Temos a possibilidade de entrar em novo ciclo de crescimento sustentado na década que vai se iniciar
Fui formado, ao longo de mais de quatro décadas, analista do futuro. Neste período sempre optei, quando tinha um razoável grau de certezas nas minhas hipóteses de trabalho, por correr riscos nas minhas previsões. Seguia um conselho sábio de Keynes para quem um economista deve estar sempre à frente dos fatos.
Mudei muito pouco esta minha forma de pensar, mesmo agora em que chego à maturidade profissional. Isto me coloca muitas vezes em uma posição isolada e que exige realmente muita alta confiança para seguir adiante. Por exemplo, em abril de 2015, quando o governo Dilma começou a afundar participei de um programa na Globo News levando uma mensagem clara de que não chegaríamos ao caos na economia. Citava o caráter ciclotímico da sociedade brasileira em momentos de crise como a que vivíamos, mas expressei minha convicção de que nunca nos jogaríamos no abismo.
A partir deste momento passei a ser catalogado de otimista assumido por vários colegas de profissão. Um deles chegou a me acusar de ser ingênuo e descolado da realidade dos fatos. Não havíamos passado ainda pelo impedimento de Dilma Rousseff e o governo Temer era ainda um ponto fora da curva. Os fatos que se seguiram até os dias de hoje mostraram que estava certo na minha avaliação sobre o futuro.
Posteriormente, com a montagem do governo Temer passei a falar - e a escrever - que teríamos uma recuperação cíclica à nossa frente. A qualidade da equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda era a âncora principal desta minha afirmação. Sofri como um cão, pois a economia afundava cada vez mais e meu otimismo com o futuro parecia um delírio ingênuo. Um profissional que trabalhou comigo na Quest Investimentos chegou a comentar, com amigos, que eu precisava de uma reciclagem profissional. Além de ingênuo tinha ficado ultrapassado. Vivíamos tempos em que as expectativas com o futuro chegaram ao ponto mais baixo desta década, com o índice Bovespa a 38 mil pontos, o dólar a mais de R$ 4 e o índice CDS a mais de 500 pontos.
Mais recentemente esta minha posição em relação ao Brasil passou a ser dominante nos mercados financeiros e na mídia especializada. Também, depois de uma alta de mais de 70% no índice Bovespa, uma valorização de mais de 30% de nossa moeda e a volta de nosso CDS para o nível de outras economias emergentes, não se podia esperar outra coisa.
Mas, fiel a meu papel de especulador do futuro, quero agora deixar o curto prazo de lado e chamar a atenção do leitor do Valor para um outro fenômeno que pode ocorrer nos últimos anos da década que vivemos. Uma janela de oportunidades se abre para nós brasileiros e poderemos almejar bem mais do que simplesmente uma recuperação cíclica de nossa economia. Creio que teremos a possibilidade de entrar em um novo ciclo de crescimento sustentado na nova década que vai se iniciar.
Para tal teremos, entretanto, que trilhar um caminho bem mais árduo do que o percorrido pelo governo Temer até agora. Os desafios daqui para frente serão estruturais e, para superá-los, uma agenda de reformas microeconômicas e políticas terá que ser perseguida. A boa notícia é que já existem, guardados em várias gavetas do poder em Brasília, os rascunhos da grande maioria delas. Este acervo foi acumulado ao longo dos anos pelo debate sempre muito vigoroso, tanto na academia como na mídia, que ocorre no Brasil. Faz parte dele também o trabalho de vários órgãos do governo no período Fernando Henrique e, em alguns poucos momentos de lucidez, no primeiro mandato do governo Lula. Necessitamos apenas de um comando político para colocá-las em prática.
O governo Temer já vem perseguindo uma série destas reformas e, com a recuperação mais à frente da economia, poderá ir ainda mais longe. Os exemplos desta agenda estão disponíveis a todos que seguem a cobertura da imprensa. A mais recente foi a do ensino médio sancionada pelo presidente na última semana. As novas normas refletem o trabalho do falecido ministro da Educação de Fernando Henrique, Paulo Renato Souza, e que ficaram esquecidas por mais de quinze anos.
Enfrentaremos este ano o grande desafio das mudanças nas regras da Previdência pública e as mudanças de nossa vetusta legislação trabalhista. Mas para o Brasil dar um salto quântico como economia de mercado competitiva será preciso muito mais. Por isto a importância da decisão do ministro Meirelles de criar no Ministério da Fazenda uma secretaria especial para coordenar os esforços para a implementação de agenda de reformas microeconômicas.
Vencemos em 2015 a síndrome da queda no precipício que foi defendida por muitos analistas e, neste início de 2017, estamos deixando para trás o pânico de que a recessão não tem fundo do poço. Quero trazer hoje ao leitor do Valor minha previsão de que a partir de 2018, com a eleição presidencial, o Brasil tem condições de entrar em um novo período de crescimento sustentado. Talvez ainda hoje esta minha posição seja mais fruto de uma intuição de analista do que uma análise de fatos concretos. Os desafios no campo da política são ainda muito fortes e voláteis. Mas temos que isolá-los para reduzir o ruído que eles criam sobre a economia. E Keynes nos ensina que esta deve ser a forma de tratar do futuro quando o acaso tem uma força muito grande.
*Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.
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