- Folha de S. Paulo
Se a ideia de Bolsonaro é comer a democracia pelas bordas, ele está uma guerra atrasado
Dizia-se do Estado-Maior francês que ele era despreparado e estava sempre uma guerra atrasado. A expressão “uma guerra atrasado” surgiu após o desastre de 1940, no qual o Exército francês, tendo apostado todas as suas fichas na construção da linha Maginot, que se revelou totalmente inútil (ela talvez tivesse funcionado na Primeira Guerra Mundial), sucumbiu em apenas 38 dias e com enormes perdas às Panzerdivisionen de Adolf Hitler.
Se a intenção de Jair Bolsonaro e seus colaboradores próximos é ir comendo a democracia pelas bordas para aumentar os poderes do Executivo, a exemplo do que fizeram outros populistas autoritários contemporâneos, como Vladimir Putin, Viktor Orbán ou Recep Erdogan, então eles estão, como o Estado-Maior francês, uma guerra atrasados.
David Runciman, autor de “Como a Democracia Chega ao Fim”, ensina que há uma diferença fundamental entre os golpes do passado e os do presente. Nos primeiros, os conspiradores tinham de ser tão explícitos quanto possível, para não deixar margem de dúvidas sobre quem estava no poder e deveria ser obedecido. Não é uma coincidência que as primeiras movimentações de um Putsch incluíssem sempre capturar as estações de rádio e TV e fechar os jornais não cooptados.
Nas escaladas autoritárias modernas, a regra é o oposto. Os conspiradores precisam esconder a todo custo suas reais intenções. Não podem, como faz o clã Bolsonaro, falar em fechar cortes ou limitar o funcionamento do Legislativo. Ao adotar as medidas que lhes asseguram maiores quinhões de poder, golpistas modernos devem dizer que estão aprofundando a democracia e devolvendo ao povo a capacidade de decidir seu destino. Até Nicolás Maduro, que não é exatamente um estrategista nato, faz isso.
De uma forma meio perversa, não deixa de ser alentador constatar que Bolsonaro e o grupo que o cerca parecem despreparados para um golpe à moda moderna.
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