- O Estado de S. Paulo
Tinha tudo para Michel Temer fechar o dia de hoje com um brinde. Emplacar os presidentes da Câmara e do Senado é condição indispensável para não repetir a trajetória de sua antecessora. Graças a seu líder no STF e à negociação com Cármen Lúcia, ele conseguiu que a Lava Jato fosse sorteada entre só cinco ministros, três dos quais atendem às preferências do governo. De quebra, a oposição rachou ao disputar o comando do Congresso.
Por tabela, a aliança para reeleição de Rodrigo Maia (DEM) como presidente da Câmara formalizou um blocão de 12 partidos governistas. Em tese, são mais de 300 deputados para Temer aprovar quase o que quiser na Câmara. No Senado, Eunício Oliveira (PMDB) ganhou com 75% dos votos.
A tais êxitos no Legislativo e no Judiciário somem-se algumas boas notícias na economia para contrabalançar as más: a inflação caiu, o Banco Central cortou os juros e a confiança do consumidor medida pelo Ibope para a CNI voltou a crescer. Este último indicador guarda a mais forte correlação estatística com a popularidade de todo presidente brasileiro. Tin-tin? Não?
É cedo, muito cedo para comemorar. A batalha entre policiais militares e manifestantes no centro do Rio pode e deve ser debitada ao governo estadual. Mas também deve preocupar Temer. Seu partido, o PMDB, manda e desmanda no Estado há mais de uma década. O ex-governador peemedebista está preso. Protestos, sabe-se como começam, nunca como terminam. Para Temer entrar no coro dos servidores enfurecidos é fácil. Sair, nem tanto.
Como em 2013, gente protestando continuamente nas ruas do Rio é sempre uma chuva de fagulhas sobre um paiol de pólvora. Ainda mais quando o desemprego bate recordes e os salários estão atrasados. É mais um fator de incerteza a se juntar à Lava Jato.
A manutenção do sigilo das 77 delações da Odebrecht é outra fonte potencial de faíscas. Ainda que elas só possam sair da Procuradoria-Geral da República (que excluiu a Polícia Federal dos depoimentos), essa é uma possibilidade que não pode ser descartada – especialmente se o andamento do processo da Lava Jato no Supremo começar a contrariar os investigadores.
Na avaliação do governo, um vazamento por dia é muito pior do que uma enxurrada de uma vez só. Pelo raciocínio da Turma do Pudim, se o sigilo de todos os depoimentos dos empreiteiros que bancaram meia Brasília fosse levantado logo, seria como arrancar um dente (ou vários) amarrando-o à porta com um barbante e puxá-lo de uma vez. A alternativa é ficar ouvindo o torturante barulho da broca na antessala do consultório do dentista.
A expectativa do vazamento é quase tão ruim quanto a publicação de todos os depoimentos dos delatores ao mesmo tempo. São tantos que não haveria espaço nem tempo para contar todas as histórias escabrosas. Muitos virariam notas. Outros seriam esquecidos. Mas, com o sigilo, dezenas de deputados, senadores, ministros e juízes ficam na expectativa de serem os próximos a terem os nomes vazados no dia seguinte – e com destaque de “furo”.
É a novelização – como ocorreu com o mensalão sob Lula e com a Lava Jato sob Dilma – que aumenta o interesse pelo conteúdo das delações, provoca ainda mais incerteza sobre o cenário político e, por contaminação, sobre a velocidade de saída da recessão. A especulação sobre as cenas dos próximos capítulos tem potencial paralisante para a votação das reformas, como a da Previdência.
Assim, as vitórias de Temer nesta quarta-feira podem, rapidamente, virar derrotas na quinta, na semana seguinte ou depois do carnaval. Bem como nunca acontecerem. Ninguém sabe. Esse é o problema. As previsões nunca foram tão fúteis.
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