- O Globo
Uma máxima que sempre foi levada muito a sério pelos profissionais do PMDB é a que diz que em política existem apenas dois fatos que importam: o fato novo e o fato consumado.
A prisão do ex-ministro Geddel Vieira Lima é um desses fatos novos que afetam diretamente a estabilidade do governo Temer, que ele já havia abalado ao ter que se demitir da Secretaria de Governo, devido a uma disputa com o então também ministro da Cultura Marcelo Calero, em torno de um prédio em Salvador, no qual tinha um apartamento, que infringia regras do patrimônio da União. Geddel insistia em liberar.
Uma atuação vulgar que revelava o caráter patrimonialista que rege o grupo do PMDB que chegou ao poder com Temer. Esse fato novo se junta a outros que estão na fila para serem revelados, como a delação do doleiro Lúcio Funaro — responsável pela prisão de Geddel —, a provável delação do expresidente da Câmara Eduardo Cunha e a possível delação do ex-assessor Rodrigo Rocha Loures.
Só a preocupação de Geddel com a delação de Funaro, que o fez deixar rastros de obstrução da Justiça, já demonstra a inquietação do grupo com os fatos que o doleiro do PMDB pode revelar. Tem a ver, também, com a conversa entre o empresário Joesley Batista e o próprio presidente Michel Temer, sobre as providências que estavam sendo tomadas para manter as bocas fechadas de Cunha e Funaro.
Bem que Temer disse a Joesley que tinha que manter a boa relação com Cunha, mas não adiantou. Depois que a trama foi revelada, cada um resolveu cuidar de si, e dificilmente os próximos acontecimentos darão margem a uma situação confortável para o presidente Temer, que corre o risco de se tornar um fardo pesado demais para ser carregado por sua própria base partidária.
A essa altura, uma solução menos traumática como a substituição de Temer pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, por seis meses pode dar tempo ao tempo, e à base aliada, o fôlego para se reagrupar.
Há negociações nos bastidores nesse sentido, inclusive para tentar recuperar a viabilidade da reforma da Previdência, que a esta altura está praticamente descartada. Mesmo a reforma trabalhista, menos difícil por exigir uma maioria simples — e não os 3/5 de uma reforma constitucional — pode perder seu ponto mais emblemático, o fim da obrigatoriedade do imposto sindical.
O escalonamento que as centrais sindicais estão exigindo para que a medida entre em vigor pode se transformar em medida protelatória que inviabiliza o objetivo final. O governo Temer, antes mesmo de a prisão de Geddel Vieira Lima se transformar nesse fato novo que pode influir decisivamente na votação da Câmara sobre o processo contra o presidente da República, estava com dificuldade de mobilizar a base com a rapidez que deseja impor ao rito.
Pelo segundo dia consecutivo não houve sessão na Câmara, e, portanto, não começou a contar o tempo para a defesa do presidente nas dez sessões ordinárias da Comissão de Constituição e Justiça previstas no regimento interno. O Palácio do Planalto pretende encurtar esse prazo para ganhar tempo, a fim de resolver a questão antes do recesso, que começa no dia 17.
Mas nem o advogado do presidente, Antônio Cláudio Mariz, está certo de que não precisará usar todo o tempo que lhe concede a lei para fazer a defesa, e nem os deputados estão mobilizados para apressar o rito, como quer o Planalto.
A partir da manifestação da defesa, ou do fim do prazo, a CCJ tem mais cinco sessões para aceitar ou rejeitar o pedido de abertura do inquérito. Após a votação, o parecer é lido em plenário, publicado e incluído na Ordem do Dia da sessão seguinte ao recebimento pela Mesa Diretora.
A votação em plenário é nominal. Para aceitar a denúncia são necessários 342 votos. Para rejeitar, 172 (1/3 da Casa). Isto quer dizer que o presidente não precisa ter os votos para manter-se. Basta que os que o querem fora do Planalto não cheguem a 342 deputados.
A pressa de Temer tem uma explicação: além de tirar essa espada sobre sua cabeça, se a votação ficar para o segundo semestre, ele corre o risco de ver fatos novos, como esse de ontem, se repetirem, enfraquecendo ainda mais seu apoio.
Os deputados, em contato com suas bases nos estados, serão pressionados no recesso contra Temer, que tem uma impopularidade que contagia seus apoiadores.
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