- Valor Econômico
Sem condições para crescer, Brasil flerta com o improviso
O segundo depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao juiz federal Sérgio Moro e a apresentação da segunda denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer, na semana passada, lançaram diretrizes prematuras, mas primordiais, para 2018. Os dois eventos e a tensão por eles provocada apressam a construção de cenários eleitorais.
Um Lula mais defensivo e agressivo, em depoimento ao juiz federal, para alguns mostrou-se fragilizado demais para disputar a Presidência da República pela terceira vez. Para outros, Lula é carta que sairá do baralho somente se a sentença de Moro por crime de corrupção e lavagem de dinheiro no processo do tríplex do Guarujá (SP) for acatada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF4), a segunda instância judicial da Lava-Jato, até agosto de 2018, período em que os partidos registram as candidaturas. Em meados de julho, Lula foi condenado a 9 anos e seis meses de prisão em regime fechado.
Embora grave, a denúncia pelos crimes de organização criminosa e obstrução de justiça não é interpretada como uma ameaça a Temer. As acusações que já coleciona não servirão de aditivo à sua esquálida popularidade e aos interesses do PMDB. O partido é maior que Temer e deverá apoiar um candidato competitivo para dividir um comando catalisado há pouco mais de um ano pela Constituição que assegura ao vice-presidente a primeira posição na linha sucessória.
O "poder econômico" ou "do dinheiro", ainda não escolheu seu candidato para 2018. A preferência será indicada em breve e poderá alterar dois cenários em configuração. Um afunila a perspectiva do resultado das urnas e o outro espersa. O primeiro cenário comporta Lula versus o Anti-Lula. O segundo deve acomodar várias candidaturas que se aproximarão por complementaridade. Os aspirantes à cabeça de chapa no momento têm seus nomes associados à direita e centro-direita: João Dória, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Álvaro Dias e Joaquim Barbosa.
Há um grande desequilíbrio entre os dois cenários. No primeiro, o candidato à vice será decorativo. A vontade e o discurso de Lula devem prevalecer. No segundo cenário, o vice será o necessário, se possível. A função dá autoridade ao partido. E o partido dá votos ao governo. Temer é o terceiro vice-presidente do PMDB que, desde 1985, tornou-se presidente da República sem ser eleito diretamente para o cargo.
O mercado financeiro defende o segundo cenário para 2018 também por comportar o debate de questões nacionais. Sem esse debate a recuperação da economia em bases consistentes será dificultada. O primeiro cenário - Lula X Anti-Lula - não comporta debate e favorece a judicialização do processo eleitoral e do seu resultado. Ignorar Lula é o mesmo que rifar das eleições 30 milhões de votos quando, na verdade, esses votos devem ser conquistados.
Interessa ao mercado financeiro perspectivas melhores com a economia adequada para conviver com juros menores. Essa característica valoriza as carteiras de títulos e portfólios de crédito notadamente referenciados em juros prefixados. Os investidores não compram ativos porque este ou aquele candidato será o presidente da República. Eles compram ativos, apostando que venderão esses mesmos ativos por preços mais elevados.
O mercado é estruturalmente "vendido" em taxa de juro e "comprado" em preços de contratos. Se a situação política e econômica vai bem, os preços caem e os juros sobem. Após a redução da Selic em 600 pontos-base, o mercado ainda quer lucrar com suas carteiras, enquanto o Banco Central (BC) já sinaliza desaceleração do corte. A partir do momento em que 50% mais 1 operador entender que o BC vai parar de cortar o juro, o mercado pode mudar radicalmente de posição e passa a apostar na alta do juro.
A economia está em recuperação cíclica alimentada pelo consumo. O incentivo está por trás da liberação bilionária de recursos de contas inativas do FGTS, ampliada pelo saque do PIS/Pasep, que tem permitido aos brasileiros livrarem-se de dívidas e, os bancos, de créditos de recebimento duvidoso, o que abre caminho para novos ciclos de endividamento. As contas públicas persistem, porém, como entraves ao crescimento. A criação do teto de despesas públicas é condição para o reordenamento das finanças, mas depende da aprovação da reforma previdenciária.
O limite dos gastos é um antitérmico, solução com curto prazo de validade, ainda que fortalecido por decisões como essa, pressão do Ministério da Fazenda para que o BNDES pague ao menos parte do que deve ao Tesouro Nacional, aumento temporário de arrecadação com nova edição do programa de refinanciamento de dívidas tributárias (Refis) e venda de ativos como Eletrobras.
"Sem atacar o desequilíbrio das contas públicas, o problema só aumentará. É algébrico. Quanto mais o tempo passa, maior será o problema", diz quem conhece do assunto.
O Brasil chegou à gestão do improviso por não ter prosperado, há um ano, as condições necessárias para o crescimento sustentável. São motores para alimentar a expansão da atividade, redução de juros, privatização e reforma previdenciária. O corte do juro foi acionado, mas com atraso e em ritmo menor que o esperado.
A reação da atividade, confirmada por indicadores, é comparada a um "voo de galinha obesa" - mais curto que os anteriores que foram interrompidos pelo retorno da inflação alimentada por mais déficits. A galinha ganhou peso proporcional aos problemas a serem equacionados.
E comete um equívoco quem faz aposta cega no crescimento sem pressões inflacionárias por considerar que o Brasil dispõe de expressiva ociosidade na economia. A ociosidade existe na indústria é fato. Porém, a infraestrutura brasileira está estrangulada. Necessita de investimentos que podem chegar como resultado de processos de privatização bem estruturados. Esse é um dos casos em que investimentos funcionam como antídoto contra a inflação e também contra processos de retração da atividade e a favor da produtividade.
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