- O Estado de S. Paulo
Saem os cálculos técnicos, entram os políticos. Governo Temer “paga” para ver
Não há mais novas contas a fazer sobre o estado atual e futuro da Previdência. Tudo já foi esmiuçado e projetado, centavo por centavo: qual teria sido o efeito de uma reforma parruda, qual será o de uma reforma enxuta ou sem qualquer reforma. Agora é com a política. Os cálculos não são mais técnicos, mas políticos: do lado do governo, qual será o total de gastos para garantir os 308 votos necessários à aprovação da emenda constitucional e, do lado dos parlamentares, qual será o custo/benefício eleitoral de dar aval ou rejeitar a reforma. É assim que pode ser traduzido o momento atual em Brasília, em que cada lado divulga, minuto a minuto, o “suposto” placar da votação da Previdência – o que determinará se a emenda vai ou não desembarcar no plenário. O último prazo, acertado entre o governo e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi o dia 18 de dezembro, quase esgotado o tempo regulamentar.
Enquanto dia 18 não chega, continua o “tour” no Planalto de líderes partidários, governadores e prefeitos, com os quais o próprio presidente negocia incansavelmente verbas em troca do apoio à reforma da Previdência. Como resultado dessas conversas, segundo levantamento do Estadão, já foram aprovados projetos e já foram prometidos desembolsos com impacto de R$ 43 bilhões nas contas públicas ao longo dos próximos anos – e deputados, senadores e empresários ainda tentam arrancar mais e mais do Planalto. Não deixa de ser um contrassenso: mais gastos públicos para... reduzir esses mesmos gastos.
Difícil saber, a essas alturas, se esse “investimento” todo terá retorno. Em outras palavras, se todas as concessões no projeto e todos os agrados à base parlamentar levarão à aprovação da reforma. Nesse cenário, volatilidade é o que tem caracterizado os humores dos políticos e volatilidade é o que tem caracterizado os humores dos mercados. Mesmo dispostos a engolir qualquer reforma da Previdência – a versão mais enxuta formatada sob supervisão do Planalto foi considerada palatável –, os investidores ainda não confiam que a proposta passará. É clima de tudo ou nada. Melhor dizendo, de qualquer coisa ou nada. Se o País precisa desesperadamente de uma reforma da Previdência, o mesmo se pode dizer do governo Temer. Os integrantes da equipe econômica não cansam de repetir os argumentos para justificar a urgência na votação.
São vários os “se” aos quais eles recorrem. O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, por exemplo, adverte que a dívida brasileira pode subir de 74,4% do Produto Interno Bruto (PIB) para 100% em 2021, “se” as mudanças não emplacarem – com a reforma, poderia se estabilizar em torno de 80%. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) vai ainda mais longe e prevê que, em 2050, “se” nada for feito, o Brasil pode se tornar o campeão em gastos com aposentadorias, em proporção do PIB, no universo de 43 países, incluindo todos os membros do G-20 e da OCDE: 17%, praticamente o dobro do nível atual (9%). No documento preparado pela Fazenda para defender a aprovação da reforma, o governo diz que, “se” não vier a mudança no regime, a saída seria aumentar a carga tributária em 8,5% do PIB até 2060 ou cortar gastos em outras áreas importantes, como educação e segurança, e mesmo nas demais áreas da própria seguridade social, que inclui previdência, saúde e assistência social.
E quanto ao governo Temer? O que será do seu último ano e do futuro eleitoral do seu legado, ancorado claramente no reformismo, “se” a Previdência empacar? Embora já tenha conseguido aprovar a reforma trabalhista – que, por sinal, entra em campo com várias divergências de entendimento na Justiça – foi na Previdência que ele fez sua grande aposta. O adiamento da votação apareceria como fracasso do governo para os setores empresariais e principalmente para os mercados. E daria um gostinho de vitória aos oposicionistas, embora o destino da Previdência esteja amarrado mesmo à ampla base parlamentar de Temer – basta ver como têm sido minguadas as manifestações promovidas pelas oposições. Num ano como o de 2018, em que a temperatura política promete atingir níveis de aquecimento global, é inevitável que uma parcela significativa da conta política caia para o governo. Mesmo que compartilhada com o Congresso.
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