Para ex-presidente do STF, discutir uma nova Carta Magna sem Constituinte, ideia defendida por general Mourão, vice de Bolsonaro, pode transformá-la em uma 'coisa da elite'
Matheus Lara | O Estado de S.Paulo
Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e ex-ministro da Defesa, Nelson Jobim diz achar "completamente equivocada" a ideia de que o Brasil discuta uma nova Constituição sem a formação de uma Assembleia Constituinte no Congresso. Esta é uma ideia defendida pelo General Mourão (PRTB), vice de Jair Bolsonaro (PSL) na corrida presidencial.
Sem citar Mourão, Jobim afirmou ao Estado que tirar o povo do processo de discussão de uma nova Carta Magna e deixá-la nas mãos de "notáveis" tende a transformá-la em uma "coisa da elite". "(Sem a participação do povo), vira uma coisa de elite. As constituições feitas por notáveis, veja principalmente a de Weimar, deu no nazismo", disse após participar de um painel sobre os 30 anos da Constituição de 1988, promovido pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
A referência de Jobim é em relação ao documento redigido pelo jurista Hugo Preuss no início do Século XX. Ele foi um dos principais mentores da primeira constituição da República de Weimar, que vigorou na Alemanha a partir de 1919, antes da ascensão do nazismo.
"Esse modelo (sem Constituinte) não funciona", afirmou o ex-ministro do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "Não funciona no nosso sistema. Nós nunca fizemos Constituição a partir de processos de notáveis. Nós sempre fizemos um processo político de construção. Então, não existe essa hipótese. Acho isso aí completamente equivocado."
Ex-ministro do STF e também presente no evento, Eros Grau disse que a Constituição brasileira é "contemporânea à realidade". "Ela não envelhece, nem fica jovem. Ela é a ordem jurídica fundamental de uma sociedade em um determinado momento histórico. Por isso, ela é contemporânea à realidade. Existe a Constituição do Brasil, hoje, aqui e agora. Não a de 1988. Quem escreveu o texto não é o mesmo que o interpreta e o aplica agora."
Ao comentar a atuação do STF, Eros disse que ele se tornou num "tribunal monocrático". Ele citou números de um levantamento feito pelo Estado no início deste ano, e reproduzidos em outros sites, que mostram que 51,3% dos 26,5 mil julgamentos de mérito realizados em 2017 foram decididos por um único ministro.
"O Supremo é um órgão colegiado. Quem recorre a ele tem direito assegurado pela Constituição de ser julgado pelo plenário", disse o ex-ministro. "Mas isso não ocorre e hoje em dia quem bate na porta do Supremo para defender seus direitos fica dependendo do subjetivimo e das oscilações de humor de muito magistrado."
Sem citar exemplos, Eros disse que o STF precisa julgar casos, e não pessoas. "O STF tem que decidir sobre textos e atos, não sobre pessoas. Hoje ele se transformou, olhando para nossa Constituição que tem 30 anos, num tribunal monocrático e que julga pessoas." /Colaborou Luiz Raatz.
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