Ao completar ontem seis meses de governo, o presidente Donald Trump não teve grandes motivos a comemorar. Não conseguiu nenhuma vitória legislativa - o que é um alívio - e está cada vez mais enrascado nos fatos suspeitos de ajuda russa em seu favor ainda na campanha presidencial. Os últimos dias foram marcados por contrariedades. Uma pequena defecção no Partido Republicano, que domina Câmara e Senado, impediu que a promessa mais estridente de Trump se tornasse realidade: a destruição do "Obamacare", que tornou obrigatório o plano de saúde para todos os americanos. Os mercados viram nessa derrota um sinal de que os próximos passos da agenda legislativa do governo, a reforma de impostos, serão lentos e incertos.
O fracasso em destruir o Obamacare ricocheteia em vários pontos do plano de corte de impostos para os mais ricos, principal iniciativa do presidente na área econômica. Os recursos que seriam poupados serviriam para ajudar na mágica contábil e convencer o Congresso de que não haverá aumento grande do déficit se os ricos pagarem menos tributos. O rascunho do plano divulgado pelo secretário do Tesouro, Steve Mnuchin, indicou apenas que o corte de impostos pagava-se sozinho, com o incentivo a investimentos e ao crescimento econômico que propiciaria.
A derrota no Obamacare, na qual três republicanos impediram que ele fosse eliminado sem que outro programa o substituísse, chamou a atenção para as clivagens no partido dominante. A grande maioria dos republicanos é favorável à redução de impostos. Mas um número não desprezível deles prega a ortodoxia fiscal. Os cortes trarão mais déficit, mesmo com o corte de despesas listadas por Trump, que recai principalmente sobre programas sociais. O drama do governo está no Senado, onde 4 votos lhe dão a maioria - são 52 republicanos e 48 democratas.
As iniciativas coadjuvantes ao corte de impostos, como US$ 1 trilhão em investimentos na infraestrutura, não foram ainda em frente. O que mais avançou, e não é digno de aplausos, foi a desregulamentação, que certamente provocará batalhas na Justiça em relação às questões ambientais.
Na política externa, onde o presidente tem mais liberdade de ação, Trump se sentiu à vontade para destruir boa parte do legado americano e das instituições internacionais que ele moldou. Trump refreou seus ímpetos e não pôs fim ao Nafta e não declarou guerra tarifária à China. Mas retirou-se do Acordo de Paris, causou constrangimentos aos aliados da OTAN e criticou abertamente a Alemanha, enquanto bajulava o autocrata Vladimir Putin, um inimigo da democracia.
A Rússia é o "ponto cego" do governo Trump. Os motivos para essas relações suspeitas podem terminar em impeachment do presidente. Às vésperas de encerrar seu primeiro semestre na Casa Branca, Trump, em entrevista ao New York Times espinafrou seu ministro da Justiça, Jeff Sessions, por ter ele se declarar impedido de presidir o inquérito sobre a influência russa na campanha eleitoral, em benefício de Trump. Trump disse que soubesse disso antes "escolheria outra pessoa" para o cargo. Lançou também suspeitas de ter influências democratas sobre o vice-ministro, Red Rosenstein, que supervisiona o inquérito.
A sombra da Rússia assombra a equipe de Trump, que demitiu James Comey, o diretor do FBI, por investigar o assunto. De nada adiantou. Donald Trump Jr se reuniu com uma advogada russa que usou como isca para atraí-lo o pretexto de que possuía informações que poderiam prejudicar a rival Hillary Clinton. Paul Manafort, um dos chefes da campanha, estava na conversa. Jared Kushner, o genro que ocupa cargos no governo, deixou várias pistas de que conversava, não se sabe o que, com os russos.
O cerco a Trump continua se fechando. Roberto Mueller, chefe das investigações, indicou que investigará os negócios de Trump para saber os motivos de tanto amor pelos russos. Trump faz o que lhe dá na telha e pode até mesmo se incriminar. Após reunião oficial de 2h e 15 minutos com Putin, durante encontro do G-20, o presidente americano conversou, sem testemunhas americanas, com Putin por um bom tempo. Há suspeitas de que negócios de oligarcas russos com Trump estão interferindo na política americana e de que Trump age para esconder esses fatos. Em seis meses dessa novela, Trump é o vilão e está cada vez mais enrolado em uma trama que pode acabar ejetando-o da Presidência.
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