quinta-feira, 19 de abril de 2018

Maria Cristina Fernandes: Minas estará onde nunca esteve

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- Valor Econômico

Estado pode deixar de ser termômetro da disputa nacional

A aceitação da denúncia contra o senador Aécio Neves pelo Supremo Tribunal Federal ameaça colocar outubro de 2018 no ponto fora da curva da história eleitoral de Minas. De 1989 até hoje, quem quisesse saber o resultado da eleição presidencial gastando menos dinheiro fazia pesquisa em Minas Gerais. A banda de cima do Estado vota alinhada ao Nordeste e a de baixo, a São Paulo. Daí porque, dos grandes colégios eleitorais, Minas foi o único que, nas seis disputas desde a redemocratização, reproduziu, na votação para presidente, o resultado nacional.

O fenômeno nem sempre se traduziu numa política estadual nacionalizada. Eternamente adversários nas eleições presidenciais, PT e PSDB mineiros chegaram a fazer dobradinhas na era petista. Ganharam apelidos (Lulécio, Dilmasia) e até mesmo candidato único para prefeito da capital (Márcio Lacerda, do PSB).

A campanha estadual deste ano ruma para reproduzir a polaridade que dominou a política nacional de 1994 a 2014 e agora ameaça se esvair no país. O governador Fernando Pimentel, principal cargo executivo do PT desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, disputa a reeleição.

Réu no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por acusação de corrupção passiva, ganhou, da Corte, o direito de permanecer no cargo enquanto responde ao processo. Dono de inflamado discurso contra a Lava-jato, o governador chegou a se filiar à corrente dos que defendiam o refúgio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa embaixada.

Mas a Lava-Jato não é seu único problema. No comando de um Estado endividado e dependente da exportação de minérios, Pimentel parcelou em três datas o pagamento do funcionalismo. Enfrenta ainda uma desgastante greve de professores que o acusam de manter o arrocho tucano. A despeito disso, o governador manteve sua rotina de viagens pelo interior do Estado com o discurso de que ali estava para 'partilhar as dificuldades' com a população.


Colou até a entrada de Antonio Anastasia na parada. Com uma imagem preservada da lambança de seu antecessor e mentor na política, o senador tucano resistia a aceitar a missão enquanto Aécio se mantivesse na disputa pela reeleição. Mas sem um palanque no segundo maior colégio eleitoral da Federação, Alckmin estaria condenado na largada. A pressão funcionou. Candidato, o mentor do choque de gestão mineiro já encostou no governador.

A ausência de financiamento empresarial aumenta o peso da máquina pública na disputa de outubro, especialmente num Estado que tem 853 municípios. Por isso, Pimentel ainda tem chance de por uma folga na dianteira. Em torno de seu principal adversário, no entanto, ameaça se formar uma aliança que tenta recompor o campo um dia liderado pelo PSDB. A revoada se deu quando Aécio escolheu o ex-ministro Pimenta da Veiga para seu candidato a governador na eleição em que disputou a Presidência. Além do PSDB, esta aliança reuniria o PSB (Marcio Lacerda), o DEM (Rodrigo Pacheco) e o PP (Diniz Pinheiro).

Além do PT, o batalhão do Palácio da Liberdade tem o PMDB (Fábio Ramalho) e o PR (Josué Alencar). Recrutada, a ex-presidente Dilma Rousseff compareceu. Ainda que lidere a disputa ao Senado, o ativo da ex-presidente está mais nos votos que ameaça tirar de Anastasia do que naqueles que pode vir a amealhar.

A aposta petista, traçada pelo ex-presidente Lula antes da prisão, foi de fazer com que a presença de Dilma na disputa viesse a por o carimbo de Aécio na testa de Anastasia e fizesse crescer sua rejeição. Não apenas pelo fato de o candidato tucano ao governo de Minas ter sido relator do impeachment, mas, principalmente, porque a presença da ex-presidente leva para o palanque o antagonismo com o senador que, por ela derrotado, partiu como vestal para tirá-la do poder.

Aécio e Dilma, no entanto, custam a reproduzir, em Minas, o duelo de 2014. Contra a candidatura do senador a quaisquer cargos, unem-se o ex-governador Geraldo Alckmin e o senador Antonio Anastasia. De pouco lhe serviria o foro privilegiado, argumentam, se o Supremo já lhe fez réu. Seria preferível perdê-lo e, a exemplo do ex-governador Eduardo Azeredo, protelar sua condenação na primeira instância.

Contra a postulação de Dilma insurgem-se os pemedebistas, que querem ambas as vagas ao Senado. Restaria à ex-presidente disputar a Câmara dos Deputados. Depois da encenação de Judas a que se prestou no livro-entrevista de Lula ("A verdade vencerá"), não surpreenderia se a ex-presidente se prestasse a cumprir mais este papel.

A presença dos dois contendores de 2014 nacionaliza a campanha de Minas para trás. O principal eleitor do Estado está na cadeia e dela dificilmente sairá até outubro. Como na maior parte do país, a disputa local tem um percentual de votos indefinidos maior do que a nacional. O grau de indefinição só se uniformizará quando a ficha cair sobre a ausência de Lula da disputa.

Deputados da aliança de Pimentel com uma dúzia de eleições nas costas, no entanto, acreditam que a ausência de Lula vai, pela primeira vez, desvincular completamente as disputas majoritárias e proporcionais da chapa presidencial. Quem impuser ao eleitor um candidato a presidente vai se dar mal. A notícia é pior para candidatos de partidos mais estruturados, como Alckmin ou o candidato do PT, do que para franco atiradores, como Marina Silva, Ciro Gomes, Joaquim Barbosa ou Jair Bolsonaro. Vai ser cada um por si e ninguém por todos. E não apenas do outro lado da Mantiqueira.

Voto ou solidariedade?
A manutenção do patamar de votos de Lula, ainda que sob variações para mais (Vox Populi) ou para menos (Datafolha) se dá porque ele está preso ou apesar da prisão? É a crença na primeira resposta que leva o PT a crer que o eleitor escolherá o candidato a ser indicado pelo ex-presidente. O partido aposta na ideia de que o brasileiro é incapaz de traçar a diferença entre a solidariedade a Lula e a escolha daquele que deve comandar o país pelos próximos quatro anos. É um bom atalho para o fundo do poço eleitoral.

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