- Valor Econômico
Rodrigo Maia busca apoio e governo se livra do toma-lá-dá-cá
O presidente Jair Bolsonaro está hospitalizado há duas semanas, recupera-se de cirurgia para a retirada da bolsa de colostomia e deve retornar ao Palácio do Planalto em breve. Este é o seu desejo e também o desejo dos investidores que observam com surpreendente tolerância as trapalhadas na comunicação do governo e a estreia do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como articulador político da reforma da Previdência junto a governadores. O deputado é um novo ator no processo de interlocução do governo com a classe política, embora o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tenha oficialmente essa missão.
O ministro Paulo Guedes atribuiu a Rodrigo Maia a tarefa de angariar apoio para a reforma da Previdência. Se essa ação de um lado pode encrespar ainda mais a relação entre a Economia e a Casa Civil, de outro, abriu um campo de manobra para o governo - sobretudo com os governadores - que uma das promessas de campanha do presidente Bolsonaro invibializa. Bolsonaro garantiu que não praticaria a política do "toma-lá-dá-cá", recorrente nos governos anteriores. Mas, sem alguma troca, é improvável que o governo obtenha os votos necessários para aprovar a reforma previdenciária.
Levantamento realizado pela MCM Consultores Associados mostra que, de fato, o atual governo é o que tem a menor participação de políticos no comando de ministérios, quando comparado às administrações anteriores, como demonstra o gráfico abaixo. Enquanto no governo Bolsonaro essa participação é de 27%, no governo Temer chegou a 93% e, no segundo mandato de Lula, a 86%. Desde a década de 1990, só Collor "empregou" menos políticos que Bolsonaro, 19.
Nos mercados, a semana terminou mal. Dólar e juros voltaram a subir e o Ibovespa caiu, distanciando-se da almejada marca de 100 mil pontos. O ambiente externo deu sua cota de contribuição ao azedume geral.
Incertezas quanto ao encaminhamento da proposta de reforma das aposentadorias - com ou sem Maia na parada - foram decisivas, na semana passada, para a virada de humor de gestores e investidores que compartilharam com perplexidade uma sucessão de tragédias brasileiras: as mortes de jovens entusiastas do futebol no incêndio que destruiu o Centro de Treinamento do Flamengo; os prejuízos materiais e mais mortes no Rio de Janeiro em decorrência de uma chuva torrencial; e os desdobramentos da ruptura da barragem da Mina do Feijão, em Brumadinho (MG), com mais de uma centena de mortos e outra centena de desaparecidos.
A coluna fez um levantamento das questões com potencial para produzir curto circuito na fiação do governo, a partir das informações publicadas no Valor PRO. Confira:
*A idade mínima para aposentadoria na proposta de emenda constitucional (PEC) da reforma da Previdência provocou celeuma. Segundo a minuta da proposta, que vazou na semana anterior, a equipe econômica propõe 65 anos para os homens e 65 anos para as mulheres, enquanto o presidente Bolsonaro havia defendido 62 anos para eles e 57 para elas tendo, supostamente, concordado depois em 65 anos e 60, respectivamente.
*Em menos de 24 horas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, informou que um novo regime trabalhista estaria incluído na proposta do governo para a reforma da Previdência. Em seguida, após a repercussão das declarações, Guedes afirmou que a carteira de trabalho "verde e amarela", em estudo, não entrará na proposta da Previdência. A carteira "verde e amarela" proposta permitiria aos trabalhadores escolherem quais os direitos trabalhistas que pretendem ter e o quanto pagariam de encargos.
*Sem que a proposta de reforma da Previdência esteja 'redonda' e devidamente pública, o ministro Paulo Guedes pediu a técnicos que rascunhem uma PEC para desvincular, desindexar e descentralizar o Orçamento da União, como apurou Claudia Safatle, colunista e diretora adjunta de Redação do Valor. A ideia de total desvinculação de receitas direcionadas legal ou constitucionalmente a despesas pré-determinadas é conhecida como o "Plano B" do ministro da Economia, na hipótese do Congresso não votar a reforma das aposentadorias.
*Embora o presidente da Petrobras, o economista Roberto Castello Branco, tenha afirmado em entrevista exclusiva ao Valor estar "perfeitamente alinhado com o governo de que a negociação da cessão onerosa não é uma questão fiscal, é uma questão de desenvolvimento da indústria de petróleo no Brasil", Paulo Guedes estimou que o leilão dos excedentes das reservas da cessão onerosa pode ir até R$ 100 bilhões. O ministro disse que "está em aberto" o acerto para a União ficar com 40%, a Petrobras com outros 40% e os entes da Federação receberem 20% da receita da operação. E acrescentou estar sensível ao "sufoco dos Estados e municípios". Se tiver que escolher entre cumprir a meta fiscal [zerar o déficit público] ou compartilhar os recursos, "vou considerar, mas não prometi nada para ninguém", esclareceu.
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