- Valor Econômico
Economia em estado bipolar: pode piorar mais ou melhorar
Com o novo presidente que será eleito no domingo, é hora de pensar em um roteiro para a recuperação do crescimento e do emprego. Até agora, as reflexões têm sido sobre os tremendo riscos de dar tudo errado e a crise se aprofundar se Jair Bolsonaro, do PSL, que lidera as pesquisas, for eleito. O temor procede. Afinal, o Brasil nunca foi governado por uma crença liberal. Reformas de natureza liberal foram feitas por necessidade, mas não por opção programática. Além do fato de que, durante a campanha, o candidato exacerbou no verbo e foi pródigo em lançar polêmicas esdrúxulas, para arrepio da esquerda e inquietação dos mais progressistas.
Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos, dedicou os últimos meses para, junto com alguns especialistas, elaborar proposta de reforma da Previdência para um novo governo.
Ele entregará na semana que vem, ao candidato que for eleito, um amplo projeto de reforma que prevê, dentre várias e importantes mudanças, a possibilidade de os trabalhadores destinarem parte do depósitos do FGTS para contas individuais em fundos de previdência, em um regime de capitalização parcial. Outro aspecto é a desindexação dos benefícios ao salário mínimo. A implementação do novo modelo seria gradual, ao longo de 20 anos.
A reforma da Previdência é parte crucial do ajuste fiscal e este é precondição para a recuperação da confiança e do crescimento.
Arminio vai mais adiante e lista uma agenda de quatro pontos que contempla o ajuste fiscal e medidas para ganhos de produtividade, mas esses dois temas são precedidos por um necessário e firme compromisso com a não incitação da violência e obscurantismo e um conjunto de iniciativas de cunho distributivo e de igualdade de oportunidades.
Isso pode ajudar a resgatar o país do estado de desalento em que se encontra. Trata-se, aqui, de garantir uma sociedade civilizada em que impera o Estado de Direito.
O governo que assume no dia 1º de janeiro não terá tempo para errar. A economia brasileira está em uma condição "bipolar": tanto pode piorar muito, quanto, se a largada for acertada, voltar a crescer por vários anos, dada a imensa capacidade ociosa.
Arminio vislumbra a possibilidade de taxas de expansão do PIB de 5% ao ano nos próximos cinco anos, se a nova gestão fizer um bom trabalho. "Se na largada o governo mostrar esse caminho [das quatro agendas] e deixar claro que ele é crível, a economia começará a projetar um cenário futuro melhor."
Essa é, segundo ele, uma agenda "meio iluminista", que encara os fatos e que claramente se oponha ao "nós contra eles", sem a qual "nós não vamos a lugar algum", disse.
Houve um "massacre econômico e social" nos últimos anos, disse ele - " justiça seja feita às reformas do governo Temer" -, que levou a uma queda de 10% no produto per capita. Com tal retração, somada aos 2% de aumento do PIB per capita que o país deveria ter colhido nos cinco anos finais da gestão PT, chega-se a uma perda irreparável: a renda, que poderia ter crescido 20%, caiu 10%.
A situação das contas públicas é muito "precária" e não basta mais só estabilizar a relação dívida/PIB. A dívida, que caminha para a faixa de 90% do PIB, tem que começar a cair.
Para isso ocorrer, Arminio defende um ajuste fiscal da ordem de cinco pontos percentuais do PIB, além de um ponto percentual já obtido com a recuperação cíclica ainda que tênue da economia. O governo precisará produzir superávit de 3,5% do PIB no prazo de três anos para inverter a trajetória crescente da dívida bruta do setor público.
Os ganhos de produtividade serão obtidos com investimentos em infraestrutura, reforma tributária, abertura da economia, melhoria da educação e da saúde, citou o ex-presidente do BC.
O Estado precisa ser reestatizado, para prestar serviços à sociedade, e não a partidos políticos ou grupos privados, ressaltou ele, lembrando ainda que a bolsa empresário, concedida nos anos do governo do PT, deve seguir em processo de redução, com a reversão das desonerações tributárias.
O ex-ministro Delfim Netto também enxerga uma possibilidade de, "com humildade e inteligência", o eventual governo de Bolsonaro acertar o caminho e colher a recuperação cíclica - com crescimento do PIB de 3,5% a 3% no ano que vem e melhoria no mercado de trabalho. Com isso, ele ganharia um ano de tranquilidade para aprovar as reformas no Congresso. E ao crescimento vindo da ocupação da capacidade ociosa pode se seguir um ciclo virtuoso que estimularia o crescimento orgânico, resultado da expansão dos investimentos.
Talvez, diante de um desfecho eleitoral que se desenha e ao qual cabe apenas aceitar, há mais gente tentando um olhar positivo. Nesta semana, em duas reuniões, na B3 e na XP Investimentos, o sócio da Mauá Investimentos e ex-diretor do BC, Luiz Fernando Figueiredo, levantou, nas discussões, uma possibilidade até então esquecida: "E vai que dá certo".
Banco Central
Está praticamente certo que Ilan Goldfajn continuará na presidência do Banco Central, caso Jair Bolsonaro vença as eleições de domingo. "Praticamente" é um "hedge" para o caso de o inesperado acontecer, pois, já estaria tudo combinado para a sua permanência.
A ideia é que Ilan seja o primeiro presidente de um BC independente, com mandatos fixos para a diretoria - proposta que o candidato do PSL abraçou e que buscará aprovação em 2019.
A manutenção do comando do BC é um importante e positivo sinal para os mercados. Ilan ficaria, assim, quatro anos na presidência do BC - dois anos no governo Temer e outros dois na gestão Bolsonaro. Seria o primeiro mandato não coincidente com o do presidente.
A intenção da equipe de Paulo Guedes, que será o ministro da Economia em um eventual governo do capitão da reserva, é manter alguns poucos nomes da pasta da Fazenda ao menos por um período de transição.
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