Mudanças como fim do imposto sindical e negociações diretas nas empresas devem obrigar sindicalismo a buscar novos caminhos
Cleide Silva, Márcia De Chiara e Ricardo Galhardo | O Estado de S. Paulo
O movimento sindical comemora hoje o 1.º de Maio, data ícone para as organizações de trabalhadores, tendo de rever seu papel na sociedade brasileira. Após mais de uma década de atuação praticamente sem grandes mobilizações, até porque havia um alinhamento com o governo do PT, as centrais sindicais agora estão acuadas.
A reforma trabalhista pode minar o poder de atuação das entidades sindicais ao acabar com o imposto sindical e estabelecer negociações por meio de representantes internos nas empresas com mais de 200 funcionários. A reforma da Previdência é outra dor de cabeça. Além disso, há número recorde de 14,2 milhões de desempregados no País.
“O sindicalismo vai passar por um momento extremamente delicado porque vai estar fragilizado em todas as suas forças”, diz o procurador geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury. Para ele, as duas maiores ameaças às entidades são a possibilidade de extinção do imposto sindical e a criação de comissões de negociação sem a participação dos sindicatos.
Para Fleury, antes da reforma trabalhista, o governo deveria fazer uma reforma na estrutura sindical. “Vai haver uma diluição do poder de negociação. Uma mudança possível seria acabar com a unicidade sindical. Se uma entidade não tem concorrência, vai correr atrás do trabalhador para quê?”
Na opinião do diretor técnico do Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, desde os anos 2000 o movimento sindical não tinha esse tipo de ataque. Nos últimos anos houve redução de desemprego, ganho de renda e o Congresso não se debruçou em temas que afetavam diretamente a classe trabalhadora.
Com as reformas em curso, Lúcio acredita que o movimento sindical terá de se recolocar e sair da situação de certo conforto, pois não estava sendo atacado. “O que se tem hoje é o movimento sindical se reposicionando para uma situação de desemprego crescente e ataque do Estado, por meio do governo, a um padrão civilizatório de relações sociais. É uma mudança.”
Lobby. Com o fim do imposto obrigatório, José Marcio Camargo, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio, avalia que sindicatos e centrais terão de se voltar para suas bases e prestarem melhor atendimento aos trabalhadores para, assim, angariarem mais filiados que possam ajudar a manter suas estruturas.
“Eles terão de se voltar mais para as atividades sindicais e deixarem de se ocupar em fazer lobby junto aos deputados para aprovar ou não determinadas leis”, afirma Camargo. “Vai precisar ter mais o componente de luta sindical de verdade do que interesses políticos.” Para ele, entidades fortes vão prevalecer, mas, com o fim do imposto sindical, “os sindicatos pelegos e de fachada vão acabar”.
Na avaliação de analistas, durante os governos Lula e boa parte do governo Dilma, as centrais, em especial a CUT, ficaram à mercê das administrações, inclusive com sindicalistas ocupando cargos estratégicos. “O papel a partir de agora volta a ser mais para o lado econômico, de questões como condições de trabalho e salários, por exemplo”, diz Tiago Barreira, pesquisador do Ibre/FGV.
O professor da Escola de Economia da FGV-SP, André Portela, avalia que “dar mais peso às negociações pode fortalecer os sindicatos, mas, sem arrecadar imposto sindical, num primeiro momento todos vão enfraquecer, até mesmo os grandes.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário