- O Estado de S. Paulo
A paralisia está saindo muito cara e isso está evidente na nova onda de recuperações judiciais
A estagnação da economia brasileira ampliou-se em 2019. Cresceremos menos que em 2017 e 2018, anos que sucederam a mais longa recessão da nossa história moderna.
Essa situação é, antes de tudo, um desastre para a cidadania. Entre desempregados, subempregados e desalentados, estamos falando de mais de 25 milhões de pessoas!
Isso sem falar naqueles que só conseguem trabalhar em posições menos relevantes e remuneradas do que aquelas que já ocuparam. Ou naqueles que fizeram força para pagar os estudos e não conseguem vagas ou estágios que lhes permitam prosseguir na carreira.
Os impactos na autoestima das pessoas e nas famílias são seguramente muito grandes.
A mim impressiona o aparente conformismo do governo com essa cena. Nada acontecerá em qualquer área antes da reforma da Previdência, o que, no melhor cenário, nos levará até meados do segundo semestre.
Pior: o Banco Central revela a mesma atitude, mesmo com a inflação ancorada, abaixo da meta, e a fraca atividade. Qual será o custo disso?
A paralisia está saindo muito cara e isso está evidente na nova onda de recuperações judiciais (RJs) de grandes companhias, como sinalizaram os pedidos de RJ das empresas do grupo Odebrecht, as últimas de uma longa série de empreiteiras.
A onda não é casual. Afinal, na vida empresarial, o que não vai adiante, normalmente, volta para trás: empresas muito endividadas apenas têm chance de sair das dificuldades com seus mercados crescendo vigorosamente, pois só assim os bancos estarão dispostos a rolar e alongar seus empréstimos. Quando a estagnação entra em campo, é questão de tempo para algum credor decidir executar a dívida e precipitar uma RJ ou até uma falência.
Os setores perdedores são vários: construção (leve e pesada), bens de consumo não duráveis, comércio, bens de capital. A digestão das empresas “zumbis” também contribui para tornar mais lenta a recuperação da economia.
No mercado da estagnação o jogo é aquele antigo das crianças, o rouba monte. Só se cresce roubando o mercado do vizinho.
Na confusão existem várias empresas ganhadoras. Minha observação é que elas têm pelo menos três características em comum: boa estrutura de capital, boa governança corporativa e capacidade de entender as mudanças tecnológicas e de modelos de negócios em andamento no mundo. Isso permite adquirir bons ativos de companhias enfraquecidas, desenvolver novos produtos e continuar a crescer, alargando mercados, inclusive pela internacionalização.
Esse é, por exemplo, o caso da Weg, a empresa catarinense de equipamentos. Mais da metade do faturamento da Weg vem das exportações, e boa parte das vendas é de produtos lançados recentemente, muitos dos quais em áreas novas, como energia eólica.
A distância entre as companhias ajustadas e as outras também ajuda a entender por que nossa produtividade média não cresce. Além das causas usuais, que apontam os altos custos de fazer negócios no Brasil, a precária infraestrutura, o baixo padrão do sistema educacional e a complexidade de tributos, coloca-se a assimetria entre empresas líderes e aquelas em decadência, que apenas vivem em modo de sobrevivência, mas cujas chances são cada vez mais reduzidas em meio à estagnação.
O que faz a competição. O mercado de adquirência, o das maquininhas de cartão, passou muitos anos dividido entre um duopólio: de um lado a Rede, do Itaú, e de outro a Cielo, do Bradesco/Banco do Brasil.
Nesse período, apenas estabelecimentos maiores tinham os equipamentos e as taxas eram elevadas, pesando nos comerciantes.
Há alguns anos, o Santander comprou a GetNet e entrou no mercado. No último ano, assistimos aos milionários IPOs da PagSeguro e da Stone na Bolsa Nasdaq, dos Estados Unidos. Finalmente, o Banco Safra entrou neste mercado.
Em poucos meses vimos o que não assistimos há anos: disputa pelos clientes e penetração em negócios menores, como médicos, dentistas, bancas de jornal, pequenos prestadores de serviços etc. O custo das maquininhas caiu drasticamente e os modelos de negócio ficaram mais variados. O resultado é uma melhora para os empresários e para os consumidores.
Esse caso me fez lembrar de um dos melhores livros do ano, The Myth of Capitalism – Monopolies and the Death of Competition, de Jonathan Tepper.
O que falta ao capitalismo moderno é mesmo competição.
*Economista e sócio da MB Associados
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