PIB anda de lado e na lama, mas começam mudanças nas profundezas da economia
É preciso notar que a economia brasileira muda, mesmo submersa na lama. O caranguejo, que anda de lado como o PIB do Brasil, troca de casca desde 2016.
Duas notícias desta semana são mais do que simbólicas desta transição tentativa: o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia e o plano de abrir o mercado de gás.
Quando, se e como mudanças desse tipo vão ter influência positiva no crescimento são perguntas de R$ 1 trilhão, medida tão ao gosto deste governo. Se o eventual crescimento será distribuído de modo igualitário, é questão ainda mais especulativa. Mas o caranguejo perde sua carapaça estatal e muda de cor. Ignorar a mudança é um erro político, econômico e financeiro.
Do que se trata? Alguns exemplos:
1. Deve haver agora investimento pesado no pré-sal, com aumento grande da produção. Mudanças nesse setor e noutros devem alterar a paisagem empresarial e industrial;
2. Há planos avançados de abrir setores dominados pelo Estado, como refinarias, gás e saneamento. Governos e suas empresas ora não têm como colocar dinheiro nessas pontas de lança do investimento;
3. As taxas de juros estão nos níveis mais baixos desde que se tem notícia, graças ao efeito combinado de depressão econômica e gastos contidos do governo e de seus braços de crédito. Sim, trata-se dos juros do atacadão de dinheiro. Mas o cidadão remediado vai ver seu fundo DI, seu CDB ou seu Tesouro Direto renderem pouquinho. Vai reclamar, procurar retorno em outra parte, empreendimentos em que possa investir. Pois bem. Os donos do dinheiro grosso agem do mesmo modo. Ou vai tudo virar inflação da Bolsa?
4. Por décadas o gasto do governo cresceu mais do que o PIB; cresceu ainda a 6,5% além da inflação nos 20 anos até 2016. Desde então, ficou estagnado;
5. Deve ser aprovada alguma reforma da Previdência;
6. Bancos em geral perdem espaço na concessão de crédito (entram outras fontes de financiamento);
7. Depois de quase 20 anos de paralisia, pode haver alguma abertura no comércio exterior, vide o acordo com a União Europeia;
8. Há planos de conceder serviços públicos e infraestrutura para empresas privadas, ainda que atrasados;
9. Para o bem ou para o mal, há uma nova lei trabalhista.
Há planos mais encrencados, como mexer no setor elétrico e em outras regulações de vários mercados. Até uma reforma tributária tramita no Congresso (caso aprovada, faria efeito direto só daqui a uns três anos, mas é coisa grande). Mas isso tudo ainda é especulativo, protesto.
As mudanças em curso e as planejadas por este governo em tese não devem estimular lá grande coisa de crescimento nos próximos, digamos, dois anos, embora a reação do empresário costume ser um tanto misteriosa. Sim, os planos podem fracassar, até porque o comitê central do governo Jair Bolsonaro não habita o universo da razão. Mas algo se move.
A ala do governo que frequenta o universo da razão enfim concluiu essa obra de 20 anos que é o acordo com a União Europeia. Mesmo com o Planalto jogando contra, haverá um remendão na Previdência. Isso tudo deve causar alguma impressão, aqui e lá fora.
Quase todas essas mudanças mexem nas condições da produção, não no consumo, em um primeiro momento. Se derem certo, demoram a fazer efeito, a fazer PIB, emprego e salários andarem. É uma travessia do deserto com um abismo no meio, mais algum tempo de crescimento pífio e pobreza crescente.
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