- Valor Econômico
Apelo ao hemisfério cerebral racional é o charme do Novo
João Amoêdo pode não ser o azarão clássico desta campanha eleitoral mas tem dado sinais de vitalidade que mobilizam seus eleitores. Ao ponto de dobrar sua intenção de voto só com a propaganda nas redes sociais.
A pesquisa divulgada esta semana, feita pelo Instituto FSB para o BTG Pactual, confirmou uma impressão que se tinha a partir de propaganda boca a boca em círculos de formadores de opinião e de intensa campanha na internet: João Amoêdo, do partido Novo, está crescendo de tal forma que, em alguns cenários, já encosta em Geraldo Alckmin (PSDB), Alvaro Dias (Podemos), Ciro Gomes (PDT) e até Marina Silva (Rede).
O BTG encomendou uma pesquisa telefônica com 2 mil eleitores, nos dias 25 e 26 de agosto, margem de erro de dois pontos. Está registrada no Tribunal Superior Eleitoral com o número BR 06062/2018. Tal como as pesquisas do Ipespe para a XP, não se deve menosprezar esses levantamentos por telefone, vez que uma comparação entre os dados desse tipo de levantamento e o do Ibope, Datafolha e MDA se equiparam.
Na declaração espontânea, Amoêdo recebeu 3% das intenções de voto, e na estimulada teve 4%, praticamente dobrando os índices anteriores. Seu eleitorado se concentra majoritariamente na faixa dos que recebem mais de 5 salários mínimos, e a maioria é da região Sudeste.
Amoêdo já é um fenômeno, mas poderia lhe ser atribuída a condição de azarão dessa campanha presidencial? Para ser um azarão, ou seja, alguém que está vindo célere dos últimos lugares com chances reais de chegar à reta final da disputa, exigem-se determinados traços pessoais que ele, em princípio, não tem. último azarão de que se tem notícia apareceu na campanha de 1953: vereador e professor do ensino secundário, filiado a pequeno partido, Jânio Quadros venceu a disputa pela Prefeitura de São Paulo concorrendo com candidatos de grandes partidos. Baseou sua campanha no populismo do tostão contra o milhão e na luta contra a corrupção. Histriônico, a vassoura foi seu símbolo e, na expressão resumida de Boris Fausto, assim se deu a história: "O desejo de inovar, derrotando as máquinas partidárias, e a crença nos poderes mágicos de um homem no combate à corrupção, uniram diferentes setores sociais, da massa trabalhadora à classe média, em torno da candidatura Jânio".
Decididamente Amoêdo não faz esse tipo. Mas seu crescimento indica que algo está vindo com ele campanha afora e só se deve definir mais à frente, quando houver pelo menos uma semana de propaganda no rádio e na TV, em comparação aos seus resultados na internet. E pode seguir crescendo com a campanha das redes, única possível para um candidato fora do quadro partidário tradicional, enquanto os demais crescerão pela propaganda na TV.
Sem partido, sem máquina, abrindo mão do fundo partidário, sem horário de propaganda na TV e no rádio, Amoêdo tem nas redes sociais a força de sua campanha. Estaria gastando seus próprios recursos, a uma ordem de 50 mil dólares por semana segundo dados informais que circulam nos gabinetes próximos aos políticos tradicionais.
Mas há uma diferença abissal se chegar a ser o primeiro azarão depois de Jânio: são dois momentos e duas pessoas totalmente diferentes. Amoêdo é o oposto daquela personalidade carismática, singular, cheia de charme e maluco veneno. Condições propícias a fazer nascer um azarão que dá a largada por uma razão e passa os concorrentes por outra.
O que há com Amoêdo e seu partido, segundo o cientista político Paulo Kramer, da Universidade de Brasília, não é para imediatismo. Seria uma aposta de longo prazo na construção de um partido, o Novo, que se legitime pelo apoio que conquista para suas ideias. "Sem todas essas facilidades cartorialistas que estão aí".
Evitando prognósticos sobre crescimento, Kramer afirma que Amoêdo é uma pessoa sensata, que ganhou dinheiro no mercado e que atrai a adesão, por seu perfil, de uma camada bem educada da população. "São pessoas com nivel superior, relativamente jovens, e que acima de tudo querem uma sociedade mais baseada no mérito e não no compadrio", afirma. Como, aliás, demonstram os índices da pesquisa recente.
Acrescenta Paulo Kramer: "Ao contrário do Jânio, Amoêdo não faz apelo ao desespero das massas, por questões econômicas ou por outras. Isso tem mais a ver com o lulopetismo e com o bolsonarismo. Ele apela à razão".
Confirma-se nas discussões sobre intenção de voto a impressão de que Amoêdo procura falar para um eleitorado de formação qualificada que está numa situação econômica e social mais confortável, e que gostaria de um jogo político menos dominado pelo favoritismo e pelo populismo.
O candidato abriu mão do fundo partidário eleitoral (teria direito a pouco menos que R$ 1 milhão), não tem espaço na propaganda, não aparece em debates, dá entrevista quando o convidam. É realmente uma campanha de internet visando o futuro. "Acho que a aposta deles não é pelo poder imediato, é por um processo de construção partidária a médio e longo prazo", afirma Paulo Kramer.
Sem expectativa de vencer agora, o candidato não tem a premência do azarão clássico, e se atem ao lado racional do eleitorado, não ao emocional.
O apelo à razão é o que faz também Henrique Meirelles, numa campanha parecida com a de Amoêdo mas guardadas as proporções. Meirelles já tem desgaste de muitos anos no governo. Mesmo assim, ainda tem coragem de tocar em temas impopulares. Afirma que há uma agenda de reformas e que, se não seguir nesse rumo, o Brasil não sairá da crise.
O apelo, porém, se torna cansativo, gasto, devido ao desgaste do candidato. O caso Amoêdo é diferente e, embora Meirelles tenha um vasto tempo de propaganda na televisão, não será surpresa se o Novo, com sua campanha de internet, acabar tendo mais votos que ele. Pode ser a mesma agenda, só que a de Amoêdo tem mais viço, mais frescor.
Que o candidato do Novo chegou a mais de 2%, chegou. Que o candidato do Novo demonstra possibilidade de expansão antes de começar o horário eleitoral de propaganda, é fato. Se chegará a ser um azarão é questão a conferir depois de alguns dias de campanha de seus adversários na TV e no rádio. Para ver quem avança mais, se a TV ou a internet.
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