fiscal, o que o país necessita é o oposto: reduzir ao mínimo as vinculações, causa do engessamento orçamentário, um dos fatores que levaram as despesas públicas a aumentarem durante muito tempo acima da arrecadação de tributos, da inflação e do próprio crescimento da economia. Daí a enorme crise fiscal em curso.
É de um oportunismo gritante usar este momento para capturar recursos federais. Sem dúvida, as fontes de custeio do plano são tema essencial, e despesas não previstas têm de ser realizadas. Já têm sido liberadas verbas para reequipar e construir presídios, por exemplo.
Mas querer, ainda na travessia do ajuste, que o governo abra as portas do Tesouro antes de se detalhar o programa compartilhado de segurança, com a definição de papéis, funções e outros aspectos relevantes de um plano de grandes proporções, denuncia interesses rasteiros que se utilizam desta tempestade na segurança pública para escapar do necessário corte de gastos e reformas em outras áreas.
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