- O Globo
O Brasil é um país em permanente campanha eleitoral. O presidente Jair Bolsonaro nem completou seis meses e já rasgou promessa de campanha lançando-se a um segundo mandato. Da prisão em Curitiba, Lula não faz outra coisa a não ser cálculos eleitorais. Em São Paulo, o governador João Doria pavimenta seu caminho ao Planalto em 2022. Todos os partidos se movimentam em torno da agenda eleitoral que só vai começar para valer mesmo daqui a três anos.
É difícil que uma nação com essa obsessão dê certo. Mesmo os arranjos em torno de medidas urgentes em tramitação no Congresso, como a reforma da Previdência, levam em conta este cenário futuro. Não se pode negar que esta reforma, por um milagre que até agora não se sabe a que santo atribuir, caiu no gosto popular. Os parlamentares vão aprová-la, mas de olho na reeleição já cederam a pressões de servidores e ainda podem mexer aqui e ali, de acordo com a capacidade de pressão de um ou outro setor.
Há muito tempo os políticos brasileiros trabalham com planos longos ou artificialmente estendidos. Os mais velhos se lembram do projeto de 20 anos de Fernando Collor e sua trupe assim que tomaram o governo. Seriam necessários cinco mandatos seguidos de alguém da turma para alcançar aquele objetivo. Collor, PC Farias e companhia queriam bastante tempo para juntar US$ 1 bilhão em propinas. Diante do que se viu depois, pode-se até dizer que eram bem modestos. Fernando Henrique Cardoso também tinha um projeto de longo prazo. Seu objetivo poderia ser mais nobre, garantir a estabilização da economia e da moeda. Foi com essa desculpa que trabalhou e financiou a emenda da reeleição. Mas seu resultado foi desastroso. Primeiro, porque para se reeleger quase acabou com o Plano Real, com o controle cambial da moeda. Depois, porque instituiu esse modelo político que torna todos os detentores de mandatos em escravos da reeleição.
O discurso do ódio que movimenta as redes sociais também é instruído por este estado eleitoral permanente. As pessoas que o praticam parecem estar sempre munidas de bandeiras de seus partidos caminhando em direção à seção eleitoral. Mais de 60% da população brasileira está ativa em alguma rede. Pelo menos a metade desse total manifesta sua posição política ou dá likes para um ou outro lado da corrente. Aliás, o Brasil parece ter apenas dois lados, ambos extremos.
Nos estados e municípios não é diferente. Aqui no Rio, Wilson Witzel não anunciou ainda ser candidato à reeleição porque acha que pode vir a ser o sucessor de Bolsonaro. É tão forte esta tara dos políticos por um novo mandato que até mesmo Marcelo Crivella, que agora respira sem ajuda de aparelhos, é capaz de sonhar com a reeleição. Em São Paulo, o prefeito da capital, Bruno Covas, promove um tsunami no seu gabinete, com cinco demissões, para ficar na ponta dos cascos em 2020, ano da eleição municipal em que vai querer renovar seu mandato.
Procure estados e municípios cujos governadores e prefeitos não são candidatos à reeleição e você vai encontrar apenas os que já estão cumprindo seu segundo mandato ou os encrencados. Mesmo assim, o objetivo eleitoral de quase todos continua igual. Estão trabalhando em favor de um candidato, de um partido político, de uma coligação partidária. Com algumas honrosas exceções, o resto da gestão desses executivos que não buscam nova eleição será movimentado tendo sempre na mira objetivo do seu grupo político. Essa é mais uma tragédia nacional.
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