- O Estado de S. Paulo
Quem ganhou com a greve geral? Lula da Silva e João Doria. Um é o candidato dos organizadores da paralisação; o outro superou a concorrência nas mídias tradicional e social e se afirmou como principal liderança antigreve. Quem perdeu? Temer e seus aliados pró-reformas - porque a greve acabou sendo aquilo que eles não queriam que fosse: uma demonstração contra o fim de direitos trabalhistas e mudanças das regras para aposentadoria.
Enquanto o governo e seus aliados pintavam a greve como um protesto contra o fim do imposto sindical, boa parte da sociedade fazia um debate muito mais amplo sobre seu significado. Como há tempos não ocorria, a igreja católica fomentou uma discussão socioeconômica. A conversa extrapolou as bolhas do Facebook e embrenhou-se por homilias e salas de aula. Alunos, pais e professores debateram as causas da greve.
A discussão sobre regras trabalhistas e idade para aposentadoria se estendeu muito além dos microfones do Congresso. O efeito pode ser efêmero, mas talvez os parlamentares tenham que ouvir seus eleitores antes de votarem as reformas. Se isso implicar atraso na tramitação, será outra derrota do governo.
A pressa faz parte da estratégia de Temer. Com apenas 9% de ótimo e bom (no Ibope e agora também no Datafolha), a única esperança de o presidente sair do patamar de impopularidade que empurrou Dilma ao cadafalso político é a votação sumária das reformas no Congresso - em tempo de melhorar o humor dos mercados, incentivar investimentos e a retomada econômica.
Até lá, o desemprego bate recordes. São 14 milhões de desocupados, três milhões a mais do que quando Temer assumiu a Presidência. Perderam-se nesse período 1,2 milhão de vagas com carteira assinada, o que significa menos contribuintes para a combalida Previdência. Ainda no campo dos recordes, as contas do governo central tiveram o pior março desde 1997. No meio disso tudo, os ministros do Supremo decidiram que, na prática, seu teto salarial não é mais de R$ 33 mil, mas o dobro.
Só quem mora no Plano Piloto pode achar que nada disso tem consequências políticas. Fazia anos que os promotores da greve de sexta haviam perdido as ruas - para os jovens de junho de 2013 com sua pauta difusa e, depois, para os manifestantes pró-impeachment. Não reconquistaram o protagonismo que tinham antes de o PT chegar ao poder, mas, com a ajuda da recessão, os sindicalistas recuperaram parte da capacidade de mobilização.
Não é coincidência que isso tenha ocorrido ao mesmo tempo em que Lula cresce nas pesquisas eleitorais. Grevistas e ex-presidente se alimentam da crise. Quanto piores os índices oficiais, mais cai a intenção de voto nos caciques tucanos. Para bem e para o mal, o eleitor associa o atual governo federal ao PSDB. Assim, Lula cresce por osmose: absorve o que os adversários perdem.
Por ora, o único tucano com potencial para estacar o processo é Doria. Projetando a imagem de quem chegou ontem e não tem nada a ver com Lava Jato nem com Temer, ele já supera os outros tucanos nas simulações de primeiro e segundo turno - no Datafolha. Disputa com Jair Bolsonaro (PSC) o papel de anti-Lula.
O cenário muda se Lula não puder ser candidato por causa de uma eventual prisão pela Lava Jato. Essa hipótese, porém, ficou um pouquinho menos provável, graças a uma decisão do Supremo. Sob a liderança de Gilmar Mendes, a Segunda Turma do tribunal soltou Eike Batista e dois outros detidos pela Polícia Federal: José Carlos Bumlai, o amigo de Lula, e João Carlos Genu, o ex-tesoureiro do PP. Foi uma poda no juiz Moro. Pode-se não acreditar em bruxarias de bastidores, pero que las hay, las hay.
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