Uma luz amarela acendeu nas contas externas no mês passado, quando o mercado de câmbio começou a refletir a intranquilidade dos investidores estrangeiros frente à turbulência desencadeada nos mercados financeiros pelas acusações da delação dos donos da JBS ao presidente Michel Temer. Dados parciais registrados até o dia 23 mostravam um fluxo cambial negativo de US$ 5,3 bilhões. Se as operações ficaram no zero a zero nos dias seguintes, esse número já era suficiente para o mês fechar com o pior resultado do ano. Novas informações a respeito estarão disponíveis amanhã.
As saídas de dólar concentraram-se nas operações de câmbio da conta financeira, que ficou negativa em US$ 8,6 bilhões nos 23 primeiros dias de junho, incluindo empréstimos, investimentos, serviços e rendas. Desde o início de maio, o saldo negativo da conta financeira totalizou US$ 13,8 bilhões, concentrando em menos de dois meses quase 60% das saídas de US$ 23,7 bilhões acumuladas no ano. Como as exportações têm registrado desempenho bastante positivo, as operações de comércio exterior compensam essas saídas. Por isso, o saldo total do mercado está positivo em US$ 6,5 bilhões no ano. No entanto, o comportamento recente do investidor estrangeiro levou o Banco Central (BC) a revisar as expectativas para as aplicações externas em renda fixa de US$ 10 bilhões para zero; e as em ações, de saída de US$ 7 bilhões para zero.
Os resultados registrados até agora nas contas externas têm sido um dos bons indicadores da economia brasileira. Na semana passada, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, mencionou a maior capacidade de a economia brasileira absorver "eventual revés" devido à situação mais robusta de seu balanço de pagamentos, além do "progresso no processo desinflacionário e na ancoragem das expectativas". Ressaltou que o déficit do balanço de transações correntes, de 1% do PIB nos 12 meses encerrados em maio, é financiado pelos investimentos diretos, que somaram 4,3% do PIB no mesmo período, ou seja: superior a quatro vezes o déficit. Na mesma frente, citou o câmbio flutuante, a redução do estoque de swaps cambiais de US$ 108 bilhões no início de 2016 para os atuais US$ 28 bilhões, e a disponibilidade de quase US$ 378 bilhões em reservas internacionais.
De fato, o forte ajuste das contas externas nos últimos dois anos, saindo de um déficit em transações correntes de 4,5% do PIB em abril de 2015, patamar associado a crises no balanço de pagamentos, para o atual 1% do PIB, é um dos trunfos do governo. O ajuste foi garantido pelo aumento das exportações, alavancadas pela elevação do preço das commodities, pela safra recorde e pelo câmbio mais favorável, além da recessão doméstica, que reativou o interesse das empresas pelo mercado externo.
Graças ao resultado comercial, a conta de transações correntes teve superávit de US$ 2,9 bilhões em maio, o maior para o mês desde o começo da série estatística, em 1995, e o semestre pode fechar equilibrado, o que não acontecia desde 2007. Nos primeiro semestre, a balança comercial teve saldo de US$ 36,2 bilhões. Estima-se que o ritmo deve arrefecer nos próximos meses com o fim da safra agrícola, a queda do preço das commodities e alguma recuperação do mercado doméstico. A previsão do saldo para o ano foi fixada em US$ 60 bilhões.
Outro ponto de suporte das contas externas é a entrada de Investimento Direto no País (IDP), que somou US$ 2,9 bilhões em maio, basicamente em participação de capital, e US$ 32,5 bilhões no ano. Em 12 meses, o volume acumulado chega a US$ 80,7 bilhões, consistente com a projeção de US$ 75 bilhões para o ano. Há receio de que o resgate das aplicações em ações e renda fixa possa contaminar o ingresso de IDP. Nem todos concordam com isso dado o horizonte de mais longo prazo com o qual geralmente trabalha o investidor que compra o controle ou a participação em empresas.
Estudo recente do Bradesco avalia que o IDP deve continuar tendo participação relevante no ajuste externo. Além disso, explica que tem contribuído para a melhora do perfil do passivo externo uma vez que, ao ser canalizado para a participação em empresas estará, na prática, aplicando em moeda local e mostrando sensibilidade aos ciclos econômicos. Não é um recurso de resgate rápido como acontece com as aplicações em bolsa quando a economia desacelera; ao contrário, nesses casos a resposta será uma redução das remessas de lucros e dividendos.
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